Editorial – Quem tem medo da Catalunha?

logo editorialA chanceler alemã, Angela Merkel, numa mesa redonda realizada em Berlim, respondendo a uma pergunta de um jornalista espanhol, exprimiu o seu apoio ao governo de Madrid, que procura bloquear um referendo pela independência da Catalunha.  Merkel sublinhou que existe diferença entre conceder autonomia a regiões e permitir que um país seja dividido. Claro que existe uma acentuada diferença – mas a questão central é – será a Espanha um país? E a Alemanha, será um país?

No século XIX, há quem diga que por influência do Romantismo na política, com a recorrência dos exemplos clássicos e o esplendor heróico das encenações operáticas, houve a tentação de criar grandes espaços, de juntar países e de criar novos estados imperiais. A realidade é um pouco diferente – o século foi  simultaneamente marcado pelo declínio de impérios como o Sacro-Império, extinto por Napoleão em 1806, espanhol, o português, o francês, agonizante com a derrota da ideia imperial de Napoleão, e pelo nascimento de novos impérios – o britânico, o germânico e, no chamado novo Mundo, o império dos Estados  Unidos. O século, embalado pela música dos grandes compositores, explodia em novas realidades científicas, tecnológicas, num quadro social que, por exemplo, ia abolindo a escravatura, mas criava legislação laboral que permitia uma exploração intensiva da força do trabalho, em muitos aspectos mais desumana do que a escravatura.

Espanha, em plena decadência do seu império, formalizara em Cádis, nas Cortes de 1812, o que no apogeu não institucionalizara – a criação do Estado espanhol, transformando em regiões as nações submetidas a Madrid. A Catalunha, com uma história, uma cultura e um idioma próprios, via-se reduzida à condição de província.

Na Alemanha, desde o Congresso de Viena, em 1815, que a Prússia diligenciava a criação de uma Confederação Germânica. A hegemonia prussiana que serviria de cimento a uma unificação alemã, provocou até meados do século revoluções nacionalistas e de recorte liberal que, no entanto, fracassaram. Até que, após a vitória da Prússia sobre a França propiciou em 1871  a criação do Império Alemão. Os resultados da unificação alemã foram trágicos para a Europa e para o mundo – duas guerras globais no espaço de três dácadas, provocaram muitos milhões de mortos. Derrotada, a Alemanha, teria sido de elementar precaução dos Aliados, redesenhar a geografia germânica, restituindo a soberania a países como a Baviera. Em Espanha, teria sido avisado, além de destituir, julgar e executar os criminosos apaniguados de Franco, devolver a independência perdida pela Catalunha em 1714.Porém, a vitória dos Aliados, foi tão-somente a vitória de um capitalismo menos sinistro. Os interesses fulcrais do sistema tinham de ser preservados. E foram.

Revelando uma total ignorância ou um significativo desprezo sobre as realidades históricas, usou como exemplo o sistema federativo na Alemanha, dizendo que concede a Estados e municípios bastante espaço para tomarem as suas decisões, mas sem pôr em causa a “integridade territorial geral”. […] “partilho a opinião do governo espanhol”.

Porém, informou Angela Merkel, “não me envolvo em questões internas de Espanha”. Claro que não.

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