O saudoso tempo do fascismo – 16 – por Hélder Costa

 

 

Uma história de política e futebol – 1

 

 

 

Não, eu não vou falar das tais redes estranhas entre a popularidade dos políticos e os êxitos desportivos.

 

Já toda a gente sabe que o “herói nacional” simbolizando bandeira, hino, esforço, sacrifício, martírio, vitória rara e inesperada sobre uma infância desvalida e desfavorecida – para usar os termos em voga que deixaram de falar em miséria e exploração para não serem comparados com aqueles Zolas, Eças e Baudelaires do Século XIX -, são e serão sempre usados por qualquer regime político como atestado de bondade e competência do Governo em relação ao pobre cidadão, maltrapilho, ignaro e (deixem-me usar uma boa expressão) escória da sociedade.

 

Vou recordar uma acção feita por uns jovens no ano longínquo de 1965.

 

Estamos em Lisboa, o mal estar e a revolta não param de crescer.

 

 

  

 

 

A guerra colonial tinha começado em 1961, as lutas estudantis multiplicavam-se, surgiam os primeiros desertores com armas, o Alentejo via searas a arder, o país despovoava-se procurando Franças e Araganças, fugindo à fome, procurando trabalho, salvando os filhos da guerra e tentando perceber e sentir – finalmente! – o que seria respirar em liberdade.

 

Os estudantes continuavam a luta iniciada há anos pela liberdade de associação (decreto 40.900), e pela consolidação das vitórias de listas progressistas nas Associações Universitárias e do ensino técnico de Lisboa, Coimbra e Porto. E a dada altura surgiu o click que fez explodir a situação: um estudante, Saldanha Sanches é ferido a tiro por um agente da Pide, espancado e encarcerado.

 

A comoção e a revolta incendiaram as Faculdades, os Liceus e a opinião pública. E a tarefa que se colocou e que foi exemplarmente executada em perfeita unidade entre tendências políticas que se hostilizavam, foi a de fazer chegar a informação e as razões da luta estudantil a toda a população.

 

Para isso, havia técnicas simples: provocar engarrafamentos, perturbar a circulação, convencer o passageiro do autocarro ou eléctrico que uma paragem estranha no transito “era coisa dos estudantes”.

 

Com o transporte público em ebulição, era fácil criar uma espécie de forum espontâneo, e as opiniões fluíam torneando a censura e a lei do silêncio.X Depois, havia as distribuições nocturnas de panfletos em caixas de correio e bairros degradados. Claro que cada sector exigia um tipo diferente de texto, porque não estávamos a ver o povo do bairro da lata a sensibilizar-se com a degradação do ensino Universitário; esse tema era divulgado nos bairros do Restelo e afins, cujas famílias tinham os filhos nos estudos e gostariam de ver os pimpolhos bem preparados para a gestão política e económica deste país, sua quinta privada.

 

 

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