REFLEXÕES SOBRE A MORTE DA ZONA EURO, SOBRE OS CAMINHOS SEGUIDOS NA EUROPA A CAMINHO DOS ANOS 1930

Selecção, tradução e nota de leitura por Júlio Marques Mota

 

CONTRA O TRATADO SOBRE A ESTABILIDADE, A COORDENAÇÃO E A GOVERNAÇÃO

Jérôme Gleizes – Setembro de 2012

(CONTINUAÇÃO)

10. Uma coordenação das políticas económicas e a convergência de fachada

Vários  artigos  (de 9 a 11) estão ligados  a  esta matéria  , mas todos recordam os dispositivos já em funcionamento  no Tratado sobre o funcionamento da União Europeia e no Tratado da União Europeia.  O Artigo 10   está lá como pura fachada: “em conformidade com os requisitos estabelecidos pelos tratados em que se funda  a União Europeia, as Partes Contratantes estão disponíveis para recorrer mais  activamente, sempre que adequado e necessário, a  medidas específicas para os  Estados-Membros cuja moeda seja o euro (…)”, . “assim como à  cooperação reforçada (…) para as questões essenciais ao bom funcionamento da zona euro,” mas sempre dentro de um quadro liberal,  ou seja  “sem prejudicar  o mercado interno.”

11. Uma governação intergovernamental da zona euro

O TSCG institucionaliza  o fracasso da política intergovernamental   destes  últimos 5 anos, em vez de iniciar um federalismo fiscal. “Os chefes de Estado ou  de Governo das Partes Contratantes cuja moeda é  o euro reúnem-se  informalmente em cimeiras do Euro, juntamente com o Presidente da Comissão Europeia” (artigo 12. º, n. 1).

È necessário redigir tratados para dizer que os chefes de Estado se deve reunir informalmente! Este artigo é sintomático do vazio jurídico . Este Tratado tem como seu único  objectivo  o seu  título I, ou seja, a imposição de regras orçamentais  restritivas e vinculativas. Ele confirma  igualmente  a ausência de respeito pelo Parlamento Europeu. Assim, em vez de se ter no Tratado que  Presidente seja convidado de  pleno direito,  tem-se no Tratado que “o Presidente do Parlamento Europeu pode ser convidado a ser ouvido” (artigo 12, parágrafo 5).

12 Uma ideologia ultraliberal

O princípio da constitucionalização da regra orçamental é uma ideia bem  antiga da escola de Chicago de Milton Friedman e da escola Public Choice. A escola de Chicago, na continuidade da sociedade Mont Pelerin, fundada por  Hayek, tem-se sempre colocado contra o paradigma keynesiano da eficácia da intervenção do Estado. Para estes neoliberais os mecanismos de preços de mercado são sempre  mais eficazes  enquanto que as intervenções públicas são sempre prejudiciais.

Em 1977, Kydland e Prescott teorizaram que as políticas discricionárias   não maximizem o bem-estar social e  que se deve  sempre  supervisionar a acção do governo através de regras orçamentais restritivas. A passagem da economia para a direito ganha assim sentido . A  constitucionalização de uma regra orçamental  pode restringir e vincular as mãos dos políticos. O circulo é assim completo:  toda e qualquer  política keynesiana torna-se assim  impossível, deixando aos mercados a  tarefa de encontrarem naturalmente o seu ponto de equilíbrio  . É a instituição  do primado da economia sobre a política.

13. Uma zona  euro em perigo

O TSCG tem por objectivo teórico responder à crise actual e evitar a ruptura  da zona euro. O principal sinal da crise da zona euro é o diferencial nas  taxas de juro. Na mesma área monetária, a moeda é mesma. Um euro grego não é diferente de um euro alemão ou de um euro português. O euro troca-se da mesma forma com os mesmos  bens  cujo custo de produção seja sensivelmente o mesmo    e tanto mais assim quanto há livre  circulação de capitais. A convergência das taxas de juros é, aliás,  um dos critérios para entrar na zona euro.  A sua  divergência actual mede o grau de risco de desmembramento da área do euro, é o que os economistas chamam  de  prémio de risco.

Em 2007, as diferenças nas taxas eram baixas. O Reino Unido tinha ainda um prémio para o risco de estar fora da zona euro. Em 2009, as diferenças foram ainda razoáveis antes de se alargarem , especialmente na Grécia, onde as taxas de juros se tornaram  usurárias.  Mais o país corta nas suas despesas mais os juros aumentam! A especulação que tinha  desaparecido desde a criação  do euro volta a reaparecer na Europa. A especulação sobre as taxas de juro substitui a especulação sobre as taxas de câmbio.

Longe de melhorar a situação actual, o TSCG vai ampliar  a crise e os comportamentos especulativos  ao generalizar o círculo recessivo grego: recessão leva a subir as taxas de juros, o que implica maior peso da dívida, o que implica agravamento da recessão e assim sucessivamente Assim claramente aumenta o risco de desmembramento da área do euro. O custo da inacção  aumenta com o aumento das taxas de juro . O TSCG não aborda a questão do custo da dívida.  A força dos Estados Unidos  e do Reino Unido está na sua capacidade  em  controlar as taxas de juros através da acção do seu Banco Central.

(continua)

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