Esta semana, fazemos uma edição especial deste suplemento para vos podermos dar conta da «Operação Pato». Desenvolvimentos recentes, a tal nos obrigam:
Papa/alpha/tango/oscar
Em Berlim, o Grosser Tiergarten é o parque público mais antigo o maior e mais popular. Próximo do Reichtag (Parlamento) e do Jardim Zoológico, fica também perto da sede da Orquestra Filarmónica de Berlim. Dentro da sua área, estão instaladas várias embaixadas e ali vai funcionar a representação diplomática de Portugal. Foi no seu lago que o nosso Pato se hospedou. Não teve problemas de comunicação com os seus amigos germânicos, porque a linguagem dos patos é universal e consta de uma só palavra – cuá, kwa, quá, conforme as diferentes grafias. Tudo depende da inflexão. Simples.
Foi ao lago grande do Tiergarten que uns tipos mal encarados foram buscar o nosso enviado e mal lhe deram tempo para vestir a sua gabardina. Num grande Mercedes negro levaram-no até Zimmerstrasse onde o depositaram num salão com espelhos, quadros sinistros, tapeçarias e mesas com jarrões – as inutilidades com que os humanos decoram os seus salões. Estava o Pato a analisar o cenário, quando de um cadeirão veio uma voz risonha – a voz do presidente Durão:
– Então você é que é o tal chato, perdão, o tal Pato que me quer falar?
– Sim, excelência, E indo ao cherne, perdão, ao cerne do problema, aqui tem vocelência a carta que o Professor Júlio Marques Mota me encarregou de lhe entregar.
– Já a li. O Professor publicou a carta num blogue… qualquer coisa dos Astronautas…O que não é curial…
O Pato, não sabendo o significado de curial, foi cauteloso:
– Bem, como vossa eminência sabe, ser curial ou não ser, depende da perspectiva.
– Como assim?
– Por exemplo, desviar móveis é curial? Pode ser e pode não ser, majestade – Ser ou não ser, é uma questão profunda e eterna e não pode um camarada a bel prazer, manipular um conceito tão susceptível de manipulação…
– Ora essa! As coisas são sérias ou não são sérias! – Bingo! – pensou o Pato, curial quer dizer “sério” – Respondeu:
– Não é bem assim, meu marechal. Se eu roubar a maçaneta de uma gaveta dessa mesa com pés retorcidos, vou preso. Se for vossa santidade que transfira a mobília toda para a sede do seu partido, é uma operação de logística. Se um ladrãozeco assaltar um velhinha que sai do banco onde foi levantar a pensão de reforma, é um desalmado criminoso e vai preso …
– E então não havia de ir preso? Um miserável que assalta uma senhora idosa?
– Sem dúvida. E o que chama vossa santidade a um homem que rouba as pensões de reforma a milhões de idosos?
– Bem. Já vi que você tem jeito para jogar com as palavras…
– Obrigado, alteza. E a carta?
– Deixe aí ficar.
– E a resposta, vossa divindade?
Mas o presidente não respondeu. Fez um gesto com a mão, um gesto de quem sacode. E logo os dois brutamontes acorreram e agarraram o Pato.
Como começava a ser habitual, foi atirado para a rua. Para o regresso não houve Mercedes. E o Pato lá palmilhou de Zimerstrasse até ao Tiergarten. Missão cumprida – cuá, cuá!
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O Pato, por assim dizer, é um rato de biblioteca. Nativo do Campo Grande, na passagem para o lago, em fila com os seus irmãos atrás da mãe, passava todos os dias à porta da Torre do Tombo. Um dos seus sonhos secretos era vir a ser Guarda-Mor, como Fernão Lopes. Isto para explicar o à-vontade com que se infiltrou na Biblioteca Nacional de Berlim. Para quê?