L’ODEUR DE LA ROSE, SON IMMUABLE ESSENCE ET LA COMPLEXITÉ DE LEURS COMPOSANTS CHIMIQUES (a propósito de um texto de Carlos Loures e de um comentário de Carlos Leça da Veiga) – por Paulo Rato

Chamem-lhes o que quiserem… Nas actuais circunstâncias (reais, não ficcionadas ou sonhadas), qualquer organização de cidadãos, a partir do momento em que se propõe intervir na luta política (isto é, no combate democrático para que seja o seu “projecto” – que há-de ter algum! – e não outro a ser eleito para governar o país), passa a deslizar para as mesmas vias já trilhadas por partidos, sindicatos e o mais que queiram “do século XIX”; e, conseguida uma parcela de apoio que lhe possibilite a intervenção (a História não nos conta nada de tranquilizador sobre “movimentos” que obtêm um apressado apoio popular para se alcandorarem, vertiginosamente, ao poder…), os problemas decorrentes do modo como os diferentes indivíduos avaliam a “inquestionável” superioridade da “sua versão” do projecto catalisam a irrupção de desvios similares aos que, hipoteticamente, se pretendia superar…
Grande parte das reflexões apresentadas no artigo e no comentário merecem o meu apoio. Algumas conclusões é que me parecem mais uma “aspiração” que o resultado das mesmas reflexões.

Não tenho grande jeito (ou, talvez, paciência…) para teorizar, fazer coisa com princípio, meio e fim, que se proponha resolver problemas para os quais séculos de actividade de notabilíssimos pensadores não encontraram solução que a prática validasse. Disso me penitencio, mas sem grande estardalhaço de cilícios, que cada um é como é… E, decididamente, tenho consciência das minhas limitações.

Creio, no entanto, que sucessivas desilusões me levaram a esboçar um embrião de teoria, eventualmente já desenvolvida por outros, melhores e mais inteligentes, que eu não tenha lido. Fui conduzido à conclusão de que o grande problema decorre da própria natureza do ser humano, resultante de uma “evolução natural”, de mutações genéticas puramente casuais que foram originando espécies sucessivamente mais “aperfeiçoadas” e cada vez mais complexas, das quais acabaram por prevalecer as que, como bem concluiu Darwin, melhor se adaptaram ao seu “meio”. Ora, nada, neste percurso, aponta para que essa adaptação corresponda às “boas características” que, a tornarem-se dominantes, conduziriam a que cada indivíduo fosse íntegro, solidário, corajoso, idealista e não, simplesmente, o que nos habituámos a designar pela expressão idiomática “um filho da puta”.

Retornando a uma terminologia mais “elevada e científica”, diria que, por herança evolutiva, o “homo sapiens sapiens” (nomenclatura assaz inadequada) é um “predador”: preocupado, antes de mais, em sobreviver e propagar os seus genes – e, com a “socialização”, os bens que acumulou e que passaram a fazer parte do seu genoma de predador; desconfiado da “concorrência” dos seus semelhantes e sempre pronto para aniquilá-la. Tudo o que melhore esta caracterização é consequência de um percurso civilizacional que foi tentando atenuar, com o arrojo do pensamento e de um aperfeiçoamento conceptual que já se situa noutro plano, a “lama primacial” de que o Homem é, sem divina intervenção, feito.

Daí que as ideologias neo-liberais tenham tanta facilidade em singrar, numa “humanidade” onde vencem, sistematicamente, os que melhor se “adaptam”: os que não têm escrúpulos nem “estados de alma”, que não se comovem minimamente com as consequências dos seus actos sobre os outros “mais fracos” (debilitados por graves defeitos genéticos, como a solidariedade, a insistência em compreender e mudar as sociedades, imperativos de consciência, honestidade, inteireza…)

É sobre estas premissas que, em minha opinião, temos de construir algo que, através da formação de cada ser humano em sociedade, permita transformar a maioria dos indivíduos em cidadãos verdadeiramente civilizados, “contra” uma boa porção do que trazem inscrito no código genético. Entre outros, um tal Jesus de Nazaré (não importa, aqui, a existência polémica de um indivíduo com esse exacto nome, nem os episódios de vida que lhe foram colando, mas sim a de um núcleo doutrinário coerente, do ponto de vista hermenêutico) tentou, invocando uma revelação divina que reforçasse a sua mensagem de simplicidade e paz… e deu no que deu! Também um tal Marx apresentou propostas notáveis, muito bem fundamentadas e com previsões do futuro que permanecem ainda tão actuais (em particular, no campo da economia) que até parece que o “profeta” era ele e não o anterior “bem-intencionado”: acreditou ele que a tal “formação”, dramaticamente alterada na sua estrutura e na materialidade dos seus exemplos, originasse um “homem novo”… o que, afinal, independentemente de um conjunto limitado de realizações notáveis mas efémeras, acabou por resultar no aparecimento de uma enorme quantidade de mafiosos exportáveis…

Há-de haver novas formas de intervenção que aperfeiçoem a participação de cada indivíduo na construção do “bem colectivo”, novas formas de organização que complementem outras? Idiota seria duvidar disso, pela simples razão de que nada do que existe no Universo, casualmente produzido pela Natureza ou consequência da intervenção do Homem, é imutável.

Seja como for, como são alguns homens que adulteram os conceitos que os melhores deles foram definindo e não os próprios conceitos – quando ajustados a definirem as sociedades e os que nelas se movem – que se deterioram, considero um mau começo o uso (justamente) depreciativo do termo “políticos” com uma (inadequada) abrangência excessiva e algo descuidada, bem como qualquer ilusão, com traços de ingenuidade da “contra-cultura anos 60″, que anseia inventar algo de radicalmente novo como se o passado não existisse ou fosse desconhecido, como se fosse possível razoar sobre o nulo.

Políticos devemos ser todos, nenhum cidadão podendo considerar-se como tal se não participar na organização e na evolução da “polis”.

E ao caos inicial e “impoluto” ninguém consegue regressar.

Leave a Reply