UMA OUTRA MANEIRA DE OLHAR A EXCLUSÃO por LUÍSA Lobão Moniz

olhem para  mim

Já não há palavras para descrever o que se passa na Educação de um país que abriu as portas da escola a todas as crianças, independentemente de crenças religiosas, origens étnicas, estatuto social, comportamento. Foi um longo caminho em que todos, pais, crianças, educadores, pessoal não docente acreditavam no trabalho que estavam a fazer porque havia a alegria da liberdade, da confiança, da opção educativa para que os cidadãos se formassem no exemplo dessa alegria.

As famílias não tinham que estender a mão para ter apoios para os seus filhos poderem andar na escola, a escola deixou o bê à ba e experimentou novas didácticas, novos objectivos, nova relação com o sistema educativo.

O Ministério da Educação elaborou Projectos Educativos que chamavam a atenção para as diferenças dos alunos de outras regiões do país e de outras etnias, chamava a atenção para o comportamento pouco adequado de alguns alunos, para as famílias de Bairros problemáticos, para a desnutrição dos alunos, para os alunos que não revelavam problemas na sua relação com a escola, chamava a atenção para os alunos sobredotados, para os meninos deficientes e esta chamada de atenção não queria dizer que as escolas não soubessem lidar com estas situações, mas que lhes faltavam meios económicos e humanos.

A escola girava, umas melhores do que outras, na alegria da divulgação dos seus trabalhos, dos seus pequenos, mas muito importantes sucessos.

Discutia-se novas formas de ensinar, falava-se de Feinet, de João dos Santos, de Paulo Freire, de João de Deus, de Sebastião da Gama

As escolas aderiam a projectos e faziam os seus próprios projectos. Agora o caminho ficou interrompido….

Mas não ficou interrompido o crescimento das crianças e dos jovens.

Continuam a nascer, a estabelecer vínculos afectivos, a começar a falar, a andar, a ter medos, a imaginar, a desejar o afecto, a sentirem-se pessoa com direitos e deveres.

Mas nem todos gostam da Democracia vivida na sua plenitude e foram minando este sistema educativo, foram pondo pauzinhos na engrenagem falando na falta de disciplina, nos insucessos dos alunos, nas faltas de assiduidade dos professores, na falta de castigos, na argumentação dos alunos que entretanto iam vivendo a liberdade nas suas escolas.

“A escola é muito importante, eles é que não sabem”, menino de 14 anos no 4º ano de escolaridade, filho de um toxicodependente em recuperação. O que se faz com esta criança que está a viver num ambiente familiar de grande instabilidade económica e afectiva. A criança porta-se muitas vezes mal, mas a escola é importante. Certamente porque não havia um estatuto do aluno que pusesse a ênfase na punição, esta criança fez o 4º ano, o pai pouco colaborava na sua recuperação, a criança só contava com ela e com a aprendizagem feita na escola. Era recebido com afecto; “nas férias fico em casa e penso na escola”, menina cigana de 13 anos, no 2º ano de escolaridade, com difícil adaptação às regras e cultura da escola.

Pergunto: as crianças começaram a ser menos capazes de estar na escola, de cumprir regras só porque sim?

A Escola foi criada para que todos tivessem mais conhecimentos, para que todos tivessem oportunidade de desenvolver as suas capacidades de cidadania, para que todos se envolvessem em projectos de vida, enfim, soubessem ter uma vida boa.

Mas como tudo é relativo, estamos a viver com um Ministério que se congratula com uma peça de fruta dada a meio da manhã, nas escolas, e que fez com que as crianças, apelidadas de carenciadas, tivessem mais sucesso a nível dos comportamentos, um pouco mais… sendo que o sucesso educativo não teve alterações.

Se a Escola começa por ser assistencialista, dando aquilo que o governo tira (emprego, salários, satisfação de vida, felicidade nas famílias) qual vai ser o seu resultado?

Estas gerações vão crescer a aprender que os pais não têm emprego, ou que têm ordenados de miséria. Mas quase que não faz mal porque a escola dá o pequeno-almoço, o almoço, o lanche e quantas vezes o jantar, e que esta vida de sobrevivência é natural.

Os pais, de mal o menos, os seus filhos comem na escola…

E é assim que se perpetua o miserabilismo, o medo de exigir aquilo a que se tem direito.

O Senhor Ministro da Educação, que tantas teorias sabia de ciência certa, não está a ser capaz de gerir o Ministério de forma a criar uma sociedade mais conhecedora, mas sim uma sociedade mais elitista, com clivagens de aprendizagem e de comportamentos mais acentuadas.

Quem não se lembra do programa de televisão chamado “Plano Inclinado”?, até se disse que o Ministério deveria implodir, será que o que está a acontecer agora é essa implosão com o Ministro a chefiá-la?

Colocaram-se mais cento e tal psicólogos nas escolas, e o que é que isso significa? Significa tapar o sol com a peneira, os pais ficam contentes, os professores já não têm expectativas porque sabem, de experiência feita, que um psicólogo para mil e tal alunos não é a solução. Os psicólogos ficam contentes por terem sido colocados, apesar de irem viver muitos momentos de ansiedade por estarem a remar contra a maré…

O MEC não consegue resolver os graves problemas de aprendizagem nem de comportamento, não por culpa dos docentes, não por culpa de outros profissionais de educação, nem por culpa dos alunos.

Haverá alguém que acredite que os professores gostem de trabalhar para o insucesso? Haverá alguém que acredite que psicólogos, assistentes sociais, auxiliares de educação não consigam resolver os comportamentos disruptivos de muitos alunos ou de reinserção social das suas famílias, por indiferença à realidade que vivem na escola?

O MEC está amarrado ao ministério da folha de EXEL e não consta que nessa folha exista a palavra CRIANÇA.

(continua)

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