A GIGANTESCA OPERAÇÃO DE MANIPULAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA QUE ESTÁ EM CURSO PELO GOVERNO E SEUS DEFENSORES NOS MEDIA – por EUGÉNIO ROSA

Parte II
(conclusão)

O DESEMPREGO REGISTADO DIMINUI DEVIDO À EMIGRAÇÃO DOS MAIS QUALIFICADOS

Um dos indicadores utilizados pelo governo e defensores na sua campanha de manipulação é o desemprego registado divulgado todos os meses pelo IEFP. Mas analisemos por que razão o desemprego registado está a diminuir. Observe-se os dados do quadro 2

economiareal - IV 

Entre Novembro e Dezembro de 2013, o desemprego registado diminuiu em 0,2%, no entanto essa redução fez –se à custa da redução do numero de desempregados inscritos nos centros de emprego com o ensino secundário e superior, precisamente aqueles que estão a emigrar em massa. O número de desempregados inscritos nos centros de emprego com o ensino básico ou menos, assim como o desemprego de longa duração e os desempregados com mais de 25 anos, continuam a aumentar.

UMA PARCELA CADA VEZ MENOR DA RIQUEZA VAI PARA OS TRABALHADORES, AS DESIGUALDADES  AUMENTAM COM A CRISE, E OS OBSTÁCULOS AO CRESCIMENTO AGRAVAMSE

As desigualdades na repartição primária da riqueza criada estão a aumentar, como mostram os próprios dados do Eurostat constantes do quadro 4.

economiareal - V

Entre 2010 e 2014, ou seja, com o governo PSD/CDS e a “troika”, a parte que as Remunerações, que inclui as contribuições patronais para a Segurança Social, representam do PIB diminuiu de 50,2% para apenas 47%, ou seja, sofreu uma redução de 6,4% (-3,2 pontos percentuais), e os Salários, que já não inclui as contribuições dos empregadores, também registou uma forte redução pois, entre 2010 e 2012, passou de 38,9% para apenas 37,1% do PIB. Durante o mesmo período (2010/2012) o Excedente Bruto de Exploração, que reverte para as empresas, aumentou de 37,9% para 39,9% do PIB, sendo já superior à percentagens que os Salários representam do PIB. Uma rápida redistribuição da riqueza verificou-se em Portugal no período 2010-2012 em prejuízos dos trabalhadores e também nos anos seguintes, o que contribuiu para agravar ainda mais as desigualdades em Portugal.

Esta redução importante na parte das remunerações no PIB, que está a determinar o empobrecimento dos trabalhadores, é confirmada também pela evolução dos custos do trabalho em Portugal. Os dados do quadro 5, divulgados pelo Eurostat, confirmam também a redução de salários e o empobrecimento dos trabalhadores no nosso país. 

economiareal - VIEntre o 4º Trim.2010 e o 3º Trim.2013, ou seja após entrar em funções o governo PSD/CDS e a “troika”, o Índice do custo do trabalho em Portugal diminuiu 13,1%, enquanto na EU-27 aumentou 5%. E como mostra o quadro o valor do 3º Trim.2013 é inferior ao do 4º Trim.2012, o que prova que esta redução destes custos, que têm como base uma redução de remunerações (segundo o Banco de Portugal, as remunerações do trabalho diminuíram 1,6%em 2011 e 7,2% em 2012), continuou em 2013. Interessa referir que os custos do trabalho em Portugal em 2013 já são bastante inferiores aos de 2008 (-8,7%).

No entanto, estes dados ainda não traduzem de uma forma rigorosa e completa a redução dos rendimentos dos trabalhadores, porque eles ainda dizem respeito à repartição primária do rendimento. Baseiam-se nas remunerações ilíquidas, antes de ser deduzido o IRS e outros impostos e os descontos para a Segurança Social, CGA, ADSE, ADM e SAD. Para ficar claro como a política fiscal tem sido utilizada pelo governo para fazer uma redistribuição do rendimento em beneficio dos rendimentos do capital e propriedade basta referir o seguinte. Segundo o Relatório do O.E-2014, as receitas fiscais totais aumentaram, entre 2012 e 2013, 2.276 milhões € (de 32.627M€ para 34.903M€), mas as receitas de IRS subiram 2.776 milhões € (de 9.235M€ para 12.011M€), ou seja, cresceram mais do que as receitas fiscais totais. O IRS também serviu para compensar quebras de receitas verificadas em outros impostos. E segundo o Ministério das Finanças, cerca de 90% dos rendimentos sujeitos a IRS têm como origem rendimentos do trabalho e pensões, cabendo aos restantes rendimentos (propriedade, capital) menos de 10% dos rendimentos sujeitos a IRS .Fica assim claro como a politica fiscal está a ser utilizada por este governo e pela “troika” para fazer uma redistribuição a favor dos detentores do capital e da propriedade após a repartição primária do rendimento que é já  profundamente desfavorável aos trabalhadores. Os mais ricos (muito menos de 1% da população) já conseguiram, apesar da crise, reconstituir as suas fortunas. A provar isso está a valorização das ações em bolsa. Entre Dez.2010 e Dez. 2013, segundo a CMVM, o valor das ações das empresas cotadas na bolsa subiu de 193.224 milhões € para 229.285 milhões €, o que determinou que os seus proprietários vissem as suas fortunas aumentar em 36.061 milhões € (21,7% do PIB). É por esta razão que “Américo Amorim recuperou a liderança entre os 25 mais ricos em Portugal”. Os mais ricos já recuperaram da crise, e já são até mais ricos do que eram antes da crise, até porque a maior parte da sua riqueza está em ações e outros títulos. Como afirma Joseph Stiglitz, premio Nobel da economia, em “O Preço da desigualdade”, a desigualdade reduz a procura agregada pois a propensão de consumo dos ricos é baixa em relação ao elevado rendimento de que se apropriam e “sociedades demasiadamente desiguais não funcionam com eficiência, e as suas economias não são nem estáveis nem sustentáveis a longo prazo. Quando os mais ricos usam o seu poder politico para beneficiar em excesso as suas empresas, as muito necessitadas receitas são desviadas para os bolsos de poucos, em vez de beneficiarem a sociedade em geral” (pág. 152). Em Portugal as desigualdades na repartição do rendimento são tão graves que constituem um obstáculo ao crescimento económico e ao desenvolvimento, e vão-se agravar mais em 2014, com cortes brutais nos salários, nas pensões, nas prestações sociais, na educação e na saúde (3.100 milhões € de corte na despesa pública) que o governo pretende fazer, o que, ao reduzir a procura agregada, poderá matar à nascença quaisquer sinais de recuperação económica.

A DÍVIDA PÚBLICA CONTINUOU A CRESCER EM 2013 E TORNA-SE MAIS INSUSTENTÁVEL

Durante o programa da SIC “ Negócios da Semana” em que participei, José Gomes Ferreira, um empenhado defensor da politica de austeridade do governo e da “troika”, numa das suas interrupções frequentes, afirmou que em 2013 se tinha verificado também uma inversão do endividamento público. Comparemos esta afirmação de JGF com dados do próprio governo constantes do 1º orçamento retificativo do OE-2014, constantes do quadro 6:

economiareal - VIIEm 2010, antes da “troika” chegar e do governo PSD/CDS entrar em funções, a divida pública era de 162.487 milhões € (94% do PIB). Três anos de “troika” e de governo PSD/CDS fizeram subir a divida pública para 211.354 milhões € (mais 48.867 milhões €) o que corresponde a 127,8% do PIB de 2013 (entre o 2ºTrim. 2013 e o 3ºTrim.2013, verificou-se uma redução, mas a tendência, como se vê, é de aumento, basta o défice de 5%, que corresponde a cerca de 8.000 Milhões €, para a divida crescer e se, em 2013, não aumentou mais, foi devido às receitas das privatizações que atingiram 7.000 milhões sem os seguros da CGD). Mesmo aquele valor não traduz a totalidade da divida das Administrações Públicas, pois há uma parcela importante desta que não é considerada naquele total. Segundo o Banco de Portugal, a divida das Administrações Públicas atingia, já em Agosto-2013, 254.636 milhões € o que correspondia a 155,2% do PIB; quando em Dez.2010 era 107,5% do PIB. Portugal termina (?) o período de intervenção da “troika” com um pesadíssimo fardo de divida que impede qualquer crescimento sustentado. E de acordo com o Pacto Orçamental, aprovado na Assembleia da República pelo PS, PSD e CDS”, Portugal assumiu o compromisso de a reduzir de 127,8% para 60% num prazo de 20 anos (artº 4º), o que significa uma redução 3,4 pontos percentuais por ano (quase 6.000 milhões € por ano), a que se junta uma  outra obrigação constante do artº 1º do Pacto, que é a redução do défice estrutural para -0,5% (em 2013, era -3,5%). Se estas condições draconianas não forem alteradas Portugal estará condenado à estagnação económica, ao definhamento e ao empobrecimento. Falar neste contexto concreto, e sem que se altere significativamente o quadro e a politica atual, de recuperação da economia, e sugerir que ela possa ser sustentável, é não entender como funciona a economia ou então só pode ser com intuito claro de enganar a opinião pública e os portugueses. É tomar a árvore pela floresta e não entender nada da situação atual.

Eugénio Rosa – Economista – edr2@netcabo.pt – 23-1-2014

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Para ler a Parte I deste trabalho de Eugénio Rosa, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

A GIGANTESCA OPERAÇÃO DE MANIPULAÇÃO DA OPINIÃO PÚBLICA QUE ESTÁ EM CURSO PELO GOVERNO E SEUS DEFENSORES NOS MEDIA – por EUGÉNIO ROSA

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