MULTIPLICADOR PELA ÓTICA DA DESPESA, por BILL MITCHELL

Temaseconomia1

Selecção de Júlio Marques Mota. Tradução e revisão de Flávio Nunes e Júlio Marques Mota.

Multiplicador pela Ótica da Despesa

 

Por Bill Mitchell

Publicado a 28 de Dezembro de 2009

Parte IV

(CONCLUSÃO)

Como é que se podem avaliar esses modelos dos “novos keynesianos”?

Embora não tenha por hábito concordar com o antigo blogger do Financial Times, Willem Buiter, porém, no início deste ano (mais precisamente a 3 de Março de 2009) no artigo – The unfortunate uselessness of most ’state of the art’ academic monetary economics – concordo totalmente com o que ele explica:

No artigo citado, Buiter diz-nos “que os modelos que representam o estado da arte (state of art) na economia neoliberal, as abordagens, particularmente, dos modelos chamados de expectativas racionais, transformaram-se em modelos dos “novos keynesianos.” Acrescenta inclusive que “o estado da arte dos modelos de macroeconomia da linha neoliberal, a maior parte das inovações teóricas neste domínio foram feitas pelos neoliberais desde 1970 ( à nova revolução clássica das espectativas racionais associaram-se nomes tais como Robert E. Lucas Jr., Edward Prescott, Thomas Sargent, Robert Barro etc. e, a “nova teorização keynesiana” de Michael Woodford e muitos outros) que mostraram serem distracções auto-referenciais e no melhor dos casos introspectivas. A investigação tende a ser motivada pela lógica interna, pelos “quebra-cabeças” difíceis e esteticamente muito elegantes dos programas de investigação que andam a desenvolver todavia, não pelo desejo poderoso de querer compreender como é que a economia funciona – e muito menos pela tentativa de saber como funciona a economia ao longo dos ciclos caracterizados por uma grande instabilidade financeira. Assim, a profissão de economista foi apanhada desprevenida quando a crise rebentou.”

De forma a aprofundar que o descrito não tem nenhuma aplicabilidade no mundo real, nem nenhuma utilidade para conceber políticas económicas, Buiter observou que:

“Os mais influentes teóricos “novos clássicos” e “novos keynesianos” trabalham, no cômputo geral, no que os economistas chamam de “paradigma dos mercados completos”’. Num mundo onde existem mercados para a negociação de créditos condicionais que abrangem todos os estados possíveis da natureza (todas as contingências possíveis), e em que as restrições dos orçamentos intertemporais  são sempre satisfeitas por hipótese, incumprimento, falência e insolvência são situações consideradas impossíveis de se verificar. Como resultado, a falta de liquidez, tanto a iliquidez de financiamento como a iliquidez de mercado, também são impossíveis, a menos que a angustia e o sentimento de culpa do economista teórico imponha alguma arbitrária e não natural fricção (dada a estrutura dos modelos com que trabalham), que faz com que qualquer coisa chamada de “dinheiro” se torne mais líquida que todas as coisas e não pelas boas razões. A ironia de modelizar a liquidez pela imposição do dinheiro como uma restrição ao comércio foi perdida na profissão.

Tanto as teorias macroeconómicas dos “novos clássicos” como dos “novos keynesianos” sobre mercados completos não só não permitiram o levantamento de  questões sobre a insolvência e a falta de liquidez não fosse respondido como não permitiram que tais perguntas fossem sequer levantadas.”

Deste modo são sobretudo exercícios de contagem de anjos a dançarem em cabeças de alfinete.

Ora, há aqui uma incongruência na determinação de resultados em termos de políticas económicas numa economia monetária moderna. No caso de elas terem qualquer implicação política, são apoiadas na imposição teórica, ou seja, em que as despesas públicas levam inevitavelmente a um aumento das taxas de juros e, caso estas não subam, conduzirão à inflação.

Todos os principais resultados são assumidos desde o início sendo inclusive o processo de estimação econométrica “cozinhado” para obter a estrutura do modelo necessário para satisfazer as preferências ideológicas subjacentes. Lixo dentro, lixo fora!

Vale a pena regressar novamente a Buiter acerca deste ponto:

Nas abordagens tanto dos “novos clássicos” como dos “novos keynesianos” para a teoria monetária (e para a macroeconomia em geral) a versão mais forte da hipótese de mercados eficientes é mantida. Esta é a hipótese em que os preços dos activos agregados reflectem plenamente todas as pertinentes informações fundamentais, portanto, fornecem os sinais adequados para a afectação de recursos. Mesmo durante as décadas de 70, 80, 90 e até antes de 2007, a manifesta falência da hipótese dos mercados eficientes em muitos mercados assentes fundamentalmente em activos era óbvia para praticamente todos aqueles cujas capacidades cognitivas não tinham sido desfiguradas por uma descarga da moderna educação ao nível do PhD anglo-americana.

Conclusão

Não procuro defender aqui o trabalho Romer & Bernstein. Porém, as suas estimativas do multiplicador são razoáveis e relativamente próximas daquilo que provavelmente irá acontecer. A maneira como eles obtiveram estes resultados é questionável, mas isso é outra questão.

Não obstante é altamente improvável que o Fed deixe subir as taxas de juros no ano que vem (2010), a menos que haja uma repercussão muito forte no crescimento do PIB.

Os ataques feitos por Taylor e a sua tripulação de forma a utilizarem os  modelos dos “novos keynesianos” são fortes na ideologia conservadora e tanto que transpiram por todos os poros, mas são fracos em praticamente tudo o resto, daí ser absurdo considera-los. Na estrutura teórica destes modelos dos “novos keynesianos” não cabe nenhuma relação de como funciona um moderno sistema monetário. As hipóteses de que o comportamento dos agentes é  prospectivo pode ser considerada como  razoável, contudo pensar que as famílias prevêem, em média, de forma perfeita a política futura governamental e que estas adaptam o seu comportamento com base nas suas previsões é demasiado rebuscado. É muito mais provável que as famílias e investidores observem os estímulos que as despesas públicas fornecem à economia e com isso leve ao aumento da sua confiança por pensarem posteriormente que a retoma está a começar e, então venham a redefinir as suas despesas com base numa esperança renovada.Não há nenhuma base empírica para considerar que os impostos sobem automaticamente na sequência do aumento das despesas públicas. Esse comportamento é irregular. Tudo depende das circunstâncias e da capacidade para repor a economia em marcha.

É altamente improvável que as famílias estejam agora a poupar e por isso mesmo a reduzir o consumo a fim de pagar alguns impostos futuros. A evidência, por exemplo, no caso australiano é muito clara, as famílias estão novamente a começar a aumentar o volume da sua despesa, mesmo perante um aumento substancialmente do défice em percentagem do PIB.

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Para ler a Parte III deste texto de Bill Mitchell, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

MULTIPLICADOR PELA ÓTICA DA DESPESA, por BILL MITCHELL

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