A COMISSÃO EUROPEIA A PREPARAR UMA NOVA CRISE – 2. PERDIDOS NA CONTRADIÇÃO: O FMI E A COMPETITIVIDADE PELO DUMPING SALARIAL NA ZONA EURO – UMA MONTAGEM DE TEXTOS PARTIDO DO TRABALHO INICIAL DE RONALD JANSSEN COM ESTE MESMO TÍTULO – por JÚLIO MARQUES MOTA – I

logo_pt da comissão europeia

Ronald Janssen

 

Uma nota da discussão do pessoal de direcção  publicada recentemente pelo FMI analisa  o argumento de  que estar  a espremer salários através de uma grande parte da zona euro  é perigoso  e deflacionário porque não melhorará a posição competitiva relativa quando vendendo para o exterior a preço mais baixo enquanto se corta na procura nacional por todos os lados. Dado  que o FMI foi sempre um advogado leal da experiência em curso da zona euro  de substituir a desvalorização da moeda pela  desvalorização dos salários, vale a pena olhar  mais atentamente para perceber como é que isto funciona.

Politicas  proteccionistas salariais “ são  seguramente  deflacionistas ….

O FMI  baseia os seus resultados numa  simulação em que o crescimento do salário nominal num grupo de cinco países que representam um peso económico de 30% da zona euro  (Grécia, Itália, Espanha, Portugal, Irlanda) é reduzido de  2 pontos percentuais no decorrer  de dois anos. Importante, esta simulação é realizada sob a suposição que as mãos do BCE estão amarradas com respeito ao corte nas suas taxas de juro porque estas taxas já estão a atingir a marca de zero. Igualmente supõe-se que o crescimento dos mais baixos salários se repercute por inteiro nos preços nacionais, implicando que não há nenhum corte nos salários reais.

Cenário 1.

Comissão Europeiacrise - XI

Relativamente a este cenário e aos que se desenvolvem a seguir diz-nos o FMI:

Quantos mais forem os países a assumirem a política da moderação  salarial, mais pequeno será o efeito positivo da competitividade sobre o crescimento do PIB,  menor é o efeito da concorrência e é maior  o efeito (negativo) da procura e assim serão menores os benefícios e maiores os custos da moderação de salário para estas economias.

No caso de uma moderação salarial ser assumida por uma só das economias da zona euro atingidas pela crise da zona  euro, o resultado líquido sobre o PIB  é fortemente positivo. As linhas vermelhas na figura 1 expressam o efeito médio obtido numa só economia das que são afectadas pela crise na zona euro resultante da moderação salarial ser aplicada apenas nesse país em causa, em que se reduz  a inflação do salário em 2  pontos de percentagem. Neste caso  a queda na inflação do  salário nominal impulsiona  o nível do PIB real  relativamente ao valor de base ou de referência de aproximadamente 1 por cento pelo segundo ano e por quase 2 por cento no terceiro ano, com  muito do benefício a ter origem no aumento das exportações.

As linhas a azul  na figura 1 mostra que quando todas  as economias afectadas pela crise  e que representam  aproximadamente um terço do PIB da zona euro – praticam uma política  de moderação do seu crescimento dos salários em  2 por cento relativamente ao valor de referência ou de base, neste caso então, esta política resulta apenas no crescimento  de 1 por cento no PIB ao final do terceiro ano. Isto é pois metade da resposta obtida  com a moderação salarial praticada numa só economia afectada pela crise. A contribuição das exportações líquidas relativamente ao valor de reverência para a formação adicional do PIB é ainda positiva, enquanto  as contribuições do consumo e do investimento passam ambas a ser  agora negativas . Contudo, as exportações já não aumentam tão fortemente como o fazem no exemplo da moderação salarial praticada num só país, reflectindo principalmente uma mais baixa procura dos países parceiros da  zona euro.

Embora a moderação dos salários  em todas as economias da zona euro  não seja considerada uma proposição considerável em termos políticos  nós apresentamo-la como um cenário para fins ilustrativos. Note-se que  quando todas as economias da zona euro  moderam o seu crescimento salarial  e dos preços em  2 por cento, os resultados desta acção são uma redução de aproximadamente 1 por cento no terceiro ano no PIB. Dito de forma simples,  o efeito positivo da concorrência pela via salarial  é agora mesmo mais fraco e o efeito negativo da procura é muito mais forte que nos outros casos, levando ao decrescimento do PIB relativamente ao valor de base.  A razão para este resultado é que as economias da zona euro  têm uma forte intensidade de trocas comerciais entre si: o comércio no interior da zona euro é metade do valor total da zona euro e os países da zona  euro  trocam hoje em dia o produtos e serviços equivalente a aproximadamente 20 por cento do PIB da zona euro anualmente.

Uma proposição mais apreciável do que a moderação de salário global é moderação nas economias afectadas pela crise combinada com os aumentos de salários naquelas economias que são caracterizadas por excedentes na balança corrente.

Até certo ponto, o FMI  sublinha os efeitos negativos e os perigos de uma política de desvalorização dos salários que seja realizada numa base comum. O impacto de uma moderação nos salários de 2% que se realizou   em todas as cinco economias afectadas  pela crise como enunciado  acima sobre  o nível total de actividade económica da zona euro é negativo. O PIB da zona euro cai 0,5% abaixo do nível que se verificaria  se nada se mudasse.  Entretanto, a inflação é empurrada para baixo num ponto percentual adicional. O último número representa certamente a diferença entre a inflação baixa e a deflação imediata.

… mas a facilitação quantitativa permite outra capacidade de resposta.

O FMI, contudo, não cede assim tão facilmente e  tenta salvar a sua mensagem tradicional da política que o dumping salarial mesmo se é praticado  por muitos Estados-membros ao mesmo tempo, é ainda uma boa coisa. Para fazer assim, o FMI  invoca a política alternativa da facilitação quantitativa (QE). Se isto não é possível para a política monetária poder  cortar nas taxas de juro a curto prazo, então  o BCE deve recentrar a sua máquina de impressão de dinheiro  na compra títulos de longo prazo ou outros  activos financeiros de modo que as taxas de juro a longo prazo do mercado possam descer ainda mais. O papel do FMI  continua então a ser o de fazer uma simulação adicional através da qual a política de QE do BCE faz descer as   taxas de juro a longo prazo de  50 pontos de base.

(continua)

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Ver os textos originais em:

http://www.socialeurope.eu/2015/11/lost-in-contradiction-the-imf-and-competitive-wage-dumping-in-the-euro-area/

Click to access sdn1522.pdf

 

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