Uma nota da discussão do pessoal de direcção publicada recentemente pelo FMI analisa o argumento de que estar a espremer salários através de uma grande parte da zona euro é perigoso e deflacionário porque não melhorará a posição competitiva relativa quando vendendo para o exterior a preço mais baixo enquanto se corta na procura nacional por todos os lados. Dado que o FMI foi sempre um advogado leal da experiência em curso da zona euro de substituir a desvalorização da moeda pela desvalorização dos salários, vale a pena olhar mais atentamente para perceber como é que isto funciona.
Politicas proteccionistas salariais “ são seguramente deflacionistas ….
O FMI baseia os seus resultados numa simulação em que o crescimento do salário nominal num grupo de cinco países que representam um peso económico de 30% da zona euro (Grécia, Itália, Espanha, Portugal, Irlanda) é reduzido de 2 pontos percentuais no decorrer de dois anos. Importante, esta simulação é realizada sob a suposição que as mãos do BCE estão amarradas com respeito ao corte nas suas taxas de juro porque estas taxas já estão a atingir a marca de zero. Igualmente supõe-se que o crescimento dos mais baixos salários se repercute por inteiro nos preços nacionais, implicando que não há nenhum corte nos salários reais.
Cenário 1.
Relativamente a este cenário e aos que se desenvolvem a seguir diz-nos o FMI:
Quantos mais forem os países a assumirem a política da moderação salarial, mais pequeno será o efeito positivo da competitividade sobre o crescimento do PIB, menor é o efeito da concorrência e é maior o efeito (negativo) da procura e assim serão menores os benefícios e maiores os custos da moderação de salário para estas economias.
No caso de uma moderação salarial ser assumida por uma só das economias da zona euro atingidas pela crise da zona euro, o resultado líquido sobre o PIB é fortemente positivo. As linhas vermelhas na figura 1 expressam o efeito médio obtido numa só economia das que são afectadas pela crise na zona euro resultante da moderação salarial ser aplicada apenas nesse país em causa, em que se reduz a inflação do salário em 2 pontos de percentagem. Neste caso a queda na inflação do salário nominal impulsiona o nível do PIB real relativamente ao valor de base ou de referência de aproximadamente 1 por cento pelo segundo ano e por quase 2 por cento no terceiro ano, com muito do benefício a ter origem no aumento das exportações.
As linhas a azul na figura 1 mostra que quando todas as economias afectadas pela crise e que representam aproximadamente um terço do PIB da zona euro – praticam uma política de moderação do seu crescimento dos salários em 2 por cento relativamente ao valor de referência ou de base, neste caso então, esta política resulta apenas no crescimento de 1 por cento no PIB ao final do terceiro ano. Isto é pois metade da resposta obtida com a moderação salarial praticada numa só economia afectada pela crise. A contribuição das exportações líquidas relativamente ao valor de reverência para a formação adicional do PIB é ainda positiva, enquanto as contribuições do consumo e do investimento passam ambas a ser agora negativas . Contudo, as exportações já não aumentam tão fortemente como o fazem no exemplo da moderação salarial praticada num só país, reflectindo principalmente uma mais baixa procura dos países parceiros da zona euro.
Embora a moderação dos salários em todas as economias da zona euro não seja considerada uma proposição considerável em termos políticos nós apresentamo-la como um cenário para fins ilustrativos. Note-se que quando todas as economias da zona euro moderam o seu crescimento salarial e dos preços em 2 por cento, os resultados desta acção são uma redução de aproximadamente 1 por cento no terceiro ano no PIB. Dito de forma simples, o efeito positivo da concorrência pela via salarial é agora mesmo mais fraco e o efeito negativo da procura é muito mais forte que nos outros casos, levando ao decrescimento do PIB relativamente ao valor de base. A razão para este resultado é que as economias da zona euro têm uma forte intensidade de trocas comerciais entre si: o comércio no interior da zona euro é metade do valor total da zona euro e os países da zona euro trocam hoje em dia o produtos e serviços equivalente a aproximadamente 20 por cento do PIB da zona euro anualmente.
Uma proposição mais apreciável do que a moderação de salário global é moderação nas economias afectadas pela crise combinada com os aumentos de salários naquelas economias que são caracterizadas por excedentes na balança corrente.
Até certo ponto, o FMI sublinha os efeitos negativos e os perigos de uma política de desvalorização dos salários que seja realizada numa base comum. O impacto de uma moderação nos salários de 2% que se realizou em todas as cinco economias afectadas pela crise como enunciado acima sobre o nível total de actividade económica da zona euro é negativo. O PIB da zona euro cai 0,5% abaixo do nível que se verificaria se nada se mudasse. Entretanto, a inflação é empurrada para baixo num ponto percentual adicional. O último número representa certamente a diferença entre a inflação baixa e a deflação imediata.
… mas a facilitação quantitativa permite outra capacidade de resposta.
O FMI, contudo, não cede assim tão facilmente e tenta salvar a sua mensagem tradicional da política que o dumping salarial mesmo se é praticado por muitos Estados-membros ao mesmo tempo, é ainda uma boa coisa. Para fazer assim, o FMI invoca a política alternativa da facilitação quantitativa (QE). Se isto não é possível para a política monetária poder cortar nas taxas de juro a curto prazo, então o BCE deve recentrar a sua máquina de impressão de dinheiro na compra títulos de longo prazo ou outros activos financeiros de modo que as taxas de juro a longo prazo do mercado possam descer ainda mais. O papel do FMI continua então a ser o de fazer uma simulação adicional através da qual a política de QE do BCE faz descer as taxas de juro a longo prazo de 50 pontos de base.
(continua)
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