Selecção e tradução de Júlio Marques Mota
Hoje, A Itália. Amanhã se verá quem se segue
Itália- o resgate de quatro bancos visto como um escândalo
Romaric Godin, Italie : le sauvetage de quatre banques fait scandale
La Tribune, 14 de Dezembro de 2015
Roma resgatou no fim de Novembro quatro bancos para evitar ter de colocar os depositantes a pagarem também o custo do resgate como o prevê a União Bancária Europeia a partir do 1º de Janeiro. Mas a questão provocou movimentos fortemente críticos tendo-se arruinado os pequenos aforradores. O mecanismo europeu de resolução bancária está já sob pressão.
No dia 21 de Novembro passado, o governo italiano decidiu “salvar” quatro pequenos bancos regionais. Quatro pequenos bancos dos quais o montante total dos balanços ronda os 3,6 mil milhões de euros. Mas quatro bancos que estavam apinhados de numerosos créditos de má qualidade, fruto de quatro anos de crise económica.
O objectivo do resgate bancário
O problema, para Roma, era que estes pequenos estabelecimentos eram duas caixas de poupança – Ferrare e Chieti – e de dois bancos regionais – Etruria (Toscana) e Marches – por outras palavras, dois bancos que recolhem as poupanças de muito numerosos cidadãos destas regiões. Ora, no 1º de Janeiro, a directiva europeia de resolução bancária (BRRD) entra em vigor. De acordo com esta directiva, os depositantes podem ser levados a terem que contribuir para o resgate no caso de crise bancária. É o fruto das novas regras da união bancária europeia que procura sobretudo salvar os contribuintes, e em detrimento dos depositantes.
Para o governo italiano, o facto de se exigir a contribuição dos depósitos e da poupança dos Italianos foi uma catástrofe política. Para o evitar, Matteo Renzi escolheu realizar um resgate de condições bem específicas, pondo a contribuir para o resgate desses mesmos bancos quer os accionistas quer os credores destes bancos. Um movimento que visava por conseguinte evitar movimentos políticos causados pela nova directiva bancária europeia. Mas a aposta revelou-se um verdadeiro desastre político.
Pequenos aforradores atingidos
Estes bancos com efeito venderam as suas acções e as suas obrigações subordinadas (aquelas que estão menos protegidas no caso de recapitalização) a numerosos pequenos aforradores. De acordo com os dados públicos, os quatro bancos contariam 133.000 accionistas e cerca de 10.500 detentores de obrigações. Os jornais da Península estão cheios de testemunhos de pequenos aforradores – reformados, operários, empregados do pequeno comércio, artesões modestos, donas de casa ou mesmo desempregados, que têm agora de fazer o seu luto pelas poupanças perdidas. Ao contrário de outros produtos de poupança e dos depósitos, os detentores de acções e de obrigações não são referidos pela garantia europeia (na verdade uma garantia nacional) dos depósitos até aos 100.000 euros. A perda está por conseguinte total.
Suicídio e mobilização
Este problema assumiu uma expressão trágica a 28 de Novembro quando Luigino D’Angelo, um reformado de 70 anos se enforcou na Civitavecchia (Latium), depois de ter perdido 110.000 euros no salvamento dos bancos. Conhecido a 9 de Dezembro passado, este suicídio provocou uma onda de choque por toda a Itália. As associações de defesa das vítimas de “ Salvabanche”, nome dado ao resgate destes quatro bancos pelos Italianos, aparecem no terreno público a denunciar a situação . Nesta segunda-feira 14 de Dezembro, manifestaram-se em Florença à frente da antiga estação Leopolda, onde se realizava a convenção tradicional dos amigos de Matteo Renzi na presença do primeiro ministro. O ministro das Finanças, Pier Paolo Padoan foi obrigado a receber uma delegação de aforradores que foiram vítimas do resgate. Sem que isso lhes diminuísse a sua revolta.
Escolha impossível para o governo
O governo acaba por se sentir fortemente incomodado face a esta situação. No fim de Novembro, a sua escolha era a de fazer pagar os depositantes e os credores e accionistas ou apenas estas duas últimas categorias. Sobre o plano macroeconómico e político, julgou que a segunda solução era menos dolorosa. Realmente, era necessário escolher entre a peste e a cólera. Porque a oposição, e nomeadamente a Liga do Norte, que adoptou há alguns meses posições próximas da Frente Nacional em França, tenta aproveitar-se da situação denunciando a operação do governo. Politicamente, o resultado para Matteo Renzi – já um pouco debilitado nas sondagens – é desastroso.
Compensação prevista
Pier Carlo Padoan por conseguinte teve que anunciar que o governo poria em prática um sistema de compensação para os aforradores até 100 milhões de euros. Os contribuintes por conseguinte serão pois bem obrigados a contribuírem para o resgate, o que é uma primeira derrota da união bancária. As condições de atribuição destes fundos prometem ser complexas. O ministro das Finanças limitou-se a indicar que os seus serviços “avaliariam se as pessoas foram aconselhadas correctamente.” Por outras palavras, o estudo dos processos anuncia-se longo e delicado e sem dúvida cheio de contestações possíveis. Sem estar a contar que haverá decepções: avaliou-se em 340 milhões de euros o montante das obrigações subordinadas destes quatro bancos vendidos aos particulares. Certamente, Pier Carlo Padoan fez já saber que o fundo será alargado, mas de acordo com modalidades de financiamento ainda por definir (pelo produto, nomeadamente da venda dos títulos de má qualidade). “A conta não está feita”, consideraram os manifestantes de acordo com o diário La Stampa.
Poupar os contribuintes a tudo o custo?
Esta crise que atravessa o governo italiano mostra que a aplicação das novas modalidades de resolução bancária europeias levantam graves problemas. Primeiro – e pôde-se também vê-lo com a Grécia que se apressou a recapitalizar os seus bancos antes do 1º de Janeiro – a questão da participação dos depositantes levanta um verdadeiro problema. Um governo que aceitaria ver os depósitos postos a contribuir para o resgate dos bancos assumiria um risco económico e político considerável. Seguidamente, a lógica que foi posta em prática na Itália e que consiste em fazer pagar os credores e os accionistas tem os seus limites, porque estes últimos nem sempre são Fundos abutres ou bancos internacionais. São também aforradores . Nos dois casos , um governo corre o risco de ter de recorrer aos contribuintes para amaciar o choque. Ora, é precisamente o que os Europeus queriam evitar: vincular o risco soberano ao risco bancário.
Uma união bancária pouco convincente
Como sempre, os autores da união bancária perderam uma ocasião. Querendo evitar, a pedido de Berlim, qualquer verdadeira mutualização dos riscos, fez-se assumir riscos políticos e económicos consideráveis aos Estados-Membros. O resultado pode ser o de ver os Estados membros a tudo fazerem para contornar este risco, prontos mesmo ainda a recorrer ao dinheiro público. O exemplo italiano está por conseguinte já cheio de ensinamentos. Tanto quanto este resgate bancário começa a fazer pairar uma ameaça sobre o conjunto do sector. Pier Carlo Padoan teve que tranquilizar esta segunda-feira afirmando que o sector financeiro italiano “era grande e sólido.” Mas vendo os aforradores a ficarem arruinados, os que colocaram o seu dinheiro em estruturas similares não podem ter senão MEDO e pensarem em levantar o seu dinheiro. Porque todos sabem que o peso dos créditos de má qualidade é considerável sobre os pequenos bancos italianos. E a directiva de resolução europeia assusta muitas pessoas na Itália onde a imprensa fazem o papel dos aforradores “de risco. ” Se o pânico se desencadeasse seria então o início de uma fase extremamente perigosa para a Itália e para a jovem união bancária europeia.