REQUIEM PARA UMA UNIÃO EUROPEIA JÁ MORIBUNDA. – REFLEXÕES EM TORNO DO BREXIT, DA UE E DA GLOBALIZAÇÃO – 22. UMA EUROPA FORTE NUM MUNDO DE INCERTEZAS, por JEAN-MARC AYRAULT e FRANK-WALTER STEINMEIER – IV

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E depois do Brexit caiu o pano e ninguém estava em cena, David Cameron, Boris Johnson, Nick Farage, Jeremy Corbyn tinham desaparecido – Uma série de textos tendo como pano de fundo a União Europeia e a sua classe política

Selecção e tradução de Júlio Mota

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Uma Europa forte num mundo de incertezas

Jean-Marc ayrault

Franl-Walter Steinmeier

 

 

 

Jean-Marc Ayrault, Frank-Walter Steinmeier, ministros dos negócios estrangeiros da França e da Alemanha, respectivamente

A Strong Europe in a world of uncertainties

Voltairenet.org, 27 de Junho de 2016

(CONCLUSÃO) 

Promover o crescimento e completar a União Económica e Monetária

Atualmente, a nossa moeda comum constitui o empreendimento  mais visível e ambicioso levado a cabo no âmbito da unificação europeia. O euro tem ajudado a proteger os seus Estados-membros de especulação internacional e contribuiu para a construção de um espaço económico comum. O euro reflete o nosso compromisso com a irreversibilidade da integração europeia. No entanto, temos de admitir que a crise e as suas consequências têm mostrado deficiências que fazem com que os cidadãos levantem questões sobre se a moeda comum cumpre as suas promessas e mesmo se esta coloca  dúvidas sobre a sustentabilidade do projeto em si mesmo. Temos, portanto, a intenção de trabalhar simultaneamente em três frentes: reforçar a convergência económica, aprofundar a justiça social e a responsabilidade democrática e melhorar a resistência aos choques para salvaguardar a irreversibilidade do euro. A França e Alemanha têm sempre visto isto como a sua principal responsabilidade para construir uma robusta zona do euro capaz de afirmar o seu modelo num mundo cada vez mais e mais competitivo.

Acreditamos que precisamos urgentemente de reviver esse espírito para conseguir avançar com o debate até bem mais longe. E é da responsabilidade dos nossos dois países, bilateralmente,  prosseguir nesse mesmo sentido. Temos de reconhecer que os requisitos de adesão e as implicações orçamentais  decorrentes da moeda comum tem sido maiores do que o que se poderia ter esperado quando o euro foi criado. Portanto, devemos respeitar os desejos dos outros para decidir por conta própria quando devem aderir ao euro.

  • Para superar a crise, a zona do euro tem que entrar numa fase renovada da convergência económica. Para este fim, a França e a Alemanha deverão partilhar lado a lado a principal responsabilidade em organizar um processo de convergência económica e de governação política que equilibre as obrigações e a solidariedade para acompanhar este  processo. Os países com excedentes e défices terão de mudar a respetiva posição, uma vez que um alinhamento unilateral  não é politicamente praticável.

  • O potencial de crescimento tem sido gravemente dificultado pela crise. A Europa precisa urgentemente de desbloquear o potencial inexplorado inerente à realização do mercado único em sectores específicos de interesse estratégico. A França e Alemanha continuam empenhados em iniciativas bilaterais para harmonizar rapidamente a regulamentação e supervisão assim como os regimes de tributação das empresas. Para desbloquear  o crescimento e aumentar a produtividade da economia europeia, é necessário um esforço renovado para se realizarem mais investimentos, tanto privados como públicos. A França e a Alemanha reiteram o seu empenho em aplicar as reformas estruturais para atrair investimento internacional e para aumentar ainda mais a competitividade das suas economias.

  • Neste contexto, devem ser tomadas iniciativas específicas a fim de promover o crescimento e a convergência entre os Estados-Membros em sectores estratégicos como a energia, o sector digital, a investigação e a inovação ou formação profissional. A curto prazo, metas comuns podem e devem ser criadas, ligadas a objetivos regulamentados e aos meios de investimento baseados estes na ampliação do Fundo Europeu de investimento estratégico. A médio prazo, esses setores estratégicos devem evoluir para um quadro regulamentar comum e até mesmo para uma autoridade de supervisão partilhada e beneficiar de uma capacidade de investimento europeu estruturado para promover a convergência através de investimentos transfronteiriços. Iniciativas bilaterais desencadeadas pela Alemanha e França devem ser realizadas nesse âmbito.

  • A arquitetura atual do euro não é suficientemente resistente a choques externos ou a desequilíbrios internos. Deixar a arquitetura da UEM incompleta põe em risco a sobrevivência da nossa moeda comum a longo prazo. Completar a UEM  envolverá a intensificação em continuo da governação política, bem como a repartição dos encargos orçamentais. Tendo em conta os desequilíbrios existentes,  um aprofundamento da UEM não aparecerá por efeito de um big bang, mas como o resultado de uma evolução gradual e pragmática, tendo em conta os resultados necessários em termos de crescimento e emprego. Estes resultados são indispensáveis para reforçar a confiança na União Europeia entre os Estados-Membros e os cidadãos e criar as condições políticas adequadas para novos passos de integração de modo a poder completar a UEM.

  • Devemos reconhecer que os membros da UEM partilham diferentes tradições quanto à elaboração e aplicação da política económica que têm de ser compensadas para que o euro funcione corretamente. Uma futura arquitetura do euro não irá ser construída a partir exclusivamente de regras nem será feita com base na simples tomada de decisão política simples… nem será dirigida exclusivamente pelas forças de mercado. Cada etapa no aprofundamento da UEM vai abranger todos estes aspetos.

  • Dado que as políticas económicas da UEM são cada vez mais um domínio de decisões partilhadas, os cidadãos corretamente esperam justamente retomar o seu controlo através de instituições supranacionais responsáveis perante eles. A curto prazo um Presidente em tempo integral do Eurogrupo deve ser responsável perante um subcomitê da zona euro no Parlamento Europeu. No longo prazo, o Eurogrupo e o seu Presidente devem ser responsáveis perante um órgão parlamentar, composto por membros do Parlamento Europeu, com a participação de membros dos parlamentos nacionais. Esta câmara deve ter plena autoridade sobre quaisquer questões em matéria orçamental e em supervisão macroeconómica.

  • Neste contexto nós devemos desenvolver o mecanismo europeu de estabilidade (MEE) num Fundo Monetário Europeu de pleno direito sujeito a controle parlamentar.

  • Uma capacidade orçamental – uma característica comum de qualquer união monetária bem sucedida em todo o mundo – continua a ser uma pedra angular que falta na arquitetura da UEM. A longo prazo esta capacidade orçamental deve proporcionar a estabilização macroeconómica a nível da zona euro ao mesmo tempo que evita permanentes transferências unidirecionais. Considerando que esses recursos devem ser acumulados ao longo do tempo e em consonância com o progresso na tomada de decisões comuns em matéria de política económica e orçamental, este processo deveria começar o mais tardar até 2018, para apoiar o investimento nos Estados membros mais severamente atingidos pela crise. A Alemanha e a França devem formar um grupo preparado para levar a cabo a realização desta tarefa.

  • O apoio público para o euro é prejudicado pela falta de progresso na sua dimensão social e na justiça fiscal entre os Estados-Membros. Daí que, como princípio geral, qualquer passo para aprofundar ainda mais a UEM deva ser acompanhado pelo progresso no domínio da tributação comum, em particular no que diz respeito às empresas transnacionais, bem como no desenvolvimento de uma união social apoiada por normas sociais mínimas comuns.

 

Jean-Marc Ayrault e  Frank-Walter Steinmeier.  A strong Europe in a world of uncertainties. Texto publicado em Voltaire.net, disponível em:

https://www.voltairenet.org/IMG/pdf/DokumentUE.pdf

Os autores:

  1. Jean-Marc Ayrault Prime Minister of France (2012-14). Minister of Foreign Affairs (since 2015).

  1. Frank-Walter Steinmeier é um político alemão, filiado no Partido Social-Democrata da Alemanha. Foi chefe da chancelaria entre 1999 e 2005, no governo de Gerhard Schröder. Foi Ministro dos Negócios Estrangeiros no governo Schroeder (2005-2009) e líder da Oposição Parlamentar (2009-2013)

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Ver o original em:

http://www.voltairenet.org/article192564.html

ou em:

https://www.voltairenet.org/IMG/pdf/DokumentUE.pdf

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Para ler a Parte III deste texto de Jean-Marc Ayrault e Franz-Walter Steinmeier, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, clique em:

REQUIEM PARA UMA UNIÃO EUROPEIA JÁ MORIBUNDA. – REFLEXÕES EM TORNO DO BREXIT, DA UE E DA GLOBALIZAÇÃO – 22. UMA EUROPA FORTE NUM MUNDO DE INCERTEZAS, por JEAN-MARC AYRAULT e FRANK-WALTER STEINMEIER – III

 

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