CARTA DE VENEZA – “CIAO, MAESTRO” – por Vanessa Castagna

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Já correu o mundo a notícia da morte de Dario Fo: o dramaturgo, prémio Nobel da Literatura em 1997, faleceu em Milão na passada quinta-feira, dia 13, aos 90 anos. Artista plurifacetado e protagonista de um incansável ativismo político ao longo de toda a sua vida, destacou-se por saber revitalizar a tradição dos jograis medievais para criticar o poder, devolvendo dignidade aos oprimidos. Contudo, e querendo parafrasear uma afirmação de Franca Rame, a sua obra e a sua vida são tão ricas que não caberiam em dez livros.

A obra vibrante de Dario Fo em Portugal é conhecida sobretudo graças à grande paixão que outro grande homem de teatro, Filipe Crawford, sempre dedicou à dramatização, encenação e interpretação das obras-mestras do autor italiano, com um trabalho brilhante e talvez capaz de compensar no palco o escasso interesse das editoras nacionais. Vale a pena mencionar, entre outras peças dadas a conhecer ao público português, A história do tigre, Dédalo e Ícaro, O santo jogral Francisco, ou até mesmo Mistério Bufo.

Nascido perto de Varese, milanês de adoção, na verdade Dario Fo mantinha uma ligação forte com a região do Véneto (de que Veneza é capital), em primeiro lugar através da presença viva em memoráveis atuações, por exemplo na Arena de Verona, ou em importantes teatros das outras cidades da região, como Pádua e Vicenza, para além da própria Veneza.

Em Verona, junto do Arquivo de Estado, encontra-se atualmente um espaço que abriga e pretende valorizar o arquivo dedario-fo mais de seis décadas de atividade de Dario Fo e da inseparável esposa e companheira, Franca Rame (falecida em 2013).

Em Abano, perto de Pádua, vive, ainda, a família Sartori, que, com mestria e competência transmitidas de pai para filho e uma técnica de construção reinventada, realizava as máscaras que Dario Fo usava nas suas representações. A máscara, de resto, é um elemento fundamental da commedia dell’arte e de toda a tradição que daí procede e ainda hoje é um objeto icónico associado à tradição do Carnaval veneziano, embora antigamente na Sereníssima o seu uso pudesse estender-se também a outras épocas do ano.

O arquivo de Franca Rame, consultável online (http://www.archivio.francarame.it/), guarda inúmeras fotos da presença do artista em Veneza, já na década de 70, como a que partilhamos aqui como testemunho da encenação de Mistero Buffo em 1977: o Maestro surge rodeado de jovens e com a vigorosa vitalidade que nunca o abandonou. É assim que nos queremos despedir dele.

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