EDITORIAL: As praxes académicas, feitas por medida para estudantes imbecis e reitores desonestos – por Carlos Loures.

Imagem2O Ensino Superior é uma estrutura onde os cidadãos vão colher saberes e competências  que lhes permitam desenvolver actividades especializadas indispensáveis ao funcionamento das comunidades – não será demagogia considera-los trabalhadores ou aprendizes de trabalhadores. Talvez há cem, cento e cinquenta anos atrás, quando a percentagem de analfabetismo era de cerca de 80%. quando havia apenas três universidades e os estudantes pertenciam na sua generalidade a  famílias ricas. o ofício de estudar pudesse ser avaliado de uma maneira diferente – João de Deus enamorou-se a tal ponto da boémia coimbrã que só obteve o diploma dez anos depois de ter entrado na Universidade – reprovou por faltas, por simulação de ignorância… todos os pretextos lhe serviam para adiar os actos académicos que o transformariam num ‘desprezível ‘ futrica. O erário público não seria grandemente afectado por bizarrias deste tipo – eram as famílias quem as suportava. Mas as coisas mudaram.

Em Portugal, não sei quanto nos custa formar um médico. Sei que, há uma dezena de anos, na Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Nova de Lisboa, os seis anos de curso custavam ao Estado  aproximadamente 90 mil euros. Hoje, o custo deve ultrapassar os cem mil. Portanto, é miserável que quem obtém uma qualificação paga pelos impostos de muitos cidadãos que não puderam formar-se, se permita gastar tempo em praxes e tradições. Mais miserável é a complacência de muitos dos pagantes – «são jovens… » . Como se muitos dos que trepam pelos andaimes, dando  serventia a pedreiros, não fossem jovens também. Mas se o caso de estupro que me leva a escrever estas linhas fosse praticado por operários de 19 ou 20 anos, a juventude não seria invocada. O crime de estupro é punido em alguns países com a pena de morte. Aqui os cinco ou seis «jovens» que drogaram uma rapariga (depois de a terem drogado), estarão daqui por uns anos a circular nos corredores de hospitais, estetoscópio ao pescoço para se distinguirem dos enfermeiros, ou vestindo a beca, discursando, acusando ou defendendo… Os crimes, as humilhações torpes a que submeteram caloiros, serão talvez recordados com nostalgia… «a malta era jovem…»

No caso da praia do Meco,e que vitimou os seis alunos da Lusófona, o reitor declarou não ter o direito de violar a autonomia da Associação Académica (e por termo à praxe). Este respeito pela autonomia associativa, é um insulto aos jovens de há 50 anos, que reivindicavam essa autonomia, mas não para violar, matar ou humilhar colegas. No meio desta exibição de estupidez, há aspectos anedóticos –  A Universidade do Minho, fundada em 1973, criou um traje académico apalhaçado – tricórnio do século XVIII, casaca comprida… Na Universidade de Oxford, um pouco mais antiga (fundada em 1096), pude ver pude ver que os trajes académicos consistem em discretos blazers com o brasão de armas bordado a ouro no bolso superior.

Este texto ficará na intimidade de escassos leitores. Vou fingir que não: peço ao ministro da tutela que ponha radicalmente termo a praxes e tradições (aceitáveis em Coimbra). Ridículas quando não mesmo criminosas em toda as outras, Os estudantes são homens e mulheres que à custa dos contribuintes se transformam em feiticeiros da tribo. Estudem, trabalhem – não estão num jardim-escola, mas sim aprendendo  a trabalhar.

E se cometem crimes devem ser punidos como criminosos, sem atenuantes, com as penas que a Lei estabelece. Alcoentre também tem praxes e tradições – é lá que os que sob a desculpa de praxes e «tradições» (reitores incluídos) deviam estar.

Plenário na Alameda da Universidade, em Lisboa, durante a crise académica de 1962. À maneira do «onde está Wally», experimente encontrar estudantes «trajados»-

1 Comment

  1. Brilhante ,sobretudo, muito justo. Felicito-te
    Até na minha querida Coimbra há que colocar um travão no que só é demonstração de estupidez, falta de qualquer humor, ausência de civismo e exibição despudorada dum atraso cultural assustador. Abração do CLV.

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