Sobre o espírito do capitalismo. 1 -Armageddon fora daqui. Por Dido Sandler

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Sobre o espírito do capitalismo

 

Seleção e tradução de Júlio Marques Mota 

1. Armageddon fora daqui

Por Dido Sandler

Financial Times, 1 de dezembro de 2017

 

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Uma cena de Armageddon, o filme que conta a história de um asteroide a dirigir-se para a terra, © Getty

 

Prepararmo-nos para um desastre financeiro pode não ser uma má ideia

As negociações Brexit caem de uma falésia, causando um choque enorme à economia do Reino Unido. Depois, o Labour Radical ganha as próximas eleições e estamos de regresso à década de 1970, com um massivo aumento nas despesas públicas, com elevadas taxas de juros e de inflação, com uma crise na balança de pagamentos, com os impostos a dispararem e uma corrida à libra.

Claramente, um mau Brexit não terá o mesmo impacto inflacionário global que o quadruplicar do preço do petróleo na década de 1970- um catalisador central, então, para os problemas económicos da década. Embora alguns gestores de fundos de investimento esperem menos prodigalidade do Partido Trabalhista do que os pronunciamentos do partido sugerem, quando John McDonnell, o Chanceler- sombra, admite que se está a preparar para uma possível crise da libra esterlina, muitos sentem que prepararmo-nos para um Apocalipse financeiro pode não ser uma má ideia.

A vida para os ricos tornou-se mais fácil desde a década de 1970, embora noutros aspetos mais desafiante. A força de trabalho tornou-se globalmente móvel, com o dinheiro a ser agora transferido em torno do mundo com o simples movimento de carregar numa tecla.

Quando o ex-presidente francês François Hollande introduziu um imposto de 75 por cento sobre os mais ricos, muitos trabalhadores franceses ricos simplesmente voaram para melhores paragens fiscais, com o mercado imobiliário de Londres a ser um dos principais beneficiários.

Na Grã-Bretanha dos anos 1970, havia controlos de câmbio rigorosos evitando que os indivíduos levassem o seu dinheiro para fora do país. Mas esses controlos nem sempre funcionavam. Julian Chillingworth, diretor de investimentos de Rathbones, diz que os britânicos apanhavam o avião para Jersey ou para a Suíça com malas cheias de dinheiro. “Era um pouco embaraçoso ser mandado parar na alfândega”, diz ele. “e as pessoas eram apanhadas.”

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O líder do Partido Trabalhista, Jeremy Corbyn

Hoje em dia, seria muito difícil para um governo limitar as fugas financeiras, diz Brian Tora, um consultor na JM Finn. Mas não é impossível fazê-lo.

Com melhores comunicações, no entanto, veio a transparência. Na década de 1970, uma vez que os ativos foram escondidos em offshores seguros, estes ativos eram difíceis de localizar. Enquanto que agora, adverte Rachel de Souza, parceira na equipa de clientes privados no RSM, o HM Revenue & Customs [autoridade tributária e aduaneira do Reino Unido] dispõe da informação que permite tributar o rendimento de seja quem for à escala mundial. Cada vez há mais países que estão a adotar regras comuns de comunicação estandardizadas que foram criadas para combater a evasão fiscal.

Para evitar as garras do HMRC (HM Revenue & Customs) permanentemente, um investidor rico precisaria de estar fora do Reino Unido durante cinco anos, preferentemente vivendo numa jurisdição de baixa tributação, como a Suíça.

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Primeira-ministra Theresa May na cimeira europeia de outubro de 2017 © Aurore Belot/AFP/Getty Images

 

Os conselheiros têm uma série de ideias sensatas para proteger as finanças dos investidores. De Souza sugere a venda de bons ativos das pessoas ricas com um ganho de capital a um terceiro ou uma empresa para assegurar o ganho à atual taxa de imposto mais baixa. Os ricos devem igualmente considerar mudar o seu mandato do investimento do rendimento para o crescimento, porque o imposto sobre os ganhos de capital deve permanecer mais baixo do que o imposto sobre o rendimento no quadro de um governo do Partido Trabalhista

Ben Simpson, chefe executivo da Menzies Wealth Management, diz que as famílias ricas devem considerar a hipótese de oferecerem presentes aos seus descendentes uma vez que nenhum imposto sucessório é pagável se sobreviver sete anos.

“Às vezes, a estratégia mais simples é a melhor”, diz ele. E Jason Hollands, diretor-gerente da Tilney Bestinvest, recomenda pagar antecipadamente os encargos escolares, para antecipar a imposição potencial da IVA-uma medida chave na política de um governo sob a direção do líder trabalhista Jeremy Corbyn.

Os mercados superarão [a vitória de Corbyn]. Eles estão a recuperar bem muito rapidamente nestes dias.

Contudo, os gestores de fortunas estão imperturbáveis relativamente a qualquer possível efeito da tomada de poder da esquerda sobre os resultados financeiros do investimento. Eles normalmente detêm apenas 10-15 por cento em ações do Reino Unido nas suas carteiras de clientes.

O rendimento no estrangeiro é tributado geralmente quando se materializa. Os mercados do Reino Unido reagiram negativamente à votação do Brexit, mas o rescaldo foi marcado por uma recuperação rápida.

Jim Wood-Smith, diretor de investimentos na Hawksmoor Investment Management, acredita que uma vitória de Corbyn provocaria uma reação semelhante. “Os mercados vão superar isso”, diz ele. “Eles superaram furações, superaram o facto da Coreia do Norte enviar um míssil balístico sobre o Japão. Eles estão a ultrapassar muita coisa e muito rapidamente nos dias de hoje.”

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St Helier em Jersey, para onde os britânicos na década de 1970 levaram o seu dinheiro para escapar aos rigorosos controlos cambiais © Matt Cardy/Getty Images

 

A maioria dos especialistas, no entanto, concordaria que a única certeza neste momento é a persistência da incerteza. David Miller, diretor executivo da Quilter Cheviot, diz que os ricos devem diversificar por toda uma série de ativos, tanto em papel como em termos de investimentos físicos. Eles devem olhar para propriedades, ouro, arte, violinos, bem como em títulos em diferentes zonas do mundo para se defenderem contra a intervenção do governo ou contra algum choque geopolítico, diz ele.

Mas mesmo o ouro pode não ser seguro. Na década de 1930, o Presidente Roosevelt nacionalizou quase todo o ouro físico detido nos EUA. Em tempos de Armageddon financeiro, mesmo o investimento de último recurso [em ouro] pode não ser suficiente.

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