A propósito de um artigo sobre um novo partido político a partir de Belém, sobre a corrupção, sobre a geringonça – por Francisco Tavares

 

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Cartoon da autoria de Vasco Gargalo realizado para uma reportagem da RTP que regista o segundo aniversário dos inéditos acordos de Governo entre PS, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes.

Em 12 de maio de 2018 FTavares

Há dois dias atrás mão amiga fez-me chegar um artigo intitulado “Um novo partido político a partir de Belém” (de Paulo Vieira da Silva, ver aqui).

Ele há corrupção….. é verdade

Ele há políticos corruptos……é verdade

Ele há políticos incompetentes…. é verdade

Ele há os partidos fechados, espécie de donos do sistema …. é verdade

Ele há partidos que não se renovam……é verdade (embora fosse interessante uma análise em concreto, com dados concretos).

Tudo isso é verdade.

Mas, ele há muito direitinha que bem gostaria de deitar abaixo a geringonça……. lá isso é também bem verdade.

A geringonça funciona mal, os problemas continuam por resolver (sobretudo a reversão do que Troika e Passos Coelho fizeram), o limiar da pobreza toca quase 25% da população (e não só em Portugal) ………verdade, pura e dura.

E também é verdade:

  • Que continuamos atados de pés e mãos com as políticas da UE,
  • A austeridade continua a ser um idolatrado Belzebu,
  • O famigerado défice “compensador”, que não encontra sustentação em nenhuma teoria económica digna desse nome, continua a dominar o panorama geral,
  • Não foi revertida a desregulação do mercado de trabalho, ou seja, fora com sindicatos e direitos do trabalhador, trabalho precário, salários baixos,
  • Viva a privatização de tudo o que sendo público cheire a dinheiro.

O discurso de que estamos em recuperação, de que ela teria existido com este governo ou qualquer outro já por aí anda (vd., entre outros, o discurso do ex-ideólogo da esquerda anos 70-80, e hoje bem à direita do PS, dr Vital Moreira). Afinal, para que precisamos de partidos?

Discurso esse contrariado pela realidade dos factos. De facto, se atentarmos no discurso do (insuspeito) governador do Banco de Inglaterra, Mark Carney, no G20 de 26 de fevereiro de 2016 sobre o crescimento e como ele tem sido desolador nos últimos 7 anos, a conclusão não parece ir no sentido de que estamos no bom caminho, pelo contrário, como se pode ver no seguinte sugestivo gráfico 1 contido nesse discurso:

pediatrico 4(vd. https://www.bankofengland.co.uk/-/media/boe/files/speech/2016/redeeming-an-unforgiving-world.pdf?la=en&hash=7B7AC35CC3017FCD8EF5BE7D5F2D0C4EA22C7E05).

Como diz Júlio Mota em artigo publicado na A Viagem dos Argonautas:

(…)a argumentação levantada contra a geringonça por Vital Moreira faz-me lembrar uma afirmação de um colunista do Washington Post, Matt O’Brien, que em torno da crise escreveu: “será preciso que nos façam chorar até rirmos às gargalhadas ou que nos façam rir até chorarmos convulsivamente?”

Em forma de conclusão, (…), o que eu aqui faço, (…), é mais um grito de revolta, apenas isso mesmo e talvez o último nesta matéria, em face do massacre produzido pela austeridade cega a que a União Europeia nos obrigou e ainda nos obriga e o exemplo aqui apresentado é um claro exemplo do mal-estar que, em consequência, grassa pela classe média em Portugal.

Ou não será assim?

(em https://aviagemdosargonautas.net/2018/05/10/ainda-as-longas-filas-de-espera-no-hospital-pediatrico-de-coimbra-a-politica-de-austeridade-a-incapacidade-das-administracoes-hospitalares-o-desrespeito-dos-cidadaos-a-fragmentacao-social-a-descr/ )

 

Ahhh, há por aí saudosos da direita/Troika (dona do poder por lei divina), mas também muitos saudosos do bloco central……. ou sobretudo de um PS “aliviado” da influência do PCP e do Bloco.

O ataque aos problemas de corrupção, da estagnação económica, não vêm de soluções milagrosas, como a de um novo partido, e ainda menos vindo da presidência (aqueles que temos memória sabemos o que aconteceu ao eanismo, e não tenho menosprezo algum em relação ao general Eanes, pelo contrário).

É, por isso, necessário insistir em que, como explicou magistralmente Mark Blyth, a austeridade é uma ideia perigosa, mas que, por cegueira política ou ideológica, continua a fazer o seu curso ao longo do tempo. Existem alternativas, e autores tão insuspeitos de radicalismo, ou de populismo, como J. Stiglitz e outros, têm falado amplamente delas.

O limiar da pobreza está escandalosamente presente em muitos lares portugueses (e também da eurozona para não ir mais longe), a fragmentação social está aí, e com ela vem a descrença na democracia, ou os silêncios ruidosos de que alguns falam.

A democracia não está órfã, não precisa de um “paizinho” para tomar conta dela. Mas está, certamente, gravemente descuidada, em resultado de políticas socialmente desastrosas que se insiste em não reverter. O “são todos iguais” é sem dúvida um lema bem amado pela direita. Como alguém disse “o desprestígio geral da política e dos partidos unicamente beneficia a direita”. Há, sem dúvida, que apelar aos princípios e valores democráticos a fim de combater e acabar com a corrupção. Mas a manterem-se as políticas altamente desagregadoras da sociedade, não haverá princípios e valores que valham à democracia.

Por isso, no que puder contribuirei para que se mantenha a GERINGONÇA, e mais, que o apoio que lhe venha a ser dado seja crítica e positivamente influenciada pelas forças à esquerda, sejam elas do PS e à sua esquerda, sempre numa base de apoio popular e nunca pelo poder que possa emergir de um palácio qualquer.

 

 

1 Comment

  1. Mas será necessário não esquecer alguém que, abusivamente, anda a ganhar terreno e pretende refazer o tal bloco central. Para isso – parece evidentíssimo – anda a pensar num 18 do Brumário feito, não á custa dum glória militar mas de beijos e abraços “ad libitum”. CLV

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