MOSAICOS CHINESES, de JOÃO MARQUES

OBRIGADO AO JOÃO MARQUES E AO DIÁRIO DE COIMBRA

Depois do que representou o período colonial, temos de reconhecer que os apoios consignados pela Europa, numa pretensa ajuda aos africanos, não tiveram as consequências desejáveis, sobretudo para a grande maioria da população jovem, recordando que o projeto “União para o Mediterrâneo”, apresentado na Cimeira de Paris, em 2008, envolvendo 43 países e procurando abrir o futuro do continente, não conseguiu libertar-se de uma malha de interesses espúrios e de situações que conduziriam a uma violência incontrolável.

Agora, todos sentimos fluxos de migrantes que procuram o espaço europeu para (sobre)viverem, originando fendas profundas no que resta da coesão europeia, nunca esquecendo a intervenção, sobretudo francesa e inglesa, na Líbia – nunca explicitada politica ou diplomaticamente, e que abriu uma verdadeira autoestrada à ação de verdadeiros vendedores de carne humana, ao mesmo tempo que o país se encontra partilhado entre poderes de grupos armados, vivendo e bem à custa da exploração do petróleo.

Na semana passada, foram até surpreendente as visitas quase simultâneas da chanceler Merkel e da primeira-ministra inglesa Theresa May a países do centro africano, no que terá sido uma tentativa de resposta à realização da III Cimeira do Fórum Sino-Africano (3/4 setembro) em Pequim e quando a China, voluntariamente alheada das problemáticas europeias, já é, desde o início desta década, o maior investidor em África.

Dias antes da chegada das duas líderes europeias, já Xi Jinping tinha andado pelo Senegal, Ruanda – onde 62% das estradas são construídas por eles e onde deixou $450 milhões para financiar 62 projetos de desenvolvimento – Ilhas Maurícias e África do Sul, onde vai investir $2,5 mil milhões numa nova central térmica e, em colaboração com a Daimler-Benz (DB), irá construir uma fábrica de automóveis, sabendo-se que o seu conglomerado “Geely” adquirirá 8,7% da DB, o que o coloca como investidor principal no grupo Mercedes-Benz.

Aliás, a Alemanha começou por colocar obstáculos à aquisição de empresas por estrangeiros, sendo o caso mais flagrante o da empresa de semicondutores Aixtron, ligada à indústria de defesa, impedida de passar para mãos chinesas, quase em cima do momento previsto para a transação. Cerca de 22% de capitais chineses eram investidos na Europa (1917, Bird’s Eye View), de preferência na indústria motorizada, transportes e infraestruturas, enquanto nos Estados-Unidos a energia e as tecnologias de informação eram os principais alvos.

Entre nós, a “CTG” controla a EDP, a “State Grid of China”, já o maior gestor de redes elétricas mundiais, tem 25% da REN, 24% da sua equivalente grega e do seu principal porto (Pireu) e 30% da principal sociedade italiana de transporte de gás, enquanto a “FOSUM” é a maior acionista do principal banco privado (BCP), além de participações na seguradora Fidelidade e na Luz-Saúde.

Vamos concluir com duas situações antagónicas. Uma ocorreu há dois anos na Bretanha (Finisterra), quando centenas de chineses vieram para inaugurar o que seria a maior unidade industrial de fabrico de leite em pó infantil no mundo (Synutra), com torres de secagem gigantes, mas todo o processo correu mal, ao ponto de que a primeira cooperativa leiteira francesa (Sodial) já está no processo final de aquisição do imóvel e parte do equipamento.

A outra, dramática, dura desde a ocupação pelos chineses, em 1949, de parte do Turquestão Oriental, zona com dez milhões de muçulmanos (uigures), conhecida por Xinjiang, sujeitos a uma repressão brutal, tanto em campos denominados de reeducação, onde a tortura é quotidiana, como na videovigilância nas mesquitas, ficando na memória histórica, a manifestação de estudantes na capital da província (Urumki, 2009), com centenas de mortos e um número nunca calculado de feridos e desaparecidos. Entretanto, alguns atentados de origem islâmica vão surgindo.

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