Homeostase – Processo de regulação pelo qual um organismo consegue a constância do seu equilíbrio, in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa.
Recorri ao Priberam (como faço muitas vezes) quando li na entrevista ao médico e investigador português António Damásio, publicada no diário ‘La Vanguardia’ em Agosto passado, ‘os sentimentos são a representação do estado corporal. Se há bem-estar, a homeostase está a funcionar perfeitamente e há harmonia nos sistemas vitais. Quando se tem medo ou se está doente, há constrição nos sistemas vitais e rompe-se a harmonia’.
E face ao espanto do jornalista por, até por isso mesmo e numa época como esta, Damásio continuar manter o seu manifesto optimismo, ‘a vida necessita regulação e, nos seres como o homem, essa regulação é muito mais complexa, pois temos de nos servir dos sentimentos para guiar o comportamento’.
– Mas evoluir não é melhorar?
– Não creio que a evolução nos acerque da perfeição, só aumenta a capacidade de sobrevivência. As nossas possibilidades de sobreviver como seres complexos, aumentam com cultura e inteligência, embora em épocas como a actual, tal não pareça acontecer’.
Depois de a ler bem não resisti a juntar a esta, uma outra entrevista feita ao filósofo Eduardo Mendieta, um respeitado investigador na área da evolução cultural e social do género humano.
Mendieta começa por salientar a importância das fotografias transmitidas pelo Apolo XII, para confirmar que ‘a Terra não passa de um minúsculo berlinde azul perdido na imensa solidão de um negro vazio’.
– Ainda estamos aí? Sorte a nossa! espanta-se o jornalista.
– Mas é mesmo assim e a nossa geração, está a viver a quarta degradação: Copérnico degradou a Terra, que não é centro de nada; Darwin degradou a espécie humana, que não é o cume de nada; Freud degradou o eu, que não é autónomo para nada, só a marioneta do inconsciente…
– E a quarta?
– A vida é um ínfimo episódio temporal na existência da Terra! Estamos a ir como uma flecha na espiral em que desapareceremos? Aqui aparece a ética como questão…
– Que é?
– Já conscientes da incerteza do tempo para a espécie humana… como viver? Ser ético é dar tempo, cuidar, olhar bem, responder, assumir responsabilidade… tudo isto nos pede tempo… dar tempo!
– Sou muito cioso do meu tempo!
– Então faça como Trump faz: negar o tempo, roubar o tempo às gerações vindouras.
– Vou ter de pensar nisso…
– A vida é uma contingência, nada de especial no drama terrestre! A vida é só uma versão do planeta auto concebendo-se! Mas você… tem um tempo e isso é tudo!
Não quero, nem tenho qualquer legitimidade para o fazer, tecer reflexões mais ou menos moralistas a partir das declarações dos dois pensadores mas acredito que, a ver pelas degradações apontadas, se me colar ao passado ainda acabo por apanhar uma depressão.
Se, por outro lado, não me conseguir libertar da ideia de um futuro a partir do patético americano da presidência, só virei a ter ansiedade e stress como companhias constantes até ao sorvedoiro final!
É bem verdade que esta vida é um conflito permanente com as tenazes que arrastamos desde que aqui chegámos: a das palavras e actos e a dos silêncios e omissões (já não me lembro quem o afirmou!), complicada agora e, pelo que os dois investigadores disseram, com a obrigatória reaprendizagem que teremos de fazer da questão do tempo.
E, mais importante ainda, não podemos nem devemos esquecer que até podemos estar sujeitos a ir embora sem tempo para selfies nem likes, a maior de todas as degradações!
António M. Oliveira
Não respeito as normas que o Acordo Ortográfico me quer impor
“Um minúsculo berlinde azul” – nada mais que isso – a quem alguns têm a audácia de atribuir capacidade para influir na evolução climática.CLV