Tomdispatch, Tomgram: Rajan Menon, The Wages of Poverty in America
15 de Julho de 2018
Selecção e tradução por Júlio Marques Mota
Introdução
Tom Engelhardt: Rajan Menon, Os salários de pobreza na América
[Note for TomDispatch Readers]: Eu sugiro que, em conjunto com a poderosa peça de Rajan Menon sobre a pobreza americana de hoje, qualquer um dos leitores que perderam o artigo de Beverly Gologorsky, “What Does Poverty Feel Like?,” deveria lê-lo e depois comprar o seu novo e impressionante romance editado por Dispatch Books, Every Body Has a Story, que incide sobre como se sentiram aqueles que foram atingidos pela Grande Recessão. Diz a romancista Elizabeth Strout, vencedora do Prémio Pulitzer, “este livro talvez vos faça doer o coração, mas ele colocar-vos-á interiormente com uma maior capacidade de amar e de lutar – que livro, de facto! Graças a Haymarket Books, os leitores de TomDispach ainda podem comprar o romance de Gologorsky a metade do preço clicando aqui: https://www.haymarketbooks.org/books/1163-every-body-has-a-story?discount_code=Everybody50 Tom]
Nestes anos, muita atenção tem sido dada ao aumento do estado de segurança nacional e pouco ao que Rajan Menon chama no TomDispatch de estado de (in)segurança nacional. A administração Trump e um Congresso Republicano, é claro, deram um presente notável, um projeto de “reforma” fiscal, aos já fabulosamente ricos e agora estão a trabalhar fortemente para cortar os fundos do governo para os necessitados. Além disso, eles estão mais uma vez a tentar degradar os cuidados médicos para os americanos comuns, perseguindo o programa Affordable Care Act (aka Obamacare) – “bloqueando milhares de milhões de dólares em pagamentos anuais exigidos pela lei para nivelar o custo para as seguradoras cujos clientes precisam de serviços médicos caros”.
Tendo aumentado enormemente os défices futuros do orçamento com a lei Trump sobre os impostos, os republicanos no Congresso estão agora a prometer resolver o problema, querendo atacar a Segurança Social, Medicare e Medicaid. E tenha presente que este já é um país em que três homens (Bill Gates, Jeff Bezos e Warren Buffett) têm tanta riqueza quanto a metade inferior da sociedade, enquanto a desigualdade atingiu já os níveis da Idade de Ouro e há mais para vir.
Acontece que Philip Alston, relator especial das Nações Unidas para a pobreza extrema e os direitos humanos, prestou recentemente uma rara atenção à desigualdade americana de uma forma muito próxima e pessoal. Fez uma viagem pelas zonas de pobreza da nação mais rica do planeta, algumas tendo em vista cenas crescentes de riqueza incrível. No processo, registou situações sinistras onde era visível o aumento da pobreza extrema (particularmente entre os jovens). Eis aqui apenas uma amostra do que ele encontrou: “Um número chocantemente alto de crianças nos EUA vive na pobreza. Em 2016, 18% das crianças – cerca de 13,3 milhões – viviam na pobreza, com crianças representando 32,6% de todas as pessoas em situação de pobreza. As taxas de pobreza infantil são mais altas nos estados do sul, com o Mississippi [e] Novo México em 30% e Louisiana em 29%”. Note-se que, em parte como uma resposta ao relatório de Alston – como ele ousa focar na pobreza e nos direitos humanos nos Estados Unidos, a administração Trump recentemente retirou-se do Conselho de Direitos Humanos da ONU.
Hoje, Rajan Menon explora o que pode ser pensado como o estado profundo da (in)segurança nacional na América. É uma história sórdida e, na era de Trump, é sem dúvida apenas o prefácio de uma história trágica ainda para vir.
Tom
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A (In)Segurança National nos Estados Unidos da Desigualdade
Rajan Menon, 15 de Julho de 2018
Assim, efetivamente o establishment de Beltway capturou o conceito de segurança nacional que, para a maioria de nós, automaticamente evoca imagens de grupos terroristas, guerreiros cibernéticos ou “estados párias”. Para afastar esses inimigos, os Estados Unidos mantêm uma constelação de bases militares no estrangeiro sem precedentes na história e, desde o 11 de Setembro, travaram guerras no Afeganistão, Iraque, Síria, Líbia e noutros locais que absorveram quase 4,8 milhões de milhões de dólares. O orçamento do Pentágono para 2018 já totaliza 647 mil milhões de dólares – quatro vezes mais do que a China, segundo em gastos militares globais, e mais do que os 12 países seguidos juntos, sete deles aliados americanos. Em boa medida, Donald Trump acrescentou mais US$ 200 mil milhões aos gastos projetados com defesa até 2019.
No entanto, ao ouvir os falcões falar, os Estados Unidos nunca estiveram menos seguros. Assim se vai a eficiência do dinheiro. .
Para milhões de americanos, no entanto, a maior ameaça à sua segurança quotidiana não é o terrorismo, nem a Coreia do Norte, o Irão, o a Rússia ou a China. É interna – e é económica. Isso é particularmente verdadeiro para os 12,7% dos americanos (43,1 milhões deles) classificados como pobres pelos critérios do governo: um rendimento abaixo de US$ 12.140 para uma família de uma pessoa, US$ 16.460 para uma família de duas pessoas e assim por diante… até chegar à soma principesca de US$ 42.380 para uma família de oito pessoas.
As poupanças também não ajudam muito: um terço dos americanos não tem poupanças e outro terço tem menos de 1.000 dólares no banco. Não admira que as famílias que lutam sozinhas para cobrir o custo dos alimentos tenham aumentado de 11% (36 milhões) em 2007 para 14% (48 milhões) em 2014.
Os trabalhadores pobres
O desemprego pode certamente contribuir para se ser pobre, mas milhões de americanos vivem na pobreza quando têm empregos a tempo inteiro ou mesmo quando mantêm mais do que um emprego. Os últimos números do Bureau of Labor Statistics mostram que existem 8,6 milhões de “trabalhadores pobres”, definidos pelo governo como vivendo abaixo da linha da pobreza, apesar de estarem empregados pelo menos 27 semanas por ano. A sua insegurança económica não chama a atenção na nossa sociedade, em parte porque trabalhar e ser pobre em conjunto é uma realidade que não parece estar presente na mentes de muitos americanos – e o desemprego tem caído de forma razoavelmente estável. Depois de se aproximar dos 10% em 2009, está agora em apenas 4%.
Ajuda do governo? O programa de “reforma” de bem-estar social de Bill Clinton de 1996, elaborado em parceria com os Republicanos do Congresso, impôs limites de tempo à assistência do governo, enquanto restringia os critérios de elegibilidade ao Programa de Bem-estar. Assim, como Kathryn Edin e Luke Shaefer mostram no seu livro perturbador, $2.00 a Day: Living on Almost Nothing in America, muitos dos que precisam desesperadamente de ajuda não se preocupam sequer em a requerer. E as coisas só vão piorar na era de Trump. O seu orçamento de 2019 inclui cortes profundos numa série de programas anti-pobreza.
Qualquer um que procure um sentido visceral das dificuldades que tais americanos suportam deve ler o livro de 2001 de Barbara Ehrenreich Nickel and Dimed: On (Not) Getting By in America. É um relato emocionante do que ela aprendeu quando, fazendo-se passar por “dona de casa” sem competências especiais, trabalhou durante dois anos em vários empregos de baixos salários, contando apenas os com seus ganhos para se sustentar. O livro transborda de histórias sobre pessoas que tinham empregos, mas que, por necessidade, dormiam em motéis alugados à semana, ou até mesmo nos seus carros subsistindo de lanches obtidos nas máquinas de venda automática para o almoço e de cachorros quentes e macarrão instantâneo para o jantar e abandonando os cuidados odontológicos básicos ou check-ups de saúde. Aqueles que conseguiam moradia permanente escolhiam bairros pobres e de baixa renda perto do trabalho porque muitas vezes não tinham dinheiro para comprar um carro. Para manter até mesmo um estilo de vida tão despojado de quase tudo muitos trabalhavam em mais de um emprego.
Embora os políticos tagarelem sobre como os tempos mudaram para melhor, o livro de Ehrenreich ainda fornece uma imagem notavelmente precisa dos trabalhadores pobres dos Estados Unidos. Na última década, a proporção de pessoas para quem os seus salários mensais chegavam com dificuldade apenas para pagar os bens essenciais mínimos para viver aumentou de 31% para 38%. Em 2013, 71% das famílias que tinham filhos e usavam apoios alimentares atribuídos pela Feeding America, a maior organização privada de ajuda às pessoas em situação de fome, incluíam pelo menos uma pessoa que tinha trabalhado no ano anterior. E nas grandes cidades dos Estados Unidos, principalmente por causa do aumento da diferença entre rendas de casa e salários, milhares de trabalhadores pobres continuam sem teto, dormindo em abrigos, nas ruas ou nos seus veículos, às vezes junto com as suas famílias. Na cidade de Nova York, que não tem uma posição de destaque no que respeita ao problema da habitação entre os trabalhadores pobres, um terço das famílias com crianças que recorrem aos abrigos para os sem domicílio, pelo menos um adulto tinha um emprego.
Os salários de pobreza
Os trabalhadores pobres agrupam-se em certos postos de trabalho. Eles são vendedores em lojas de retalho, servem ou ajudam na cozinha na restauração rápida, fast food, pessoal de guarda, trabalhadores de hotelaria e cuidadores de crianças ou de idosos. Muitos ganham menos de $10 por hora e não têm qualquer maneira, seja sindical ou não, para pressionar por aumentos. De facto, a percentagem de trabalhadores sindicalizados em tais empregos permanece num único dígito – e no comércio a retalho e na preparação de alimentos, está abaixo de 4,5%. Isso não é surpreendente, já que o número de sindicalizados do setor privado caiu 50% desde 1983, para apenas 6,7% da força de trabalho.
Os empregadores de baixos salários gostam que seja assim e – sendo o Walmart a criança no cartaz para esta situação – trabalham diligentemente para dificultar ainda mais a filiação dos empregados aos sindicatos. Como resultado, eles raramente se encontram face a qualquer pressão real para aumentar os salários, que, ajustados pela inflação, estabilizaram ou até diminuíram desde o final da década de 1970. Quando o emprego é altamente precário “at will”, os trabalhadores podem ser despedidos ou os termos de seu trabalho alterados por capricho de uma empresa e sem a menor explicação. A empresa Walmart anunciou este ano que aumentaria o seu salário por hora para $11 e isso é uma notícia bem-vinda. Mas isso não teve nada a ver com negociação coletiva; foi uma resposta à queda na taxa de desemprego, aos fluxos de caixa resultantes da redução de impostos promovida pela Administração para as empresas (que levou a uma economia de US$ 2 mil milhões para o Walmart), a um aumento nos salários mínimos em vários Estados e a aumentos salariais de um concorrente de primeiro plano, Target. Também foi acompanhado pelo encerramento de 63 lojas do Sam’s Club do Walmart, o que significou despedimentos para 10.000 trabalhadores. Em suma, a balança do poder quase sempre favorece o empregador, raramente o empregado.
Como resultado, embora os Estados Unidos tenham um rendimento per capita de US$ 59.500 e estejam entre os países mais ricos do mundo, 12,7% dos americanos (ou seja, 43,1 milhões de pessoas) estão oficialmente empobrecidos. E isso é geralmente considerado um valor subestimado e de modo significativo. O Census Bureau estabelece a taxa de pobreza calculando um orçamento anual para a alimentação sem complicações para a família, multiplicando-o por três, ajustando-o à dimensão da família e ligando-o ao Índice de Preços ao Consumidor. Isso, acreditam muitos economistas, é uma forma lamentavelmente inadequada de estimar a pobreza. Os preços dos alimentos não subiram dramaticamente nos últimos 20 anos, mas o custo de outras necessidades, como cuidados médicos (especialmente se a pessoa não tem seguro) e habitação, subiu: 10,5% e 11,8%, respetivamente, entre 2013 e 2017, em comparação com um aumento de apenas 5,5% para a alimentação.
Inclua as despesas médicas e de habitação na equação e receba a Medida Suplementar de Pobreza (SPM), publicada pelo Census Bureau desde 2011. Isto dá-nos que um número maior de americanos é pobre: 14% ou 45 milhões em 2016.
Dados Desastrosos
Para uma visão mais completa da (in)segurança americana, no entanto, é necessário aprofundar os dados relevantes, começando com os salários por hora, que são a forma como mais de 58% dos trabalhadores adultos são pagos. A boa notícia: apenas 1,8 milhões, ou 2,3% deles, subsistem com ou abaixo do salário mínimo. A não tão boa notícia: um terço de todos os trabalhadores ganham menos de 12 dólares por hora e 42% ganham menos de 15 dólares. Isto representa $24.960 e $31.200 por ano. Imagine criar uma família com esses rendimentos, calculando o custo da alimentação, renda de casa, cuidados infantis, pagamento de carro (já que um carro é muitas vezes uma necessidade simplesmente para conseguir um emprego em um país com transporte público inadequado), e adicionando os custos em saúde.
O problema enfrentado pelos trabalhadores pobres não é apenas o dos salários baixos, mas também o aumento da diferença entre os salários e o aumento dos preços. O governo aumentou o salário mínimo federal por hora mais de 20 vezes desde que foi fixado em 25 centavos sob o Fair Labor Standards Act de 1938. Entre 2007 e 2009 subiu para $7,25, mas na última década essa soma perdeu quase 10% do seu poder de compra para a inflação, o que significa que, em 2018, alguém teria que trabalhar 41 dias adicionais para fazer o equivalente ao salário mínimo de 2009.
Os trabalhadores dos 20% de salários mais baixos perderam mais terreno, com os seus salários ajustados à inflação a caírem quase 1% entre 1979 e 2016, em comparação com um aumento de 24,7% para os 20% mais elevados. Isto não pode ser explicado por uma produtividade sem brilho, uma vez que, entre 1985 e 2015, esta ultrapassou os aumentos salariais, muitas vezes em valores substanciais, em todos os sectores económicos, exceto nas indústrias mineiras.
Sim, os Estados podem exigir salários mínimos mais elevados e 29 têm-no feito, mas 21 não têm, deixando muitos trabalhadores com baixos salários em dificuldade para cobrir os custos de dois itens essenciais em particular: saúde e habitação.
Mesmo quando se trata de empregos que oferecem seguro de saúde, os empregadores têm transferido cada vez mais o seu custo para os seus trabalhadores através de franquias mais altas e custos reembolsáveis, bem como exigindo que eles cubram uma maior parte dos prémios. A percentagem de trabalhadores que pagaram pelo menos 10% dos seus ganhos para cobrir tais custos – sem contar com os prémios – dobrou entre 2003 e 2014.
Isso ajuda a explicar porque é que, de acordo com o Bureau of Labor Statistics, apenas 11% dos trabalhadores nos 10% de salários mais baixos estão inscritos em planos de saúde no local de trabalho em 2016 (em comparação com 72% nos 10% mais altos). Como uma empregada de restaurante que ganha US$ 2,13 por hora antes das gorjetas – e cujo marido ganha US$ 9 por hora no Walmart – o coloca, depois de pagar a renda , “ou leva comida para casa ou compra um seguro de saúde”.
A Affordable Care Act, ou ACA (aka Obamacare), forneceu subsídios para ajudar as pessoas com baixo rendimento a cobrir o custo dos prémios de seguro, mas os trabalhadores com assistência médica fornecida pelo empregador, não importa quão baixos sejam seus salários, não foram cobertos por ela. Agora, é claro, o presidente Trump, os republicanos do Congresso e um Tribunal Supremo no qual os juízes de direita serão ainda mais influentes terão a intenção de politizar a ACA.
É a habitação, no entanto, que leva a maior parte dos salários dos trabalhadores com baixos salários. A maioria deles são arrendatários. A propriedade permanece para muitos um sonho inalcançável. De acordo com um estudo de Harvard, entre 2001 e 2016, os inquilinos que ganhavam entre $30.000 e $50.000 por ano e pagavam mais de um terço de seus ganhos aos proprietários (o limiar para se qualificarem como “a carga pelo aluguer”) aumentaram de 37% para 50%. Para aqueles que ganham apenas $15.000, esse valor subiu para 83%.
Por outras palavras, numa América cada vez mais desigual, o número de trabalhadores de baixa rendimento que têm dificuldade em pagar a sua renda de casa aumentou. Como mostra a análise de Harvard, isso deve-se, em parte, ao aumento do número de inquilinos ricos (com renda de $100.000 ou mais) e, cidade após cidade, eles estão a impulsionar a procura e a construção de novas unidades para alugar. Como resultado, a participação do topo de gama na construção de novas unidades de locação aumentou de um terço para quase dois terços de todas as unidades entre 2001 e 2016. Não surpreendentemente, as novas unidades de aluguer de baixo rendimento caíram de dois quintos para um quinto do total e, à medida que a pressão sobre os inquilinos aumentou, também subiram as rendas, mesmo para aquelas habitações modestas. Além disso, em lugares como Nova York, onde a procura dos ricos molda o mercado imobiliário, os proprietários encontraram maneiras – algumas dentro da lei, outras não – de se livrar dos inquilinos de baixos rendimentos.
A habitação social e os subsídios para habitação deveriam tornar a habitação acessível às famílias de baixos rendimentos, mas a oferta de habitação pública não tem correspondido de modo nenhum à procura. Consequentemente, as listas de espera são longas e as pessoas necessitadas definham durante anos antes de serem beneficiadas, – se é que alguma vez o são. Apenas um quarto das pessoas que se qualificam para essa assistência a recebem. Quanto a esses subsídios, é difícil obtê-los por causa do enorme intervalo de tempo existente entre o financiamento disponível para o programa e a procura de ajuda que o programa concede. E depois vêm os outros desafios: encontrar proprietários dispostos a aceitar vales, vouchers, ou alugueres que estejam razoavelmente próximos do trabalho e não em bairros eufemisticamente rotulados de “angustiantes”.
A linha inferior: mais de 75% dos inquilinos “em risco” (aqueles para quem o custo do aluguer excede 30% ou mais dos seus ganhos) não recebem assistência do governo. O verdadeiro “risco” para eles é tornarem-se gente sem abrigo, o que significa depender de abrigos ou de familiares e amigos dispostos a acolhê-los.
Os cortes orçamentais propostos pelo presidente Trump tornarão a vida ainda mais difícil para os trabalhadores de baixos rendimentos que procuram habitações populares. A sua proposta de orçamento para 2019 reduz US$ 6,8 mil milhões (14,2%) dos recursos do Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano (HUD) através, entre outras coisas, da supressão de subsídios para habitação e reduzindo a assistência a famílias de baixo rendimento que lutam para pagar as contas do aquecimento. O Presidente também procura reduzir os fundos destinados à manutenção da habitação social em quase 50%. Além disso, os défices que o seu primeiro projeto de “reforma” fiscal, que em primeiro lugar beneficia os ricos, irá garantidamente gerar, prepararão o terreno para mais cortes no futuro. Por outras palavras, no que se está a tornar os Estados Unidos da Desigualdade, as próprias frases “trabalhadores de baixa rendimento” e “moradia acessível” deixaram de estar juntas.
Nada disso parece ter incomodado o secretário de Estado no Ministério da Habitação e Desenvolvimento Urbano, Ben Carson, que alegremente pediu um conjunto de $31.000 para a sala de jantar do seu gabinete, à custa dos contribuintes, mesmo quando ele visitou novas unidades de habitação social para se certificar de que eles não eram muito confortáveis (para que os pobres não se instalem para longas estadias). Carson declarou que é hora de deixar de acreditar que os problemas desta sociedade podem ser corrigidos pedindo simplesmente subsídios adicionais ao governo – a menos que, aparentemente, os acessórios da sala de jantar dos super burocratas não estejam à altura.
As conversas sobre dinheiro
Os níveis de pobreza e desigualdade económica que prevalecem na América não são intrínsecos nem ao capitalismo nem à globalização. A maioria das outras economias ricas de mercado das 36 nações da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) tem feito muito melhor do que os Estados Unidos em reduzi-las sem sacrificar a inovação ou criar economias administradas pelo governo.
Veja-se o hiato de pobreza, que a OCDE define como a diferença entre o limiar oficial de pobreza de um país e o rendimento médio daqueles que se situam abaixo desse limiar. Os Estados Unidos têm o segundo maior hiato de pobreza entre os países ricos; só a Itália tem pior desempenho.
Pobreza infantil? No ranking do Fórum Económico Mundial de 41 países, dos melhores aos piores, os EUA ficaram em 35º lugar. A pobreza infantil diminuiu nos Estados Unidos desde 2010, mas um relatório da Universidade de Columbia estima que 19% das crianças americanas (13,7 milhões) viviam em famílias com rendimento abaixo da linha oficial de pobreza em 2016. Se somarmos o número de crianças em famílias de baixo rendimento, esse número aumenta para 41%.
Quanto à mortalidade infantil, de acordo com os Centros de Controle de Doenças do próprio governo, os EUA, com 6,1 mortes por 1.000 nascidos vivos, têm o pior recorde absoluto entre os países ricos. (Finlândia e Japão saem-se melhor com 2,3.)
E quando se trata da distribuição da riqueza, entre os países da OCDE apenas a Turquia, o Chile e o México têm piores resultados que os EUA.
É hora de repensar o estado americano de segurança nacional com o seu orçamento anual de milhões de milhões de dólares. Para dezenas de milhões de americanos, a fonte da profunda insegurança do quotidiano de trabalho não é a lista estandardizada de inimigos estrangeiros, mas um sistema de desigualdade cada vez mais enraizado, ainda em claro crescimento, que se opõe aos americanos menos abastados. Eles não têm dinheiro para contratar os lobistas de alto gabarito. Eles não podem passar cheques chorudos a candidatos que concorrem para cargos públicos ou fundos os Political Action Committees (PAC). Eles não têm nenhuma maneira de manipular a miríade de redes geradoras de influência que a elite utiliza para moldar a tributação e as políticas de despesa pública. Eles enfrentam um sistema em que é o dinheiro que realmente fala – e essa é então a voz que eles não têm. Bem-vindo aos Estados Unidos da Desigualdade.
Fonte
– Tom Engelhardt do sitio TomDispach: Rajan Menon, The Wages of Poverty in America.
– Rajan Menon, National (In)Security-In the United States of Inequality
Textos publicados em 15 de Julho de 2018 e disponíveis em: http://www.tomdispatch.com/blog/176447/tomgram%3A_rajan_menon%2C_the_wages_of_poverty_in_america/
Sobre Rajan Menon:
Rajan Menon, a TomDispatch regular, is the Anne and Bernard Spitzer Professor of International Relations at the Powell School, City College of New York, and Senior Research Fellow at Columbia University’s Saltzman Institute of War and Peace Studies. He is the author, most recently, of The Conceit of Humanitarian Intervention.
Copyright 2018 Rajan Menon