ISRAEL – Como começou o imbróglio – 1 – por Carlos Loures

 Este texto, com algumas alterações, foi publicado no Estrolabio

 

 

 

Li há tempos uma entrevista com fundamentalistas islâmicos na qual reclamavam o Al Andalus como sua pátria. Sabemos que os Árabes ocuparam grande parte da Península durante mais de sete séculos, criando aqui uma civilização de um grande esplendor. Mas, uma coisa é cometermos o erro de rejeitar uma parte do nosso passado histórico, outra coisa é tentar reconstituí-lo. E outra coisa ainda, essa perfeitamente disparatada, seria considerar que o facto de terem ocupado este território durante quase oito séculos conferia aos muçulmanos o direito de voltar como seus proprietários. Porque antes dos Árabes, estiveram os Romanos, e antes destes os Fenícios, Gregos, Cartagineses, e antes desses…

 

Desgraçados de nós, para onde iríamos? Com tantos senhorios a quem pagar renda, como nos arranjaríamos? Pois bem, esta situação que aplicada à nossa terra logo vemos ser absurda, passou-se com os Palestinianos. Num livro muito antigo e com o qual eles nada têm a ver, está escrito que ali foi o berço de Israel. E, assim, foram desapossados das suas casas, das suas terras, das suas árvores… Hoje, o Estado de Israel é um país da Ásia Ocidental, situado na margem oriental do Mediterrâneo. Tem uma área de 20 770 / 22 072 km². As suas fronteiras não fixadas oficialmente, situa o Líbano a Norte, a Síria e a Jordânia a Leste e o Egipto a Sudoeste. A Cisjordânia e a Faixa de Gaza, confinam também com Israel.

 

Tem uma população de cerca de 7,5 milhões de habitantes, dos quais 5,62 milhões são judeus. Dentro do segmento árabe, predominam os muçulmanos, havendo cristãos, drusos, samaritanos e outros. Gostemos ou não, é uma realidade. O problema judaico tem origens remotas, pré-bíblicas, de que todos já ouvimos falar. Hoje queria apenas lembrar como é que a questão surgiu, no seu formato contemporâneo.

 

O sionismo, palavra com origem em Sion, uma colina da antiga Jerusalém), eclodiu na Europa em meados do século XIX como reacção ao anti-judaísmo que nunca deixou de se verificar. Elitistas, usurários, concentrando grandes fortunas nas suas famílias mais poderosas, os judeus, com os pobres pagando por tabela os pecados dos ricos, sempre provocaram ódios e rejeições. É preciso dizer-se que o anti-judaísmo, condenável como o são todos os sentimentos xenofóbicos, tem na xenofobia judaica uma das suas raízes. Não só, mas também.

 

São desta época os pogromes na Rússia. As comunidades hebraicas, segregadas, perseguidas, sonhavam com uma pátria judaica. O sionismo, eivado de religiosidade, propugnava o regresso dos hebreus a Israel. Sonhar com Israel confortava os perseguidos e segregados judeus. Quando da expulsão dos reinos da Península, a maioria emigrou para a Europa, mas alguns foram para a antiga Judeia. Desde o século XV, a cidade de Safed tornar-se-ia um importante centro de estudo da Cabala.

 

Foi no século XIX que a afluência de colonos judeus à Palestina foi mais significativo. Em 1844, estando o território integrado no Império Otomano, a maioria da população da cidade de Jerusalém, era já hebraica. Conviviam sem problemas com muçulmanos, cristãos, gregos, arménios. Na segunda metade do século, a migração judaica continuou, agora proveniente sobretudo da Europa Central. Houve um facto que extremou posições, consolidando o anti-semitismo e catalisando o ideal sionista – o caso Dreyfus.

 

Em 1895, em França, um oficial de origem judaica, o capitão Alfred Dreyfus, foi acusado de fornecer informações secretas aos alemães. Foi julgado, condenado, degradado publicamente, após um julgamento que se tornou célebre e mobilizou a opinião pública mundial. Era evidente que a fragilidade das provas remetia a condenação para o exclusivo foro do preconceito anti-judaico que atravessava transversalmente toda a sociedade francesa da época. Émile Zola, o grande escritor, bateu-se com todas as suas energias na defesa de Dreyfus, publicando a propósito o ser famoso libelo «J’accuse!».

 

Theodor Herzl, jornalista húngaro, também ele de origem judaica, estava em Paris seguindo o Caso Dreyfuss para o jornal Neue Freie Presse. Foi ao longo da cobertura do processo que entendeu que as seculares perseguições contra judeus só teriam fim quando estes alcançassem autonomia nacional e publicou em Viena o livro “O Estado Judeu”. A ideia de uma «pátria judaica» seduziu os judeus espalhados pelo mundo. Os mais aventureiros e crentes, começaram a chegar à Palestina. O conceito de kibbutz (granja colectiva) consolidou-se depois de criado o primeiro, que se chamou Mikveh Israel (Esperança de Israel), fundado em 1870. Os sionistas, impregnados de fervor religioso e patriótico, defendiam a ideia de um estado hebraico que ocupasse o território definido no Antigo Testamento, o que implicaria a absorção da Jordânia.

 

Foram propostas alternativas na Patagónia, em Chipre, no Uganda e até em Angola. Na realidade, em 1912, o deputado Manuel Bravo apresentou no Parlamento português uma proposta para ser criado em Angola, no planalto de Benguela, um colonato judaico com cerca de 45 000 Km2 (sensivelmente o dobro da área do Estado de Israel). A proposta foi aprovada e no, ano seguinte. Ratificada pelo Senado. Porém, a Jewish Territorial Organisation, que fez uma visita ao território, recusou o projecto.

 

(Conclui amanhã)

1 Comment

  1. Amigo Carlos,Excelente texto, vou então aguardar o seu desenrolar.Como ateu convicto a pre-existência de um estado de Israel naõ faz qualquer sentido quando baseada em textos, no mínimo, duvidosos.Muita gente mistura o sionismo com o semitismo. Fazes bem em referir que nada têm em comum.Um abraço

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