Selecção e tradução de Júlio Marques Mota
A campanha global contra a Rússia está a levar-nos perigosamente para perto do desastre
Jim Jatras, Global Anti-Russia Campaign Is Taking Us Dangerously Close To Disaster
Russia Today, 27 de Março de 2018
A expulsão de 60 diplomatas russos dos EUA, juntamente com dezenas de outros de vários outros países, deve ser um momento preocupante para toda a humanidade. É um sinal de quão perto da beira de uma grande guerra está o mundo a chegar.

Para começar, este episódio atual não é comparável aos 55 soviéticos expulsos por Ronald Reagan em 1986 ou aos cerca de 50 que George W. Bush expulsou em 2001. Essas ações estavam diretamente relacionadas com as atividades de espionagem – em que todos os governos participam, dirigidas contra os seus amigos, bem como CONTRA os seus inimigos. Os russos fazem isso, os americanos fazem isso, toda a gente faz isso. Não há nada de extraordinário em reduzir os números de vez em quando, especialmente depois de um grande embaraço como o escândalo Robert Hanssen de 2001.
Mas estas últimas expulsões não têm nada a ver com quantos russos podem ser verdadeiros espiões. Nem com as acusações absurdas de interferência russa na eleição para “semear discórdia” e “desacreditar a democracia”
Na verdade, elas não têm nada a ver com a alegação do Departamento de Estado dos EUA, feita sem apresentar provas, de que “a Rússia utilizou um agente neurotóxico militar para tentar assassinar um cidadão britânico e a sua filha em Salisbury”. A ausência de provas de que os russos estavam por detrás do ataque não é mais relevante do que as acusações repetidas, igualmente sem o apoio de evidências, de uso de armas químicas pelo governo sírio. O que quer que tenha acontecido com os Skripals e quem quer que esteja por trás, Salisbury é um mero pretexto.
Não, o propósito real é muito mais simples. Sublinhando a ação norte-americana, o embaixador russo nos Estados Unidos, Anatoly Antonov, declarou que havia dito aos seus interlocutores americanos que “os Estados Unidos deram um passo muito mau ao dar cabo do que ainda resta em termos de relações russo-americanas”.
Mas cortar os últimos vestígios desse relacionamento é o que as expulsões estão projetadas para fazer. Cortar os laços entre EUA e Rússia não é um meio para um fim – é o fim.
Durante muitos anos, muitos comentadores e analistas têm ponderado se os EUA e a Rússia já estão numa nova Guerra Fria e, em caso afirmativo, quando é que as coisas vão melhorar. O olhar de bola de cristal agora pode parar. As respostas são claras demais.
Sim, estamos já numa nova Guerra Fria e já estamos assim desde há algum tempo. De facto, é tolice pensar que pelo lado dos EUA a primeira Guerra Fria terá realmente acabado. Enquanto tínhamos um governo fantoche em Moscou sob Boris Yeltsin na década de 1990, poderíamos fazer o que quiséssemos. Saqueiem-se os recursos da Rússia com a ajuda de oligarcas corruptos instalados por “especialistas” ocidentais. Expanda-se a NATO para o leste europeu depois de prometer que não o iam fazer. Bombardeie-se a Sérvia. Invada-se o Iraque. Expanda-se a NATO um pouco mais. Coloquem-se em ação operações de mudança de regime em nome da “democracia”. Declare-se que a Ucrânia e a Geórgia serão membros da NATO..
Quanto à segunda questão – não, as coisas não vão melhorar. Talvez nunca.
E o Presidente Donald J. Trump, o homem que deveria ser o líder do Mundo Livre (anacronicamente assim chamado)? Ele não disse repetidamente que quer melhores relações com a Rússia?
A resposta é dada pelo ex-porta-voz do Departamento de Estado sob o governo Obama, almirante John Kirby, que disse que as expulsões estão a ser “adotadas pelos nossos aliados europeus, porque estes estão muito inquietos por causa de algumas coisas que ouviram ou não ouviram falar de Trump relativamente ao presidente russo Vladimir Putin que podem significar que Trump venha a ser mole com Moscovo. Mas isso diz-lhes que os profissionais de segurança nacional com quem eles têm conversado à porta fechada têm realmente mantido a sua influência e em que a política que os EUA está pois a seguir é consequente com o que sempre prometeram , que é reprimir, que é deitar abaixo. ”
Talvez Kirby exagere o quanto alguns dos nossos satélites europeus realmente querem mais confronto com Moscou, mas ele está absolutamente certo sobre o papel dos “profissionais de segurança nacional” a operarem “à porta fechada”. Não se engane, de todas as heresias de 2016 de Trump contra o bipartidarismo, nenhum é mais preocupante do que aquela que parece ser o seu desejo sincero de uma nova trégua com Moscovo.
Quando tudo estiver dito e feito, haverá muitas razões pelas quais a classe política odeia Trump. Os seus pontos de vista sobre imigração e o comércio internacional estão próximas do topo da lista. Mas para o estado subterrâneo e o seu braço que são os meios de comunicação social, diabolizar a Rússia e o presidente Vladimir Putin pessoalmente é uma obsessão perigosa – e Trump representou uma ameaça. Daí toda a histeria da Russiagate / FISA, lançada pelo dossier de Steele, um esforço que, aliás, tem impressões digitais britânicas (particularmente do MI6) por toda parte. O seu principal objetivo era sempre o de querer enquadrar Trump e impedi-lo de seguir um outro qualquer caminho que não seja a trajetória desastrosa seguida por Bill Clinton, George Bush e Barack Obama.
Recentemente, um proeminente senador democrata expressou a sua preocupação com a nomeação do falcão John Bolton como novo conselheiro de segurança nacional de Trump, sugerindo que Trump estava “a alinhar o seu gabinete de guerra” que poderia ” levar-nos a um outro conflito terrível”.
Mas onde estava este senador e os seus colegas de esquerda no autoproclamado Resistência a Trump[1] quando se insistiu num novo mandato para aplicação de sanções e exigindo o envio de armas letais para a Ucrânia, se defendeu o bombardeamento da Síria e em geralmente se acusava Trump de ser um traidor em conluio com Putin[2]?
Bem, os críticos do Trump tiveram o que desejaram. A esquerda democrata, juntamente com os seus aliados neoconservadores do GOP “Never Trump”, ganharam e Trump perdeu. No que diz respeito à política externa e de segurança, Trump também pode não ser o presidente.
O resultado é um mundo que é um momento “Sarajevo” de um novo (nuclear) 1914, mas não porque Trump seja um “louco” imprevisível e irracional que precisa ser contido pelos “adultos na sala”. Essa noção é pura e simplesmente retrógrada como disso é testemunho o facto de que os mesmos “profissionais” ficaram horrorizados com o seu acordo para um encontro com Kim Jong-un da Coreia do Norte. (Na minha estimativa, as chances de que a reunião realmente aconteça são de apenas 50% e caem rapidamente com a nomeação de Bolton. Procure uma “provocação” de Pyongyang que possa acabar com a cimeira. Ou, se a reunião acontecer, olhe para Trump a ser carregado pela sua equipa com exigências não negociáveis que garantirão o fracasso).
Moscovo considerará agora a sua resposta às expulsões dos seus diplomatas, mas está numa situação de não vitória. Se, com base na prática do passado, os russos responderem com restrições “proporcionadas” de modo a não alienar permanentemente os seus chamados “parceiros” ocidentais, eles podem ter certeza de mais do mesmo – e mesmo pior. Por outro lado, se eles reagirem de forma assimétrica e dura – por exemplo, cancelando o sobrevoo dos portadores de bandeira dos Estados sancionadores – os uivos do “comportamento trapaceiro” russo intensificar-se-ão, levando a sanções ainda mais duras, como o corte SWIFT. Procure também uma campanha de boicote crescente contra o Campeonato do Mundo de 2018, bem como apelos mais fortes para neutralizar o veto de Moscovo no Conselho de Segurança da ONU. Ou uma outra bandeira falsa de armas químicas na Síria. Ou um possível “cenário Krajina” lançado por Kiev contra o Donbass – na expectativa de que Putin se vá afastar da maneira que Slobodan Milosevic fez.
Os que estão por trás dessa campanha global acham que podemos tratar a Rússia como se ela fosse uma potência menor, da magnitude da Sérvia, Iraque, Líbia ou Síria, ou mesmo do Irão. Eles acham que, se continuarmos a pressionar, empurrar, empurrar e os russos entrarão em colapso ou recuarão. Eles não podem ver outro resultado aceitável do que remover Putin e devolver a Rússia à condição de estado vassalo da era Yeltsin – um termo que Putin utilizou na sua entrevista com Oliver Stone – ou, melhor ainda, com o seu colapso territorial ao longo das linhas sugeridas pelo falecido Zbigniew Brzezinski.
As coisas estão a ficar piores, talvez mesmo muito piores
Jim Jatras is a Washington, DC-based attorney, political analyst, and media & government affairs specialist.
https://www.rt.com/op-ed/422455-us-russia-diplomat-expulsion/
Ou ainda:
https://www.zerohedge.com/news/2018-03-27/global-anti-russia-campaign-taking-us-dangerously-close-disaster
A expulsão de 60 diplomatas russos dos EUA, juntamente com dezenas de outros de vários outros países, deve ser um momento preocupante para toda a humanidade. É um sinal de quão perto da beira de uma grande guerra está o mundo a chegar.
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[1] Nota de tradutor. Um exemplo da posição dos democratas é-nos dado pela confirmação dos poderes de guerra que vinham desde Setembro de 2001. Diz-nos o sitio Político pela mão de Andrew Desiderio em Setembro de 2017:
“Donald Trump, cada vez mais militarista, é autorizado pelo Congresso sobre os poderes de guerra”
Tal como Obama antes dele, Trump pode continuar a utilizar as autorizações de guerra aprovadas pós-11 de Setembro para lançar novas operações militares no exterior.
O Senado recusou-se a dar ao Congresso mais autoridade e supervisão sobre os poderes da guerra do Presidente, derrotando uma medida que limitaria a capacidade do presidente Donald Trump em autorizar operações militares no exterior.
Com uma votação de 61 contra 36, a Câmara não aceitou uma emenda do senador Rand Paul (R-KY) que teria cancelado as autorizações de 2001 e 2002 no que diz respeito ao uso de força militar e teria, por sua vez, pressionado o Congresso a desenhar um novo quadro legal num período de seis meses. Essas autorizações serviram como principal base legal para as incursões militares estrangeiras dos Estados Unidos desde os ataques terroristas de 11 de setembro.
Esperava-se que a medida não fosse aceite e Paul transformou-a numa vitória em que 36 senadores, a maioria dos quais democratas, a assinaram.
A votação de quarta-feira mostrou que o reequilíbrio na balança dos poderes deve ainda estender-se aos assuntos estrangeiros:
“A menos que pudéssemos fazer algo literalmente na próxima semana, estar-nos-íamos a deparar com a realidade dos comandantes militares americanos a interrogarem-se se deveriam ou não começar a planear a retirada das nossas forças e o encerramento das nossas instalações”, disse o senador Jack Reed (DR .I.), principal democrata no Comité de Serviços Armados do Senado, no plenário do Senado.
A emenda de Paul teria revogado as autorizações militares do pós-11 de Setembro, no prazo de seis meses após a aprovação da Lei de Autorização de Defesa Nacional, o projeto anual de política de defesa. Isso também teria dado ao Congresso uma janela para elaborar um novo enquadramento jurídico sobre o assunto, uma autorização AUMF, que englobasse as ameaças de segurança globais específicas que os EUA e seus aliados enfrentam atualmente.
O que temos hoje é basicamente guerra ilimitada em qualquer lugar, em qualquer hora, em qualquer lugar do mundo”, disse Rand Paul no plenário do Senado. “Mesmo se meus colegas dizem:” guerra, guerra, essa é a resposta a dar em todo o lado e durante todo o tempo “, perdoem-me, venham, assinem, coloquem o vosso nome [sobre a rejeição da emenda].”
[2] Nota de tradutor. Trata-se aqui de uma posição bem sintetizada por KEITH OLBERMANN para quem “ Donald Trump não é um “presidente” mas em vez disso é “uma marionete nas mãos de Vladimir Putin.”
“aqueles que ignoram estes factos elementares, estes factos existenciais – sejam Democratas ou Republicanos – são traidores a este país e devem imediatamente e para sempre serem por tal responsabilizados” .