FÓRUM CIDADANIA PELO ESTADO SOCIAL – 2- por Vasco Lourenço

(Continuação)

Saliente-se ainda que a repressão diminui enormemente, pois quanto mais Estado Social, menos crimes e, portanto, menos Estado penal ou repressivo.Imagem1

Foi assim, com o Estado Social como peça fundamental da estruturação da sociedade europeia, que se atingiram níveis de desenvolvimento, bem-estar, estabilidade e de paz, como nunca houvera em qualquer parte do Mundo.

Aproveitando as condições criadas, e a modernização tecnológica da sociedade da comunicação, o Capital expande-se, gerando a globalização, que sendo uma consequência é também um instrumento dessa expansão.

Fruto dela, da globalização, o Capital torna-se todo poderoso – consegue deslocar-se, fazer investimento de forma instantânea, via Internet – provoca a deslocalização da produção, tornase não nacional, logo quase isento de impostos, pois ainda não há impostos supranacionais.

Por outro lado, como o Trabalho tem muito mais dificuldade de mobilidade, está agarrado à terra, é mais facilmente dominado, seja com salários baixos, seja com a imposição de taxas. Tudo isto criou condições extraordinariamente favoráveis ao Capital, nomeadamente ao capital financeiro, que se impôs de forma implacável ao capital produtivo.

Se juntarmos a isso o colapso das soluções socialistas, com o desaparecimento da Cortina de Ferro e a entrada nesses países do capitalismo mais selvagem, se lhe acrescentarmos a “capitalização” do socialismo chinês, compreendemos bem as enormes desigualdades que o Trabalho vem enfrentando, na luta por sociedades mais justas e humanas.

E o facto é que, na permanente luta entre Capital e Trabalho é o primeiro que vai ganhando terreno e desencadeia mecanismos que visam a escravização do segundo.

Se analisarmos a forma como tudo se desenrolou, em termos de globalização, será fácil descortinar algumas das razões desse avanço díspar.

Desde logo, o facto de a globalização da economia não ter sido acompanhada por uma globalização do Estado Social.

Houve, é certo, algumas ténues tentativas no seio da ONU, no sentido de acompanhar o chamado consenso de Washington (criação de organismos como o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial ou a Organização Mundial de Comércio), contrapondo-lhe o chamado consenso de Nova Iorque (tentativa de actualizar, de revitalizar, de renovar um Estado Social a nível mundial, com organizações como o PNUD, a UNICEF, a OMS ou a OIT), mas essa luta dos anos 1990 não teve sucesso. Não foi possível acompanhar a supranacionalização da economia com uma supranacionalização do Estado Social.

E a União Europeia é um exemplo bem significativo disso: ficou-se apenas por uma união económica, apesar de algumas “ameaças” de evolução, nunca se construindo como uma união social.

Na UE, predomina a ideia da concorrência e não a ideia da harmonização!

Como exemplos gritantes de desigualdades de condições, veja-se o que se passa no campo fiscal, onde se chama aos paraísos fiscais aqui existentes, de regimes fiscais privilegiados, apenas porque são os “nossos” regimes!

Mas também nas enormes e profundas disparidades entre trabalhadores de diferentes países da EU, onde os salários nos países mais fortes (Alemanha, França, Países Baixos, Finlândia, Suécia, Áustria, Dinamarca, Luxemburgo) são o dobro ou o triplo dos praticados em Portugal, na Grécia ou na Eslovénia. E se os compararmos com os da Bulgária atingem dez vezes mais, sendo que no que se refere à Roménia, Lituânia ou Letónia são sete a nove vezes superiores.

Isto não é, julgamos nós, o que era suposto existir numa União na Europa…!

Por isso, como pode o Estado Social ser sustentável, no âmbito da União Europeia?

E também por isso, como pode a EU ser um projecto vencedor?

É evidente que a EU já era!… O seu fim – que, estou convicto, será catastrófico – aproxima-se a passos largos…

Perante os bons resultados obtidos através da implantação e da prática do Estado Social na Europa, poderemos interrogar-nos sobre o porquê dos ataques, mais ou menos camuflados, mais ou menos descarados, a que o Estado Social vem sendo sujeito, desde os anos 1970, até aos actuais tempos.

Porquê? Porque os neoliberais nunca engoliram bem as derrotas sofridas com o crash de 1928 e com a II Guerra Mundial. Sempre se consideraram espoliados, nos seus direitos divinos e só aceitaram o compromisso porque sentiram não ter condições para o recusar. Não percebem não conseguem perceber, que estarão matando a própria “galinha dos ovos de ouro”, que lhe permitiu, ao Capital, manter-se e crescer, em situação de paz durante mais de 65 anos.

Pessoalmente, considero que isso se deve essencialmente à natureza de lacrau, própria dos neoliberais. Natureza que os leva a sobrepor a tudo, mesmo aos compromissos assumidos, a sua enorme ambição de lucro total, de domínio total, convencidos que estão de que os detentores do Capital são os representantes de Deus na Terra!

Por isso, tal como o lacrau não hesitou em picar o sapo que atravessava o rio com ele às costas, assim morrendo os dois, também o Capital não hesita em picar o Trabalho, talvez convencido que consegue salvar-se.

A sua sede de vingança das derrotas sofridas, a tudo se sobrepõe.

(Continua)

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