MPPM – Folha Informativa Nº 8 | Dezembro 2013

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MPPM - II

Os refugiados palestinos (1948 – 2013) 

Em 1948, cerca de 1 milhão de palestinos indígenas eram já refugiados, oriundos da Margem Ocidental e da Faixa de Gaza e encaminhados para campos nos países árabes vizinhos – Líbano, Síria e Jordânia – enquanto outros permaneceram em campos de refugiados dentro dos Territórios Palestinos Ocupados (TPO) e em Israel. Simultaneamente, cerca de outro milhão de palestinos residia no território da Palestina pré-partição (1947), juntamente com 1 milhão e meio de judeus.

Em Março de 1948 Israel iniciou a campanha da Haganah (organização militar sionista que veio a tornar-se nas actuais Forças de Defesa Israelitas) para combater as forças árabes na Palestina, campanha conhecida como Plano D ou Plano Dalet. Aplicado entre Abril e Maio de 1948, o Plano D tinha dois objectivos concretos: o primeiro, seria ocupar todos os espaços militares e civis abandonados pelos britânicos após o término do período do mandato, e o segundo, que deu origem à complicada situação internacional dos refugiados palestinos, consistia em garantir a supremacia judaica no Estado judeu, entretanto proclamado como o Estado de Israel, a 14 de Maio de 1948. Em meados de Maio, um terço da população palestina a habitar o Estado de Israel já tinha sido expulsa, acrescentando refugiados aos 70.000 palestinos da elite urbana que haviam fugido até Janeiro desse ano.

Aquando da data da proclamação do Estado de Israel, 58 aldeias palestinas já tinham sido destruídas pelo exército israelita, obrigando os seus habitantes a partir e garantindo que não teriam mais terra pela qual regressar. Até Janeiro de 1949, seriam destruídas mais 312 aldeias. Por esta altura, dos 850.000 palestinos que viviam no Estado judaico do Plano de Partição, apenas 160.000 permaneceram, transformando-se na minoria palestina em Israel. Nos campos, os refugiados viviam em tendas cedidas por organizações internacionais, protegidos pela promessa da resolução 194 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, cujo objectivo primário era a repatriação dos refugiados palestinos para as suas terras. Porém, as suas terras já estavam, por esta altura, destruídas e reocupadas para servir o Estado de Israel.

A comunidade de refugiados da Faixa de Gaza era a mais extensa em número de refugiados acolhidos, vivendo a paredes meias com a comunidade palestina de Gaza, então sob a autoridade militar egípcia. Também os refugiados da Margem Ocidental viviam em condições precárias, consequência da sobrelotação e da ausência de estruturas básicas. Os refugiados palestinos, fragilizados por perdas de familiares, de identidade e de propriedade, estavam agora à mercê dos regimes sob os quais viviam, uma vez que, apesar do financiamento dos campos ser feito por parte de organizações de solidariedade, eram essencialmente estes regimes os responsáveis pelas respectivas políticas de gestão. O contexto social dos países de acolhimento era, de igual forma, frágil e hostil. Os refugiados de 1948 e, posteriormente, os de 1967, estiveram à mercê das sociedades anfitriãs que, frequentemente, apresentavam comportamentos violentos perante a ameaça da mão-de-obra de refugiados, desesperada.

No contexto da Resolução 302 da Assembleia Geral das Nações Unidas, que identificava a necessidade da criação de uma Agência que respondesse às necessidades dos refugiados palestinos, a ONU criou a UNRWA (United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East, ou, em português, Agência das Nações Unidas de Obras Públicas e de Socorro), no seguimento da guerra israelo-árabe de 1948. Esta agência dependia e depende, essencialmente, de contribuições voluntárias dos vários Estados-Membro da ONU, e devido ao prolongamento do conflito até aos dias de hoje, o seu mandato tem vindo a ser estendido, tendo sido o último prorrogado até 30 de Junho de 2014. O objectivo actual da UNRWA é garantir as estruturas sociais básicas nos campos de refugiados palestinos: educação, saúde, habitação. Inicialmente, o objectivo da UNRWA, de acordo com a Resolução 194 da Assembleia Geral das Nações Unidas, consistia em repatriar os refugiados expulsos da Palestina. Este objectivo tem sido deixado por cumprir, ano após ano, devido à ausência de soluções para o conflito Israel-Palestina.

A questão dos refugiados era, e continua a ser nos dias de hoje, um problema internacional e que consistia, dentro dos países de acolhimento, numa situação que originava frequentemente desentendimentos entre a população local e os refugiados, Israel desde cedo trabalhou para evitar a concretização do Ponto 11 da Resolução 194, ou seja, impedir que os refugiados palestinos tivessem terra para a qual regressar. Em Agosto de 1949, três meses após a criação do Estado de Israel, o governo colocou em

prática um plano de destruição maciça de todas as casas e terras previamente pertencentes a palestinos e forçadamente deixadas ao abandono, garantindo assim a impossibilidade de retorno. Com efeito, após a guerra de 1948 e após o interesse internacional pela questão dos refugiados palestinos ter arrefecido, o governo de Israel ocupou dezenas de aldeias árabes e expulsou as suas populações sob o pretexto da segurança nacional israelita, mas o que se verificou foi que os terrenos viriam a ser ocupados para fins públicos.

Em 1967, com a Guerra dos Seis Dias, o exército israelita ocupou a Margem Ocidental (então Cisjordânia) e a Faixa de Gaza, os Montes Golã (Síria) e a Península do Sinai (Egipto). Os campos de refugiados de 1948 ficaram ainda mais lotados com a nova vaga de deslocados, resultado de uma obsessão judaica por território e ocupação. Apesar de o número de refugiados da Guerra dos Seis Dias ser menor do que o resultante da Nakba, no ano de 1972 contavam-se 1 milhão e meio de refugiados, sendo que até 1982 este número subiu até aos dois milhões. Em 2008, o número de refugiados estimado pelo Badil (Resource Center for Palestinian Residency and Refugee Rights) era de 10,6 milhões, divididos da seguinte forma: 4.360.000 na Margem Ocidental e na Faixa de Gaza, 1.587.000 em Israel, 2.839.639 na Jordânia, 422.699 na Síria, 421.292 no Líbano, 314.226 na Arábia Saudita, 238.721 nos Estados Unidos da América e 303.987 no resto do mundo. Na consideração do número total actual de refugiados é necessário ter em conta que se trata de estimativas, uma vez que o número de refugiados registados não contempla o universo total de refugiados.

Não obstante os esforços da UNRWA para reinstalar os refugiados palestinos em campos na Palestina, Jordânia, Síria e Líbano, essencialmente, os refugiados nunca entenderam a questão da reinstalação como uma solução permanente. E esta percepção era mais do que esperança e positivismo: era baseada na confiança na ONU que formulou as Resoluções 194 e 302, mas o que é um facto é que até hoje, tanto a ONU quanto a UNRWA desempenham a tarefa de agências de socorro circunstancial. Os refugiados de 1948 e 1967 continuam a viver em “casas” temporárias de barro e lata em 2013, sem infra-estruturas básicas que garantam os direitos humanos fundamentais. Os refugiados de ambas as guerras continuam à espera, em 2013, com as chaves das suas casas palestinas penduradas ao pescoço.

A política assistencialista da UNRWA permaneceu no mesmo registo, inclusive com a sobrelotação de refugiados nos campos, tentando garantir o mínimo necessário à sobrevivência do ser humano. As verbas disponibilizadas pela UNRWA para os campos de refugiados palestinos (estas, por sua vez, oriundas de doações de Estados-Membros da ONU e do orçamento da ONU para a UNRWA) vão ao encontro deste modelo de assistencialismo básico, como se pode verificar no orçamento da UNRWA em 1967: os valores disponibilizados por ano por pessoa para alimentação e saúde garantiam apenas que os refugiados não perecessem. Como o número de refugiados aumentou com a guerra de 1967 e o tecto do orçamento não acompanhou esse crescimento, em 1967 havia registo de 284 crianças registadas como refugiadas e excluídas do processo de distribuição de alimentação, segundo o Relatório Anual da UNRWA (1966 – 1967).

Ambas as vagas de refugiados deram origem a gerações que foram criadas no ambiente de hostilidade e violência dos campos, à mercê da miséria económica e assimetrias sociais entre aqueles que foram empurrados para o estatuto de refugiados e as populações locais. A lembrança constante deste estatuto e a iminência do regresso a casa, recordada diariamente pelas infra-estruturas temporárias em que os refugiados residiam e residem nos campos e as promessas da UNRWA e ONU, uma promessa sempre adiada, criaram uma geração de palestinos insatisfeitos e revoltados com Israel e com a ocupação nos TPO. Até hoje, a situação inadmissível em que os palestinos são obrigados a viver originou duas intifadas, ambas respostas ao escalar de violência direccionada por Israel para o povo palestino, e às resoluções por cumprir da ONU e constantes atentados aos direitos humanos básicos.

Hoje, em 2013, 225.000 palestinos vivem sob a ameaça de expulsão das suas casas e terras nos TPO. Aldeias e vilas continuam a ser evacuadas por ordem do governo israelita, criando aleatoriamente Zonas Militares Interditas onde os palestinos estão proibidos de residir ou de construir qualquer estrutura, garantindo assim que o pesadelo da Nakba e da Guerra dos Seis Dias permanece muito presente. O número estimado de refugiados é mais de sete milhões, todos impedidos de regressar por um conjunto de leis israelitas que dificultam e impossibilitam o retorno, e através de operações, levadas a cabo desde 1948, de destruição de propriedade palestina. Os refugiados estão protegidos pelo teórico direito internacional de regresso mas, na prática, encontram-se dependentes da penalização dos crimes de Israel. No Dia da Nakba em 2011, vários refugiados palestinos tentaram regressar às suas casas passando as fronteiras através do Líbano e dos Montes Golã, tentativa que resultou na morte de vários refugiados pela Forças de Defesa Israelitas. Contudo, porque o direito ao regresso é um direito apoiado pela comunidade internacional e o direito à autodeterminação assiste o povo palestino, várias famílias de refugiados continuam a tentar regressar às suas aldeias, frequentemente com o objectivo de fazer uma tomada de posição face às políticas colonialistas israelitas, tentando contornar a questão de uma permissão ou de uma resposta positiva por parte de Israel em relação ao retorno.

A Resolução 194

“ (…) resolve que os refugiados que desejam regressar aos seus lares e viver em paz com os seus vizinhos devem ser autorizados a fazê-lo na data mais próxima possível, e que deve ser dada uma compensação pela propriedade de quem escolher não voltar e por perdas ou danos de propriedade que, segundo os princípios de direito internacional e com equidade, deve ser assumida pelos governos ou autoridades responsáveis”

Ponto 11 da Resolução 194 da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas, 11 de Dezembro de 1948. 

A população da Palestina antes da diáspora

refugiados - I

O exílio forçado dos palestinos

refugiados - II

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