A RESPOSTA DE LUÍS REIS TORGAL AO COMENTÁRIO DE RACHEL GUTIÉRREZ SOBRE O SEU ARTIGO “O BRASIl… OUTRA VEZ”.

Publicamos hoje esta resposta de Luís Reis Torgal ao comentário feito por Rachel Gutiérrez sobre o artigo  “O Brasil… outra vez”, de sua autoria, publicado aqui em A Viagem dos Argonautas no dia 13 de Maio último. Remetemos assim os nossos leitores para o “post” respectivo, cujo link hoje inserimos abaixo, no fim do presente “post”. Não incluímos este texto no post anterior, por razões técnicas e pelo tempo decorrido. Agradecemos e pedimos a compreensão de Rachel Gutiérrez e Luís Reis Torgal.

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RESPOSTA À DR.ª RACHEL GUTIÉRREZ

Agradeço à Dr.ª Rachel Gutiérrez o facto de me ter enviado, embora por via indirecta, uma resposta crítica ao meu artigo do Público, “O Brasil… outra vez”, que, em parte, vem na sequência de outro que publiquei no mesmo jornal (“O Brasil, Portugal e as Universidades”) e que aproveito para remeter. Aceito mesmo o seu carácter indignado. Eu também estaria, e estou, pois nunca vi uma votação num parlamento tão ridícula, em que os deputados votaram em nome dos pais, dos filhos e talvez dos gatos e cães de estimação. De resto, recebi algumas mensagens de amigos brasileiros em que expressavam esse sentimento.

Mas, vejamos com calma qual é a minha posição, que julgava ter ficado clara (certamente assim não sucedeu):

  1. No primeiro artigo, como pode agora ver, entrei num debate sobre o significado do atraso da fundação das universidades no Brasil, pondo em causa a posição de Lula da Silva numa conferência realizada em Madrid, organizada pelo diário El País. Foi então que referi de passagem que Lula da Silva sabia por certo de política, mas não de história das universidades (nem tinha de saber), embora — disse-o ironicamente, até porque discordo com todos os doutoramentos h.c. por “razões políticas” — fosse doutor honoris causa pela Universidade de Coimbra.

  1. Tendo dito isso, achei que deveria esclarecer — no segundo artigo — que também não concordaria com a ridícula posição da JSD (Juventude Social-Democrata) que, de forma oportunista e ignorante, veio pedir ao nosso Reitor que anulasse a honra que foi concedida a Lula pela UC. Ou seja, se não concordo com a atribuição de títulos h.c. por motivos políticos ou pelo simples facto de um estadista visitar Portugal — costumo dizer, ironicamente, que se Nicolau Ceauscescu tivesse vindo a Portugal numa dada ocasião talvez tivesse sido também doutorado h.c.! —, igualmente discordo que o doutoramento lhe seja tirado, como se diz ter sucedido com Francisco Franco em Santiago de Compostela (2006) e em Salamanca (2008). Na verdade, como me informou o meu colega Mariano Estéban Vega, vice-reitor em Salamanca, ao contrário do que disseram os jornais de forma mais simples (ou simplista), não lhe foi tirado o doutoramento — o que não poderia suceder, dado o carácter, digamos, “sacramental” (ou talvez “jurídico”, por ser um termo mais laico) do acto — mas optou-se por condenar a posição de lhe ter sido concedida essa honra numa dada ocasião. Quando muito, era o que poderia ter sucedido com o doutoramento de Lula da Silva. Seja como for, discordaria em qualquer circunstância, dado que entendo que as universidades têm de assumir as suas decisões, que — como todos sabemos — são definidas em momentos especiais da sua história e da história do mundo. Por isso a Dr.ª Rachel Gutiérrez terá exprimido as suas razões, resultantes de vários momentos, ao votar (como disse) quatro vezes em Lula da Silva, sendo esta nova posição resultante de outras circunstâncias.

  1. A minha opinião não é, claramente, de defesa (nem de ataque) de Lula nem de Dilma Rousseff, que, com certeza, cometeram erros graves, sendo um deles as tais alianças contra naturam (utilizei a expressão clássica) que fizeram. O que não pude e não posso compreender é como é que o processo teve um desenvolvimento provocado por muitos deputados e senadores igualmente acusados ou suspeitos de corrupção, até porque (segundo julgo) nunca se provou judicialmente que os presidentes (o ex-presidente e a presidente, agora suspensa) do PT eram indubitavelmente culpados. Por isso, lamentei — e todos lamentámos — o processo na sua forma e no seu conteúdo, tendo em conta que considero que a oposição democrática deve exercer a sua função, sobretudo num sistema presidencialista, pelo menos formalmente (pois aceito os movimentos de pressão, ainda que procure sempre analisar o seu significado), só através do sufrágio universal e da acção dos tribunais que constituem (ou deveriam constituir) um poder independente.

  1. O que mais contesto, e lamento, nas palavras da ilustre autora do texto de contestação do meu artigo é que me chame “ingênuo admirador de Lula”, pois se há defeito que não tenho — até pelo facto de tentar analisar cientificamente as realidades que conheço (e na maioria das vezes não conheço bem), mesmo em artigos de opinião, como são os textos de periódicos — é a ingenuidade. Se até certo ponto admirei — e talvez continue a admirar Lula até prova cabal em contrário —, nunca foi ingenuamente.

  1. Sou um amigo do Brasil e, como sucede com o Portugal que amo, só critico o que devo criticar. Na maioria das vezes interrogo-me, pois considero que essa é a posição do “intelectual”. Foi isso que, fundamentalmente, eu fiz, como fiz também em alguns dos meus últimos livros (Que Universidade?, escrito com um colega de Juiz de Fora, e publicado em 2013 e 2014, e História… Que História?, de 2015)

  1. Só para terminar, recordo que uma amiga muito querida que foi professora da Universidade Federal do Recife, numa conversa tida há alguns anos, defendia denodadamente Lula da Silva e o PT, antes da sua vitória eleitoral. Eu disse-lhe então — e nunca mais se esqueceu dessa afirmação — que seria a última esperança do Brasil e que, decerto, acabaria em desânimo. No meu caso, que também nunca fui fascista ou de direita e assumo a minha posição de esquerda, não tenho ilusões, sobretudo nesta Europa e neste Mundo regido pela força do Capital. Foi e sempre será assim, embora a história tenha um percurso em espiral, o que nos leva a pensar que por vezes voltamos atrás. No caso português, ao menos mantemos uma lógica democrática, embora a Democracia (política e social) hoje seja outra vez (como sempre, afinal) uma miragem. Resta-nos a Esperança, mas nunca uma Esperança ingénua. Essa nunca encontrará nos meus escritos, seja de que tipo forem.

Figueira de Lorvão (Penacova – Coimbra), 17 de Maio de 2016

Luís Reis Torgal

Professor Catedrático Aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra

lreistorgal@gmail.com

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Link para “O Brasil… outra vez”, de Luís Reis Torgal:

O BRASIL… OUTRA VEZ – por LUÍS REIS TORGAL

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