CONTOS & CRÓNICAS – CARLOS REIS – OS ARTIGOS IMPUBLICÁVEIS – ANTI-AMERICANISMO PRIMÁRIO

 

 

Eu gostaria de perceber – I would like to understand, para os mais jovens – a razão, o gosto e a obsessão pelas séries policiais americanas. Por aquele modelo de sociedade e de vidas que nada tem a ver connosco, com a nossa ocidental Europa. Por aquela maneira de “estar”. Deve ser enorme o tempo que certamente perdem a ver aquilo, as nossas classes médias televisivas, todos os dias a mesma coisa, os mesmos esquemas, os mesmos tiques, as mesmas sinistras histórias.

Até parece que eles, americanos, têm um certo orgulho, uma certa vaidade na insolência, na violência, gostam que haja daquilo por lá, pelas suas cidades de cimento, aço e plástico, humburgers, ketchup, batatas fritas e cocacola. De assassinatos de dois em dois minutos, que são óptimos já que justifiquem tais séries.

Desde as trombas standardizadas dos actores e das actrizes, das vozes, dos diálogos e dos esgares de ambos os sexos (deve tratar-se de uma espécie de Actor’s Studio modernaço) da violência gratuita e inútil, plena de mortes e sangue em profusão, de carros e camiões a bater uns nos outros, com grande aparato e enorme cagaçal, ao som exageradamente alto e áspero de tiros, murros e pontapés a esmo e gajos a caírem do 28º andarNada daquilo parece ter a ver com a nossa cultura, com este lado de cá do Atlântico.

Mas pelos vistos tem. Estas séries existem porque têm clientes.

E depois ainda há aquela mania infantil dos super-heróis. Ninguém, deste lado do mundo, se lembraria de inventar coisas tão ridículas como um Superman, que usa as cuecas por cima das calças e ninguém sabe que é o Clark Kent, só porque este usa óculos e risco ao lado, ou um Batman, um herói pesadão e cheio de equipamento, com o seu monstruoso batmóvel. Tem sempre lugar para arrumar aquela banheira e jamais foi obrigado a parar em algum engarrafamento ou hora de ponta, uma sorte incrível, daquelas que só acontecem aos super-heróis.

Para não falar em mais uma data de super-heróis por eles inventados, igualmente inverosímeis e ridículos, como o Capitão Marvel, a Superwoman, a Supergirl, o Superdog, o Hulk, o Homem-aranha, as Tartarugas Ninja, o Capitão América, o Tocha Humana, o Demolidor, etc. E todos eles defendem o pobre cidadão indefeso e ajudam a ineficaz polícia americana, lá isso é verdade. Há muitos, muitos  mais, mas chegam e sobram estes para garantir a menoridade mental daquele incompreensível povo.

Devem mesmo constitur a literatura favorita do Trump.

Mais modernamente, alguns heróis até já lutam entre si (sabe-se lá porquê, alguma carestia de vilões) ou então agrupam-se todos numa super liga de super-heróis, a fim de espalhar o bem com mais equidade e dimensão, numa reacção em cadeia de justiça para todos.

Adoram também os vampiros, têm séries televisivas de caçadores de vampiros a tempo inteiro e deliram com o terror gratuito dos “Walking dead”, uns grunhos de péssimo aspecto que não sabem que morreram e se entretêm a assustar e a mastigar pessoas.

Tiveram, no entanto – há que o ressalvar – excelentes criadores de Banda Desenhada, nos anos quarenta e cinquenta, algo que o velho e querido “Mundo de Aventuras” se encarregou de nos dar a conhecer. Com heróis, naturalmente (detectives, pilotos de guerra, cowboys) mas humanos. E bem desenhados.

Infelizmente e tirando o (bom) Cinema e o Jazz (as coisas melhores que os States sempre tiveram) acho que aquilo não vale nada. Acho que aqueles tipos sem História e sem fazerem ideia do que se passou ou passa no resto mundo (por entre o qual afinal estão sempre a interferir e a destruir) são a negação da civilização, o culto do estereotipo, da imbecilidade e da ignorância a todos os níveis.

Não posso, realmente com eles. Tenho mesmo pena dos americanos decentes, normais, inteligentes e civilizados. Coitados.

Mas o que mais me irrita mesmo, o que mais me enoja e me indispõe (last but not the least) – e creio que deverá ser raro ou quase impossível em todo o resto do mundo civilizado) –  é um seu hábito, uma sua idiossincrasia, uma barbárie e alarvidade – transversal a todas as classes – que os leva a comer e a falar em simultâneo, sempre com a boca cheia – e isto nota-se em qualquer filme, seja um filme de culto, sejam miseráveis séries televisivas.

Sejam gajos e gajas, mesmo a sério.

Nunca repararam?

Carlos

2 Comments

  1. Eu direi que tem toda a razão mas que tudo tem sido feito intencionalmente para perturbar e desorganizar o modo de viver dos outros, isto é, daqueles que, espalhados por todo o mundo, os ianques, fruto da sua ganância desmedida, gostam e precisam de atacar, roubar, vigarizar, humilhar e matar. Duvidar que essa seja a estratégia – bom grado agonizante – que os ianques conceberam e levam à prática através das suas centrais de intoxicação ideológica é embarcar – como tem acontecido – num idealismo fatal. Felizmente, para todos nós, desde a derrota no Vietname, com a excepção da vitória na minúscula e indefesa Granada, só têm perdido em toda a linha. A queda do império norte-americano e da sua hegemonia mundial, embora seja lenta, é muito agradável de ver-se. CLV.

  2. Análise que partilho. Talvez por isso prefira as séries policiais inglesas. Quanto ao país ‘farol’ do mundo, para mim está tudo dito e redito, quando leio que:
    1.-um dos candidatos nas últimas eleições presidenciais, Gary Johnson, não sabia o que era Aleppo;
    2.-um quarto dos norte-americanos ignora que a Terra gira em volta do Sol (in ‘Público’ de 15/02/2014);
    3.-há mais norte-americanos a acreditar no Diabo do que a acreditar em Darwin (in ‘Sonho americano? Conheça 10 factos chocantes sobre os EUA’
    4.-16,4 millhões acreditam que o leite com chocolate vem das vacas castanhas (in ‘Visão 1268).
    Outras bizantinices existem sobre este ‘glorioso’ país. Se dúvidas persistem, vejam por favor os documentários do americano Michael Moore. que fala do que sabe.
    Por mim, dispenso-o.

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