Vai a Segunda República ser ainda pior do que foi a Primeira, ou já o está sendo?, por José de Almeida Serra

Vai a Segunda República ser ainda pior do que foi a Primeira, ou já o está sendo?

por José de Almeida Serra

Passarei por cima dos excessos cometidos nos dois anos que se seguiram à Revolução, que facilmente são atendíveis e entendíveis naquele período de profunda perturbação, a que se juntou a descolonização e as lutas USA-URSS para decidir quem mandaria nos novos países, já que a Europa parecia estar decidida e a China ainda não existia enquanto potência dominante.

Só que depois, a começar – exceptuando Soares e Cavaco – os governos têm ido de mal a pior, em matérias importantes e facilmente compreensíveis pela opinião pública.

Dei-me ao trabalho de seleccionar alguma imprensa do último fim-de-semana (13-14 de Maio) e não resisto a apresentar alguns comentários e formular certas interrogações.

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A……A

Em todas as sociedades se rouba, mas poucas haverá em que tanto se roube e ao nível como o que ocorre em Portugal.

Vir a Comissão Europeia propor regras mais eficazes para diminuir a corrupção também em Portugal, obviamente mete-nos num conjunto muito mais alargado, o que atenua a mensagem.

Transcrevo da Transparency Internacional: cito: “o Índice de Perceção da Corrupção (CPI) foi criado pela Transparency International em 1995 e é, desde então, uma referência na análise do fenómeno da corrupção, a partir da perceção de especialistas e executivos de negócios sobre os níveis de corrupção no sector público.

É um índice composto, e classifica de 0 (percecionado como muito corrupto) a 100 (muito transparente) 180 países e territórios.

Índice de Perceção da Corrupção de 2022 – relatório publicado anualmente pela Transparency International – aponta falhas no combate à corrupção em Portugal. No relatório deste ano, a Transparency International assinala que a Estratégia Nacional Anticorrupção (ENAC), que foi lançada sem directrizes ou plano de monitorização, resultando em fraca aplicação e implementação lenta de medidas dirigidas à prevenção da corrupção no sector público.

A Transparency International Portugal já havia alertado para as deficiências da Estratégia Nacional Anticorrupção, nomeadamente por ignorar praticamente por inteiro a questão da corrupção política. Algo que foi salientado aquando da publicação do Índice de Perceção da Corrupção de 2021 e nas recomendações do Grupo de Estados Contra a Corrupção (GRECO). O relatório da Transparency International refere ainda como problemático Portugal manter activo o programa Vistos Gold, por aumentar os riscos de corrupção e ter vindo a colocar pressão no mercado imobiliário” (fecho de transcrição).

E regresso à União Europeia, que ultimamente se tem debruçado mais seriamente sobre o assunto, bem com a nossa Polícia Judiciária. Reenvio para documentos públicos.

Fico naturalmente incomodado pelo facto de a Judiciária só reagir após a União Europeia. Mas ainda bem: reagiu. E espero que seja coerente nas suas acções e actuações, com resultados bem visíveis (pelo menos naqueles que a maioria da população conhece).

Pergunto:

  1. O que vai fazer o Governo e a Assembleia da República nesta matéria, em particular na corrupção política e de políticos?

  2. O que vai fazer em matéria de obras públicas (que normalmente custam mais 50% do que os valores inicialmente adjudicados)? Dar-se-á, ao menos, ao trabalho de publicar resultados (previstos e realizados)?

  3. Como vai avaliar de onde provieram as riquezas de alguns dos mais ricos que no início da vida profissional pouco mais tinham do que onde “cair mortos”?

  4. Quando se propõe lutar contra as «offshores», designadamente as controladas pela Europa e USA? Recuperarão as Ilhas Virgens a virgindade britânica, como algumas altíssimas damas daquele País o fizeram ao longo da história, incluindo em passado recente, quando altamente se tornaram esposas legais ou oficialmente foram adoptadas como amantes? E Londres pode demonstrar não ser uma «offshore»? E a Suíça? E o Luxemburgo? E, e, e…

  5. Vai Portugal continuar a vender o país a estrangeiros –designadamente, bancos, seguros, indústrias, campos agrícolas e à beira-mar –, com ou sem vistos «gold»? Incluindo ex-altos dirigentes comunistas que, proletariamente, nada tinham de seu ao desmoronar da União Soviética e Deus beneficiou com milhares de milhões?

  6. E o dinheiro dito ir para os partidos: não é possível controlar? Eu digo peremptoriamente, baseado em factos passados: é. Fui responsável pelo assunto em campanhas do Dr. Soares para a Presidência da República e no período Constâncio-Sampaio e gostaria de dizer como se fazia então. O que se passa hoje é, por muitos, considerado uma vergonha inqualificável e um despudor sem limites.

Podia continuar, mas não vale a pena dado o que temos visto recentemente, em particular relativamente à TAP. Tantos interesses que por ali transitaram, pelo menos desde o tempo da passagem da Boeing para a Air Bus. Houve em Paris nessa altura alguma acção em tribunal amigamente morta com um acordo entrepartes de 2 milhões de contos?

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De donos de Macau passámos a Macau da China na Europa. Da China e de muitos mais. Pode ao menos saber-se quem são os verdadeiros donos das empresas, quixotescamente ditas portuguesas, quem e quando entraram os novos donos, quanto pagaram, de onde veio o dinheiro, e quanto já recuperaram. Julgo que em meia dúzia de anos “estarão em casa” e nós, como vagabundos, à porta do “casebre”.

Seremos os novos escravos dos novos donos; e os mais capazes dos jovens vão pura e simplesmente “pirar-se” para mundos-outros.

Falar em Aljubarrota para quê? É muito mais fácil conquistar um país, comprando-o, como vem a ser feito. Que falta nos fazem as mulheres (as de Aljubarrota) que tratavam dos fornos de pão para aquelas bandas! E sabiam tratar dos ocupantes.

Saberá este governo dizer-nos qual é a parcela, sector a sector – banca, indústria, transportes, agricultura, etc. – que ainda é genuinamente de portugueses?

Capital estrangeiro, sim: mas com regras, princípios, obrigações, limites. O que fez o Governo&Cia?, dada a minha costumeira distração, NADA.

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Lamento estar de acordo.

Mas, agora, o problema da habitação vai ficar resolvido pela parceria ACosta&Cia, especialmente com a decisão de obrigar a colocar no mercado de aluguer todas as habitações devolutas. Valha-nos a brilhante ideia, que os proprietários dessas habitações devolutas muito devem agradecer, até pela garantia de terem uma velhice segura graças aos investimentos que decidiram em boa hora.

Julgo terem sido parvos e mais valera que se tivessem passeado por vários lugares, com vários prostíbulos incluídos, designadamente de nível internacional (o que parece estar a ser ressuscitado).

Façam isso: retirem aos que não roubaram e pouparam e investiram. Quem os mandou serem parvos e votarem depois em quem lhes vai criar problemas inverosímeis para a velhice? Como a filhos e netos que não entrem no sistema, que o repudiam, ou a ele aderem para prosseguir na carreira empresarial, escolar, política.

Aliás, qual é o valor, hoje, de muita da nossa Administração Pública? Sabem que hoje, dia 17 de Maio, muitos ainda não receberam o documento das Finanças para poderem pagar o IMI que tem como limite o final de Maio? Que eficiência! O que aconteceria numa empresa ou na Administração do antigamente?

Dir-me-ão: vão ao computador. Sabem quantos computadores é que há nesta terrinha e quantos lares há? Os “atrasados mentais” que ainda se aguentam nas aldeias de Trás-os-Montes, Beiras e em grande parte do Alentejo têm de saber trabalhar com computadores?  Obviamente não. E se por acaso até tiverem um, terão uma rede que possam utilizar? Talvez Deus volte à Terra e repita o milagre do pão ou dos peixes ou das bodas de Canaã.

Sejamos claros: A CASA ESTÁ NO CHÃO, CAÍDA E DESFEITA EM PEDAÇOS TRANSFORMADA NUMA TAP EM GRANDE

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País paradisíaco, com um litoral magnífico, que se irá transformando em Comportas várias (não se preocupem com a legislação, já que é feita para ser alterada e com as necessárias fugas em entrelinhas; e haverá sempre um presidente de Câmara amigo), e sempre apetece e vale a pena vir a Portugal, visitar estes “sobredotados” que tanto têm feito pelo País e progresso (de alguns).

A hotelaria faz parte do futuro, mas será deles, dos estrangeiros, não nossa; para nós bastam criados e criadas, chefes de «buffet», servidores de mesa e lacaios vários.

E impostos, como será: onde serão fixados os resultados? Onde será a sede dessas diversas empresas? Que controlos instalaremos para, ao menos, não permitir a fuga ao imposto?

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Total acordo.

Tivemos uma multiplicidade de bancos privados que de repente foram nacionalizados, em condições nunca verdadeiramente compreendidas.

Depois puseram determinados indivíduos – obviamente com enorme experiência de banca! – a tomar conta dos mesmos (vejam-se os currículos desses altos responsáveis; será que o BDP ainda os tem?)

Mas depois foram-se privatizando paulatinamente, muitas vezes com dinheiro emprestado pelos próprios bancos e outro proveniente de «offshores», e o número de bancos foi diminuindo porque para o BCE era uma enorme maçada ter tantos bancos e havia que os fundir e internacionalizá-los. Política que continua a ser prosseguida pela Srª Lagarde, ex-Ministra das Finanças de França e grande (ou ex-grande) amiga do Sr. Sarkozi, o presidente francês condenado em tribunal. E isto com total acordo de um Vice-Presidente do BCE e ex-governador do BDP, que em Portugal deixara obra de grande relevo que, por falta de acesso e conhecimento, não estou em condições de aprofundar; mas que não descobriu os bancos falidos, as traficâncias com «offshores», os “empréstimos” da CGD para compras de bancos, os milhões que por aí esvoaçaram em BICs e não BICs e sei lá o que mais referir. Optimamente – e tranquilizador – foi  indicado para o lugar onde se manteve por volta de uma década!

E AGORA TEMOS A CGD A PRIVATIZAR E A ESTRANGEIRAR (neste último verbo trata-se de uma suspeita baseada nas práticas passadas), o que me parece que será uma das muito poucas escapatórias do Governo (e já não muito distante) para manter as Finanças — Públicas e do País — em estado de sanidade não necrológica. Pobres netos.

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Completamente de acordo, é o que os bancos têm de fazer na defesa dos seus próprios interesses.

Mas pergunta-se: porque multou o BDP vários cidadãos por terem feito isto — que era um simples acto de boa gestão — aqui há uns anos atrás? Numa prática que vinha desde sempre e que continuará enquanto houver bancos e prestamistas?

Simples suspeita: os funcionários do BDP estariam preocupados e vigilantes com os casos de alguns, poucos, milhares e por isso faltou-lhes o tempo para averiguarem dos milhões entre bancos e destes com clientes, das e para as «offshores» e dos enriquecimentos inexplicáveis? Que grande maçada, que insuficiente falta de pessoal, bem como insuficiência de conhecimentos e de capacidade intervencionista.

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G      G

Remeto para a questão anterior; e tenho de lamentar que tendo trabalhado directa ou indirectamente na banca desde 1968 até cerca de 2020 — vários bancos e todo o tipo de postos e de responsabilidades —, pouco ou nada tenha aprendido.

Menos ainda percebo que o então Vice-Governador, Dr. Walter Marques me tenha telefonado, logo nos primeiros governos constitucionais, às duas da manhã, para tomar o primeiro avião para Londres, que já reservara para a madrugada seguinte, para ir negociar um empréstimo para a República (via Banco de Fomento) porque o País estava em ruptura cambial.

E lá fui – acompanhado de um outro administrador, Abel Oliveira – pedir dinheiro (julgo que ao Kreditanstalt ou Kreditbank) que aprovou um empréstimo ao Banco de Fomento Nacional, que o entregou – direitinho – ao BDP. Só que, daí a cerca de 3 semanas, aconteceu exactamente o mesmo (simples repetição), mas como o BDP não cumprira as condições do primeiro contrato perante o BFN, este segundo sofreria algumas modificações de que o BDP não gostou nada, em matéria de definição de quem era o risco bancário. Certamente os contratos existem no BDP e poderão ser comparados.

E por se falar em Banco de Fomento Nacional: nunca foi escrita a história do dito, que foi um banco de sucesso e que terminou bem devido às posições do Dr. Miguel Cadilhe. Há agora, desde há vários meses, um Novo Banco de Fomento: vai arrancar a sério? Vai produzir? Vai ser completamente independente e diligente nas suas apreciações? Vai divulgar o que faz e a quem faz? O inicialmente previsto e o finalmente facultado? Os prazos previstos para o projecto comparados com os prazos reais? Que controlos externos terá, independentes do próprio Banco e das entidades de Tutela? Teria uma associação de empresários alguma coisa a dizer em matéria de políticas e de gestão (uma espécie de CEEPS-Centro de Estudos de Economia Política e Social, ou este próprio órgão devidamente reforçado para o efeito)?

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H      H

Há algo de chocante nas sucessivas propostas que, ao longo dos anos, o CEEPS foi fazendo e enviando à Assembleia da República e que o Governo (e certamente a AR) ignoraram completamente.

Façam um exercício simples: vejam o que lá está, as propostas formuladas e sucessivamente reiteradas: ou têm lógica e fazem-se ou não têm e acaba-se com esse assunto.

A síntese desse material: eu tenho-a feita.

Mas ninguém pretende ser aqui defensor do CEEPS, já que podemos e devemos ir muito mais longe

Os políticos andam permanentemente em campanha em vez de – pelo menos os que governam ou fingem que o fazem – darem adequada sequência ao que deve ser feito.

No tempo do Dr. Salazar e do Dr. Marcelo Caetano tínhamos máquinas de planeamento que eram das melhores do Planeta, e tínhamos previsões de resultados devidamente quantificados e medidos.

Só que, como era um planeamento fascista, democratizou-se metendo-o na Constituição e acabando pura e simplesmente com ele. E temos a TAP e o Novo Aeroporto e as vias de comunicação e os hospitais e as escolas e, e, e… tudo em total balbúrdia

Estudos profundos de sábios vários, enquanto os fogos nos vão roubando florestas, todos nós sabendo que este Verão outros fogos virão e depois outros e outros. Pergunta: como foi no passado? O que deveria ser feito rapidamente e com intervenção de indiscutíveis conhecedores da matéria? Que tivessem metido a mão na massa em profundidade.

Quem são os políticos que uma empresa séria e exigente estaria disposta a empregar?

Em Democracia – que há que defender a todo o custo – pode haver casos excepcionais, sempre houve e sempre haverá. Mas ao nível a que chegámos?

Onde estão democratas lúcidos e sérios em quem votar?

Uma senhora de um pouco mais de 60 anos, toda a vida mulher a dias, disse-me em quem iria votar; e pode acontecer que algum partido consiga passar mensagens a este nível de votantes que efectivamente os convençam.

Eu tive um Salazar. Chegou-me e não desejo outro, pelo que, para além de salvar a Democracia, há que manter a independência do País e desenvolvê-lo de forma leal, séria e por todos perceptível e controlável. Respeitando equilíbrios na distribuição de rendimentos e dando oportunidade aos mais capazes ou empenhados.

Numa Conferência – hoje promovida pela Academia Portuguesa de História, em que foi orador o Prof. António Alves Caetano – sobre Cláudio Adriano da Costa (1795-1866): Economista português mais esclarecido da primeira metade de oitocentos fixei uma frase que reproduzo a seguir (atenção: é do Séc. XIX, há quase 200 anos):

Cito: “… a mais crassa ignorância de todos os nossos Ministros de Estado, sim, Ministros de Estado, e em todos os nossos legisladores, que se arrojam a fazer leis sobre as precisões do Reino, ignorando eles quais elas sejam!”

Fim de citação; a frase é de 1840

Temos de admitir que é uma vergonha que se mantém – substituam reino por república, ambas com direito a r minúsculo -, que traduz uma enorme desvalorização de políticos e profissionais, não ter ainda conseguido obter uma capacidade de governação, dando resposta a uma reivindicação formulada vai para 200 anos

17 de Maio de 2023

1 Comment

  1. Essa “mania” de se falar em “excessos” parece querer dizer que a LUTA de CLASSES é coisa “mansa”.
    Em minha fraca opinião, há que acabar com esse choradinho de “Pop/chula” – como dizia o Zé Mário Branco – e encarar a coisa de frente e sem “rodriguinhos”: o 25A colapsou no SETEMBRISMO principalmente porque a ESQUERDA NÃO SABIA O QUE FAZER A “ISTO”, não tinha estratégia alguma, ou mais cruamente, não via um palmo à frente do nariz. E ainda hoje – passados 50 anos – não sabe como nos tirar do “buraco” onde o Burguês nos meteu. O SUBDESENVOLVIMENTO tornou-se eterno. Nem a santa da AGRELA nos salva.

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