CARLOS REIS – ISTO ANDA TUDO LIGADO

 

(Para quem tiver paciência…)

 

Isto anda tudo ligado – costumava dizer um desaparecido amigo meu, jornalista e poeta, o Eduardo Guerra Carneiro.

Nada mais verdadeiro. É que anda mesmo. Quando leio notícias destas – a acrescentar a outras do mesmo jaez e sempre crescentes neste pobre país, sou levado a pensar – por entre a raiva impotente que entretanto se me impregna – que somos um povo de incultos, que não lê, que a cuja maior parte nenhuma falta fazem livrarias e por aí fora, raios os partam, etc.

Depois penso que realmente o que os poderes permitem em termos de especulação habitacional e nula preocupação com o centro histórico das cidades – graças a interesseiros, incompetentes, ignorantes e reaccionários presidentes das Câmaras – pesa em boa parte nestes desmandos e lenta destruição desses mesmos centros.

A Baixa de Lisboa, por exemplo – como aqui se afirma – é cada vez mais desfrequentada por lisboetas, está invadida e sobrepovoada de asquerosos enxames de moscas varejeiras turísticas, que com todo o à vontade a ocupam e habitam, por entre crescentes unidades hoteleiras porta sim, porta não e criativos “turismos de habitação” à custa do despejo de velhos e desprotegidos inquilinos.

Continuo ainda a pensar, nos tais poderes que ajudam Bancos falidos (por incúria e vigarice) e se marimbam para livrarias e lojas centenárias, despejos de pessoas e associações, permitem construção em cadeia de “hotéis de charme” nesses locais centrais, outrora de vivência e de convívio… E a minha raiva e irritação aumentam.

Penso ainda que sermos um país “que aposta no turismo”, lhe dá muito menos trabalho do que investir em outras coisas, criar realmente riqueza. Aproxima-o razoavelmente de países do Terceiro Mundo, que vivem disso e aproveita o habitual e infeliz nacional-servilismo prevalecente, de governantes e governados.

Mas depois penso também: como é que num país em que uma boa percentagem das pessoas, além da ancestral ignorância e pouca cultura, mal tem poder económico para sobreviver, conseguir manter uma família, educar os filhos, etc. pode ainda ter dinheiro ou tempo para ir a livrarias comprar livros?

Mas penso mais, ainda. Se a maior parte dessa gente passou o tempo (cinquenta anos, não é?) a eleger governos e câmaras de Direita ou próximo disso, cujos se estão nas tintas para estas coisas, que estão de bem com todas as sacanices e especulações fora da lei do chamado “tecido empresarial” e do “grande capital” (para usar a estafadésima e obsessiva expressão de um conhecido Partido) é porque sempre se identificaram (?) com essa corja, essa cambada de pulhas…

Não é?

Então pronto. Ou prontos, mais coloquial. Tudo está correcto, tudo está no seu lugar, tudo tem a sua lógica. E isto anda realmente tudo ligado, como dizia o Eduardo Guerra Carneiro.

Carlos

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