BISCATES – Crónica tauromáquica – por Carlos de Matos Gomes

biscates

Para que servem as primeiras páginas dos jornais e os grandes casos dos noticiários das TV?

Se pensarmos no que as primeiras páginas e as aberturas dos telejornais nos disseram enquanto decorriam as traficâncias que iriam dar origem aos casos do BPN, do BPP, dos submarinos, das PPP, dos SWAPs, da dívida, e agora do Espírito Santo, é fácil concluir que servem para nos tourear.

Desde 2008 que as primeiras páginas dos Correios das Manhas, os telejornais das Moura Guedes, os comentários dos Medinas Carreiras, dos Gomes Ferreiras, dos Camilos Lourenços, dos assessores do Presidente da República, dos assessores e boys dos gabinetes dos ministros, dos jornalistas de investigação nos andam a falar de tudo e mais alguma coisa, exceto das grandes vigarices, aquelas que, de facto, colocam em causa o governo das nossas vidas, da nossa sociedade, os nossos empregos, os nossos salários, as nossas pensões, o futuro dos nossos filhos, dos nossos netos. Que me lembre falaram do caso Freeport, do caso do exame de inglês de Sócrates, da casa da mãe do Sócrates, do tio do Sócrates, do primo do Sócrates que foi treinar artes marciais para a China, enfim que o Sócrates se estava a abotoar com umas massas que davam para passar um ano em Paris, mas nem uma página sobre os Espirito Santo! É claro que é importante saber se um primeiro ministro é merecedor de confiança, mas também é, julgo, importante saber se os Donos Disto Tudo o são. E, quanto a estes, nem uma palavra. O máximo que sei é que alguns passam férias na Comporta a brincar aos pobrezinhos. Eu, que sei tudo do Freeport, não sei nada da Rioforte! E esta minha informação, num caso, e falta dela, noutro, não pode ser fruto do acaso. Os directores de informação são responsáveis pela decisão de saber uma e desconhecer outra.

Os jornais, os jornalistas, andaram a tourear o público que compra jornais e que vê telejornais.

Em vez de directores de informação e jornalistas, temos novilheiros, bandarilheiros, apoderados, moços de estoques, em vez de notícias temos chicuelinas.

Não tenho nenhuma confiança no espirito de autocritica dos jornalistas que dirigem e condicionam o meu acesso à informação: todos eles aparecerão com uma cara à José Alberto de Carvalho, à Rodrigues dos Santos, à Guedes de Carvalho, à Judite de Sousa (entre tantos outros) a dar as mesmas notícias sobre os gravíssimos casos da sucata, dos apelos ao consenso do venerando chefe de Estado, do desempenho das exportações, dos engarrafamentos do IC 19, das notas a matemática, do roubo das máquinas multibanco, da vinda de um rebenta canelas uzebeque para o ataque do Paiolense de Cima, dos enjoos de umaapresentadeira de TV, das tiradas filosóficas da Teresa Guilherme. Todos continuarão a acenar-me com um pano diante dos olhos para eu não ver o que se passa onde se decide tudo o que me diz respeito.

Tenho a máxima confiança no profissionalismo dos directores de informação, que eles continuarão a fazer o que melhor sabem: tourear-nos. Abanar-nos diante dos olhos uma falsa ameaça para nos fazerem investir contra ela enquanto alguém nos espeta umas farpas no cachaço e os empresários arrecadam o dinheiro do respeitável público.

Não temos comunicação social: temos quadrilhas de toureiros, uns a pé, outros a cavalo.

Uma primeira página de um jornal é, hoje em dia e após o silêncio sobre os Espirito Santo, um passe de peito.

Uma segunda página será uma sorte de bandarilhas.

Um editor é um embolador, um tipo que enfia umas peúgas de couro nos cornos do touro para a marrada não doer.

Um director de informação é um “inteligente” que dirige uma corrida.

Quando uma estação de televisão convida um Camilo Lourenço, um Proença de Carvalho, um Gomes Ferreira, um João Duque, um Gomes Ferreira, um Judice, um Marcelo, um Miguel Sousa Tavares, um Angelo Correia, devia anunciá-los como um grupo de forcados: Os Amadores do Espirito Santo, por exemplo.Eles pegam-nos sempre e imobilizam-nos. Caem-nos literalmente em cima.

As primeiras páginas do Correio da Manhã podiam começar por uma introdução diária: Para não falarmos de toiros mansos, os nossos queridos espectadores, nemde toureios manhosos, os nossos queridos comentadores, temos as habituais notícias de José Sócrates, do memorando da troika, da imperiosa necessidade de pagar as nossas dividas.

Todos os programas de comentário político nas TV deviam começar com a música de um passo doble. Ou com a premonitória “Tourada” do Ary dos Santos, cantada pelo Fernando Tordo.

O silêncio que os “negócios “ da família dona disto tudo mereceu da comunicação social, tão exigente noutros casos, é um atestado de cumplicidade: uns os jornalistas venderam-se, outros queriam ser como os Espirito Santo. Em qualquer caso, as redacções dos jornais e das TV estão cheias de EspiritosSantos. Em termos tauromáticos, na melhor das hipóteses não temos jornalistas, mas moços de estoques. Na pior, temos as redacções cheias de vacas a que se chamam na gíria as “chocas”.

O que o silêncio cúmplice, deliberadamente cúmplice, feito sobre o caso Espirito Santo, o que a técnica do desvio de atenções, já usada por Goebels, o ministro da propaganda de Hitler, revelam é que temos uma comunicação social avacalhada, que não merece nenhuma confiança.

Quando um jornal, uma TV deu uma notícia na primeira página sobre Sócrates( e falo dele porque a comunicação social montou sobre ele um operação de barragem pelo fogo, que na altura justificou com o direito a sabermos o que se passava com quem nos governava e se esqueceu de nos informar sobre quem se governava) ficamos agora a saber que esteve a fazer como o toureiro, a abanar-nos um trapo diante dos olhos para nos enganar com ele e a esconder as suas verdadeiras intenções: dar-nos uma estocada fatal!

Porque será que comentadores e seus patrões, tão lestos a opinar sobre pensões de reforma, TSU, competitividade, despedimentos, aumentos de impostos, gente tão distinta como Miguel Júdice, Proença de Carvalho, Angelo Correia, Soares dos Santos, Ulrich, Maria João Avilez e esposo Vanzeller, não aparecem agora a dar a cara pelos amigos Espirito Santo?

Porque será que os jornais e as televisões não os chamam, agora que acabou o campeonato da bola?

Um grande Olé aos que estão agachados nas trincheiras, atrás dos burladeros!

Carlos de Matos Gomes

21 Comments

  1. Como antigo profissional de comunicação social e membro, entre outras instituições, dos Conselhos de Opinião da RDP e RTP, SGPS (órgão hoje, na actual RTP, moribundo e completamente ineficaz) – portanto, um observador atento e informado deste tema -, não podia estar mas de acordo com CMG. Os poucos jornalistas a sério, antigos ou novos, que resistem aos “ajustamentos de pessoal” e aos “critérios de admissão”, só muito raramente passam a barreira das submissas direcções e serviçais editorias. Aos outros, podem tais direcções dar carta-branca, à confiança, pois dos chamados “cursos de comunicação social” brotam catadupas de criaturas ignorantes de tudo, da História à língua em que deveriam exprimir-se, empanturradas das “evidências” que o pensamento dominante lhes serve como inquestionáveis, donde, totalmente incapazes de se informarem adequadamente sobre qualquer assunto, de formularem perguntas incómodas, de escaparem do lamaçal de parvoíce em que os mergulharam e por onde vagueiam inscientes. Os “Donos Disto Tudo” sabem (sempre souberam, Marx “dixit”…) criar as estruturas de “formação superior” que produzam os futuros profissionais que lhes convêm e os defendam. Aos outros, espera-os o desemprego, a marginalização profissional e os escolhos que sempre terão de, dificilmente, tornear para encontrar, aqui e ali, uma fenda por onde passe uma informação inteligente e culta.

    1. O problema deste artigo começa logo bem no inicio… engana-se redondamente quando diz que sabemos tudo sobre o freeport, porque não sabemos nada, só sabemos o que o socrates deixou que se soubesse. E caso não saiba o Sócrates e o Dono disto tudo são muito amigos e partilharam muitos lucros ás custas do erário público, por isso não faz sentido estar a separar um do outro. O bes já todos sabemos, era o banco do regime, o banco que servia para ajudar os políticos a fazer os servicinhos deles.
      Quanto ao Medina e ao Gomes Ferreira,só não os entende quem mantém palas partidárias, é que eles atacam todos sem dó nem piedade, sempre que são incorrectos ou corruptos… e claro os que mantêm as palas dos ps ou psd ou cds ou mesmo pcp e afins, fazem tudo para os desacreditar- por isso não misture Medina e Gomes Ferreira com os outros servis.

  2. Não acredito que haja um único jornalista sério . Algum interesse o move sempre , quanto mais não seja manter o seu empregosito inútil , nem que para isso tenha que inventar a notícia . flagrante os jornalistas chamados desportivos , que inventam a notícia onde ela não existe , relatam factos sem o o mínimo interesse ,enaltecem o que é a ralé . São os órgãos de informação e os seus agentes os grandes culpados da situação a que chegámos , bem como quem lhes consente o poder …

    Zé , Zé das Iscas

  3. quase sempre a lucidez nos conduz à tristeza e ao desencanto…e será que esta “folia” não está a esconder ou a anunciar outra ainda maior? na tauromaquia há sempre um toiro melhor. Quanto aos jornalistas, é verdade, andam míopes mas não tomemos a parte pelo todo! no meio de tanto capim tem de haver trigo! eu acredito e para esses as minhas desculpas por não os acarinhar mais vezes, mas raramente os encontro!

  4. De há muito que “todos” nós, já nos apercebemos da informação controlada, que nos chega a casa. Mas, já fizemos algo contra isso? – Parece que não. Continuamos a comprar jornais, a tentarmos estar atentos a todos ao telejornais, e cada vez mais confusos. MAS CONVICTOS QUE ESTAMOS A SER ENGANADOS. Porque nada fazemos? – Será que ao fim e ao cabo gostamos de ser toureados? – O que falta para sermos acordados. Onde estâo os jornalistas sérios? – Eu acredito que ainda os há, apareçam!

  5. É isso mesmo Matos Gomes !! Desde há muito que verifico este estado de coisas na Comunicação Social e foi, durante muito tempo, tema de conversas (e até acusações) com um familiar que tem um alto cargo no corpo editorial de uma conhecida revista.
    Gostei deste teu artigo, principalmente porque vem ao encontro da opinião que, desde há longo tempo tenho da comunicação social portuguesa… e como activista da abolição das touradas, muito consciente do sofrimento do touro, vejo quanto verdadeiro é, também o nosso sofrimento perante esta taurocomunicação social !!
    Abraço forte

  6. Um outro problema tem a ver com a defesa dos empregos e lógicos salários, dos jornalistas. Quem tem a ousadia de falar contra, denunciar o “colarinho branco”ou os poderosos. o risco que corre é ser despedido ou outra coisa do género. Por isso, eu acho que este país não tem solução! Enquanto a maioria do nosso povo for ignorante e desinteressada pelos graves problemas que afetam o país e na hora do voto não penalizar os corruptos ou os que os apoiam, não há solução!
    Quando a injustiça se torna lei a RESISTÊNCIA torna-se um dever

    1. Tem uma grande percentagem de razão. Onde não tem, a meu ver, é na posição a tomar: RESISTÊNCIA. Não. Devemos ir mais além: R E V O L T A ; R E V O L T A; R E V O L T A…popular.

  7. joão gago horta
    meu comandante na guiné
    embora seja um aficionado das touradas , acho que retratou com elevada precisão o que se está a passar neste NOSSO PAIS .Já lá dizia o saudoso ARY DOS SANTOS NA SUA MUSICA DA TOURADA .Já tenho saudades de lhe dar um abraço .PARABENS.

    1. Caro Sr.
      Eu fiz 2 comissões na Guiné. Sou do curso deste seu comandante. Gostava apenas de lhe perguntar:
      Não lhe chegou a barbárie da guerra na Guiné e ainda apoia outra barbárie que são as touradas?

  8. Nao podia estar mais de acordo haja alguem que tenha a coragem de divulgar estas coisas para que toda a gente fique a saber um abraço

  9. Toda os meios de informação importantes fazem censura. Os jornalistas, na sua esmagadora maioria são medrosos e vendidos. Já não há gente como BATISTA BASTOS.

Leave a Reply