Escritora, pedagoga, dramaturga, Alice Gomes foi uma mulher de acção, que deixou publicados vários contos, poesias, traduções, ensaios e muita obra por publicar, que pode ser consultada no seu espólio, entregue pelo filho à Biblioteca Nacional.
Irmã de Soeiro Pereira Gomes e casada com o escritor Adolfo Casais Monteiro, foi pelo final dos anos vinte que se estreou nas letras. Continuando com o “O Dicionário de Educadores Portugueses”(ASA, 2003) : “Desenvolve um tipo de escrita inspirado nas mais modernas correntes estrangeiras e sempre atenta às opiniões das crianças”…. “Como professora fomenta e põe em prática o “método dois projectos”, bem como experiências de organização de bibliotecas de permuta, museus e festas escolares. Dinamizadora da educação pela arte, estimula o teatro infantil, os fantoches, o desenho e todas as manifestações de criatividade como formas de tornar o ensino mais atractivo: para que como gosta de dizer ”qualquer criança possa aprender sorrindo”.
Organizou a Poesia Para a infância (1955), antologia de poesia portuguesa e brasileira, uma beleza de livro, com ilustrações de Costa Pinheiro. E, espanto meu – somos muito ingratos para com os tradutores! – foi ela que traduziu o Principezinho de Saint-Exupery!
Promoveu exposições de desenhos e outros trabalhos escolares infantis. Foi fundadora e dinamizadora da Associação Portuguesa para a Educação pela Arte, onde desenvolveu diversos projectos pedagógicos considerados pioneiros. Com muitos escritores, entre eles minha mãe, Maria Cecília Correia, trabalhou na Cooperativa Ludus — Círculo de Realizações para a Infância e a Juventude, nos anos 60, onde vários artistas, escritores e educadores debateram acerca de livros infantis, com o objectivo de “estimular todas as actividades que auxiliem a existência de uma literatura infantil e juvenil saudável” (Rocha, 1992).
Depois de 1967, dedicou-se exclusivamente à literatura infantil. As reflexões que deixou expressas em Aprender sorrindo e Literatura para a Infância, 1979, demonstram a sua contínua actividade de escritora e divulgadora de literatura infantil.
Professor diz-me porquê?
Por que voa o papagaio
que solto no ar
que vejo voar
tão alto no vento
que o meu pensamento
não pode alcançar?
……
Tu falas falas professor
daquilo que te interessa
e que a mim não interessa.
Tu obrigas-me a ouvir
quando eu quero falar.
Obrigas-me a dizer
quando eu quero escutar.
Se eu vou a descobrir
Fazes-me decorar.
É a luta professor
a luta em vez de amor.
Eu sou uma criança.
Tu és mais alto
mais forte
mais poderoso.
E a minha lança
quebra-se de encontro à tua muralha.
Mas
enquanto a tua voz zangada ralha
tu sabes professor
eu fecho-me por dentro
faço uma cara resignada
e finjo
finjo que não penso em nada.
Mas penso.
Penso em como era engraçada
aquela rã
que esta manhã ouvi coaxar.
Que graça que tinha
aquela andorinha
que ontem à tarde vi passar!…
…….
Alice Gomes