Pier Paolo Pasolini – Itália
(1922 – 1975)
A RESISTÊNCIA E A SUA LUZ
Assim cheguei aos dias da Resistência
sem nada saber dela senão o estilo:
foi estilo de luz, memorável consciência
de sol. Nunca mais pôde murchar,
nem sequer um instante, nem quando
a Europa tremeu na mais morta vigília.
Fugimos, com os trastes sobre um carro,
de Casarsa para uma aldeia perdida
entre canais e vinhas: e era pura luz.
Meu irmão partiu numa muda manhã
de Março, de comboio, clandestino,
a pistola num livro: e era pura luz.
Vivi muito sobre montes que alvejavam
quase paradisíacos no tétrico azul
da planície friulana: e era pura luz.
[…]
Aquela luz era esperança e justiça:
não sabia qual: a Justiça.
A luz é sempre igual a outra luz.
Depois variou: de luz passou a incerta alba,
uma alba que crescia, se alargava
sobre os campos friulanos e os canais.
Iluminava os agrícolas que lutavam.
A alba nascente foi assim uma luz
fora da eternidade do estilo…
Na história a justiça foi consciência
de uma humana divisão de riqueza
e a esperança adquiriu nova luz.
(de “La religione del mio tempo”, trad. de Manuel Simões)
Autor de filmes inesquecíveis como “Medea”, “Il Decameron”, “Racconti di Canterbury”, “Salò o le 120 giornate di Sodoma”, entre muitos outros, deixou-nos igualmente uma obra poética notável: “La meglio gioventù” (1954), “Le ceneri di Gramsci” (1957), “L’usignolo della Chiesa Cattolica” (1958), “La religione del mio tempo” (1961), “Poesia in forma di rosa” (1964), “Trasumanar e organizzar” (1971), “La nuova gioventù” (1975). Em português, dispomos da antologia “Pasolini, poeta” (Plátano,1978), apresentação e selecção de Manuel Simões; e “As Cinzas de Gramsci” (col. O Oiro do Dia, 1978), trad. de Egito Gonçalves.