Da Galiza, mensagem : Da África galega – por Isabel Rei

Da Galiza mensagem

Da África galega

Na Galiza habituamo-nos a prescindir daquilo que é mais necessário quando nos falta durante muito tempo. Podemos não respirar e ir vivendo contra todas as leis da ciência, da experiência e da melancolia.

É habilidade adquirida na dureza da marcha, junto a de escutar as pedras e enxergar ao longe, de mão aberta na sobrancelha. Por isso quando no horizonte vemos os sinais que atravessam o azul e de ouvido na água sentimos ecos de cantares amigos

hei de inventar
um verso que vos faça justiça

abrimos os braços em arco como querendo apanhar um livro da estante superior, e lendo na página onde Mia Couto diz

por ora
basta-me o arco-íris

de todas as cores, espelho da Galiza, a África fala para nós e tinta saudades

em que vos sonho
basta-me saber que morreis demasiado
por viverdes de menos

e por vivermos de mais, que dor é vida, e ausência é espinho que fere a carne ainda mais do que a traição

mas que permaneceis sem preço

porque sem valor de compra. Sem preço porque únicas. Sem preço porque desprezadas, silenciadas, ignoradas. E ainda assim, sem preço, porque nada mais valioso do que a liberdade.

Há companheiras boas e generosas do outro lado do azul que nos entendem e nos falam na rumorosa língua de arume harpado. Que sabem o que somos porque são como nós, calótipo fotográfico da mesma história, da mesma injustiça e da mesma ânsia de viver.

 

Maruja Malho (1902 - 1995)
Maruja Malho (1902 – 1995)

 

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7 Comments

  1. Por se algum leitor ou leitora africana não compreende por que digo que a nossa língua [portuguesa] é “rumorosa” e “de arume harpado”, é por isto:

    Hino galego, poema “Os pinhos” de Eduardo Pondal Abente (1835-1917):

    Que dim os rumorosos
    na costa verdecente
    ao raio transparente
    do plácido luar…?
    Que dim as altas copas
    de escuro arume harpado
    co seu bem compassado
    monótono fungar?
    […]
    Os bons e generosos
    a nossa voz entendem
    e com arroubo atendem
    o nosso rouco som.
    […]

  2. E por que mais hoje? Porque alguém, trás guerra em aparência ganha, decretou liberdade… afinal enganosa… Grave é ver-se filho de escravo; mais doloroso é sentir-se escravo filho de livre, que é o sentimento que dia e dia e dia e noite os “novos” desgovernantes nos incutem sem cuidados paliativos…

  3. Exato, a ver por que temos de andar sempre invocando a diferença e não nos damos conta de que destacando as semelhanças nos fazemos mais humanos e melhor acompanhados. Obrigada pelas leituras.

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