POESIA AO AMANHECER – 167 – por Manuel Simões

poesiaamanhecer
NICOLAU TOLENTINO

(1740 – 1811)

O COLCHÃO DENTRO DO TOUCADO

Chaves na mão, melena desgrenhada,

batendo o pé na casa, a Mãe ordena

que o furtado colchão, fofo e de pena,

a filha o ponha ali, ou a criada:

a filha, moça esbelta e aperaltada

lhe diz co’a voz que o ar serena:

– Sumiu-se-lhe um colchão, é forte pena!

Olhe não fique a casa arruinada…

-Tu respondes assim? Tu zombas disto?

Tu cuidas que, por teu pai embarcado,

já a mãe não tem mãos? E dizendo isto,

arremete-lhe à cara e ao penteado;

eis senão quando – caso nunca visto! –

sai-lhe o colchão de dentro do toucado.

Este é um dos sonetos mais conhecidos de Nicolau Tolentino., dissidente da Arcádia. Trata-se de uma sátira de costumes, exagerada até ao absurdo, caricatura de uma época e de uma classe social. A seriedade dos símbolos é agora substituída por uma sucessão de quadros pitorescos, de forte visualidade, em que se sente mais a intenção de divertir do que propriamente de moralizar.

Leave a Reply