CONTOS & CRÓNICAS – “O rio – o rio me dá a minha pedra”- por Sílvio Castro

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             O rio me dá a minha pedra.

                Na beira do rio, não-beira pois estou em cima da minha pedra, conto a estória.

                Era uma vez um menino que se perdeu não numa floresta, mas num rio. O menino não sabia nadar, mas aprendera desde cedo com os peixesw do seu rio a nadar debaixo d’água.

                Um dia, escapando da atenção de sua mãe, o menino foi encontrar seus amigos peixes. Por muito tempo ele nadou debaixo d’água acompanhando o movimento bailado de dourados badejos taínhas traíras bagres, até mesmo dos cascudos que naquele dia não temiam nem a luz do sol, nem o brilho da lua. Assim ia o menino nadador sem pensar em mais nada senão que estava ali nesta maravilha de águas plantas peixes, tudo iluminado pelo sol encantsdo daquele dia de festas.

                Lá ia o menino, sempre nadando com os peixes e com o rio.

                Tudo era belo visto da água. As cidades iam e vinham, com pontes, muitas pontes, e as gentes que das pontes viam o menino que nadava com os peixes e lhe mandavam adeuses alegres e festivos. Também das plantações ribeirinhas os camponeses paravam por momentos o grande cansaço e acenavam com os chapéus de palha para o nadador. Uma vez um garoto que trabalhava nos campos, vendo o menino que nadava deibaixo dìágua com os peixes, correu para juntar-se a ele. Mas, quase desesperados, seus pais correram também e o agarraram à beira-rio. O nadador ria muito de tudo aquilo e continuava a nadar.

                Assim ia o menino. Era muito que nadava, mas em verdade não sentia nenhum cansaço.

                Ele continuava na sua natação quando de repente viu que os peixes como que elouqueciam de ritmos, a corrente como que se transformava numa corrida absurda. Então ele se viu rodopiar sem mais controle, como o seu pião que muitas vezes teimava de não cansar de rodar. E então caiu num buraco muito fundo e escuro, como se o rio estivesse agora correndo por debaixo da terra, mas sem peixes, sem os seus amigos peixes, os dourados os badejos as taínhas as traíras os bagres os cascudos. Ele rodopiava sempre para o mais profundo do poço.

                Passado um longo tempo o rodopiar diminuiu e ele tomou de novo seu ritmo de nadador. Mas agora pouco via, a não ser aqui e ali algumas pequenas luzes, como vagalume perdidos que lhe indicavam uma estrada. Mais nadava e mais se desesperava pela solidão daquelas águas.

                Os vagalumes aumentavam e ele lhes ia atrás.

                De repente o poço se alargou transformando-se num imenso desconhecido mar que se abria tempestoso, arrastando o nadador nas ondas sem fim.

                O menino se desesperava nas ondas quando, já quase perdido, sentiu que dois golfinhos se aproximaram dele e unidos como se fosse uma jangada o recolheram das ondas.

                Na praia desconhecida de areias cor-de-prata o menino retoma a vista das coisas, mas logo vê que são outras coisas.

                O menino olha o mar, se toca o rosto os braços o peito e nas ondas, agora tranquilas como o antigo rio, vê o reflexo de um homem.

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