MISÉRIA DO OCIDENTALISMO – OS EUROPEUS OCIDENTAIS NADA QUEREM SABER DA RÚSSIA – por SLOBODAN DESPOT

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Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

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Miséria do Ocidentalismo –Os europeus ocidentais nada querem saber da Rússia

 

Slobodan Despot, Misère de l’occidentalisme-Les Européens de l’Ouest ne veulent rien savoir de la Russie

le Causeur, 12 septembre de 2014

Parte II

(conclusão)

A Europa de Lisboa à Vladivostok! Imagina-se o poder, a continuidade, a capacidade de influência, os recursos, de um tal conjunto? Não. Prefere-se “definitely” mirarem-se no Atlântico. Um mundo a envelhecer e os seus próprios “outlaws” mal desbastados que se prolongam desesperadamente por cima do mar vazio e recusando ver no mundo externo outra coisa que não seja um espelho ou um espólio a apanhar. As suas últimas trocas de palavras calorosas com a Rússia foram proferidas no tempo de Gorbatchev. Normal: o corno zeloso tinha começado a desmontar o seu império sem outra contrapartida que não fosse um par de botas de cow-boy no rancho de Reagan. Vinte anos mais tarde, os soldados da NATO ocupavam todas as terras, de Viena à Lviv, em que tinham jurado nunca mexer! No ponto mais alto da Gorbymania, Alexandre Zinoviev lançava o seu axioma que todos os Russos deveriam aprender desde o berço: “Só gostarão do czar enquanto estiver a destruir a Rússia!”

Ah, vocês os Eslavos!” — sim, ouço eu frequentemente dizer — “Que dom para as línguas!” Durante muito tempo ficava embevecido, tomando o cumprimento por dinheiro à vista. Depois, tendo viajado, acabei por compreender. Não é “nós os Eslavos” que temos facilidade para as línguas: são vocês, “os Europeus” que não a têm. Quem não têm necessidade disso, considerando desde há séculos que o vosso conjunto linguístico (ingleses, franceses, alemães, espanhóis) governa o mundo. Porque se esgrimem à fala bantú? A vossa língua, estandarte da vossa civilização, é-vos suficiente amplamente, dado que para além vossa civilização, é o limbo (como no tempo de César), e que para além dos limbos, oh meu Deus… são as terras dos Scythes, dos Sarmatas, dos Caminhantes Brancos, em suma, está a barbárie, a crueldade. Digamos mesmo, muito simplesmente, o fim do mundo onde os navios descem para o abismo infinito.

Aí está porque o russo, para vocês, é como chinês. E o chinês do árabe, e o árabe do inimigo. Os europeus, não têm mesmo mais, na sua própria lógica pensamento egocêntrica, os instrumentos cognitivos para apreender que os outros — que de repente começam a contar — pensam e dizem, realmente, de vocês. Ah! Bulir, se compreendesse o árabe dos pregadores de subúrbio! Ah! Estremeceriam, se entendessem o árabe dos religiosos das periferias. Ah! Rir-se-iam se apanhassem umas migalhas que os servidores chineses do XIIIº dizem sobre os europeus. Ah! Rir-se-iam se compreendessem a finesse do humor negro dos Russos, em vez de se persuadirem face aos seus em levantar as  sobrancelhas como se  as suas lagartas rolantes estejam à beira das nossas estradas .

Mas não riem. Não riem nunca mais . Mesmo os vossos vaudevilles presidenciais são actualmente comentados com ares de avareza. Os europeus são graves, como gatos que ficam sem voz na vossa quietude enquanto que, eles, riem, choram e festejam nos seus apartamentos miniaturas, o seu metro sumptuoso, sentados nos seus bancos, nas suas cabanas, e até sob as chuvas de granadas.

Tudo isto não é nada, dizia eu, falando do equívoco histórico que nos opõe. A parte mais grave, acontece agora. Os europeus estão fortemente descontentes com eles causa de três bocados de terra na Ucrânia das quais até agora ignoravam a existência. Os europeus estão fortemente descontentes com eles por causa de eles serem o que são, teimosos e seguros na suas opiniões! Os europeus estão fortemente descontentes com eles por causa do seu respeito pelas próprias tradições, da família, dos seus ícones e o heroísmo — resumidamente, dos valores que  aos europeus tanto vómitos lhes dão. Os europeus estão fortemente descontentes com eles por eles não quererem organizar pelo amor do outro o ódio ao outro. Invejam-nos por terem resolvido o dilema que aos ocidentais incomoda muito e que os transforma em hipócritas congénitos: Até  quando defenderemos nós as cores que não são as nossas?

Os europeus estão fortemente descontentes com eles por tudo aquilo que os europeus deixaram de ser.

O que impressiona mais, é a enorme ignorância e estupidez de que os europeus dão mostra agora para manterem as suas fantochadas sobre . “o montão de brutos de que é preciso desembaraçá-los do seu ditador caricatural e sangrento antes de os educarmos a servir a “verdadeira” civilização” . Porque tudo o desmente: as excelentes relações da Rússia com as nações que contam e se mantêm de pé (BRICS), o dinamismo real deste povo, a habilidade dos seus estrategas , e a cultura geral do primeiro Russo que chegou, em oposição à incultura especializada “do investigador” universitário parisiense que pretende explicar-nos o seu obscurantismo e o seu próprio atraso. É que este montão de brutos ainda cresce na sua formação e no saber quando a escola europeia produz a ignorância generalizada; acredita ainda nas suas instituições quando as da UE fazem-nos rir; acredita ainda no seu destino quando as velhas nações da Europa confiam o delas à Bolsa e aos banqueiros de Wall

De imediato, a propaganda tudo tem invadido, até ao ar que se respira. O governo de Obama aplica sanções contra o regime de Putin: está tudo dito! De um lado, Guantanamo, os assassinatos por drones nos quatro cantos do mundo, a suspensão dos direitos elementares e a autorização para  matar sem processos os seus próprios cidadãos — e, sobretudo, vinte e cinco anos de guerras coloniais desastrosas, sujas e erradas que fizeram do Médio Oriente, da Bósnia Herzegovina a Kandahar, um inferno amargo. Do outro, uma potência que tenta – – não mexer nas suas próprias fronteiras, aquelas precisamente de que os europeus se comprometeram a nunca se aproximarem. O vosso governo contra o seu regime…

Sabem do que é que se estão a privar, separando-vos assim da Rússia, duas vezes em cada século?

Do refúgio último dos vossos dissidentes, em primeiro lugar o testemunho capital de Snowden. Separam-se de fontes por um lado consideráveis da vossa ciência, da vossa arte, da vossa música e mesmo, nestes dias, do último transportador capaz de levar as vossas pessoas para o espaço. Mas que importa, dado que submeteram a vossa ciência, a vossa arte, a vossa música e a vossa procura espacial à lei suicida do rendimento e da especulação. E que andarem a perseguir  e a espiar passo a passo, como Snowden o provou- – não vos incomoda basicamente mais que isso. Para quê implantar um chip GPS em cães já firmemente seguros pela coleira? Quanto à dissidência… É boa apenas para minar a Rússia. Tudo é bom para minar a Rússia. Incluindo os nazis enraivecidos de Kiev que os europeus apoiam sem nenhum embaraço e em que estes não hesitam em maltratar e matar os seus próprios cidadãos. Qualquer que seja a saída, tudo isto fará sempre alguns milhares de Eslavos amenos.

Que vos fez ele, este país, para que os europeus se disponham a enviar contra ele as forças mais sanguinários dadas à  luz pela maldade humana: os nazis e os djihadistas? Como podem querer contornar um povo que se estende por onze fusos horários? Destituir do exterior um chefe de Estado mais popular que todos os vossos polichinelos reunidos? Será que os europeus estão dementes? Ou será que a Terra é demasiada pequena aos vossos olhos, para que o “o Ocidente” possa nela co-habitar com um Estado russo?

É talvez isso, feitas bem as contas. A Rússia esta na frente, hoje, de um mundo novo, a primeira descolonização verdadeira. A descolonização das ideias, das trocas, das moedas, das mentalidades. A menos que os ocidentais, atlantistas e eurocratas, não consigam arrastar na queda a sua própria cobertura provocando uma guerra atómica, o banquete de amanhã será multipolar. Aí terão apenas o lugar que vos cabe. Será uma primeira vez na vossa história: vale melhor prepararem-se para isso.

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Ver o original em:

http://www.causeur.fr/misere-russie-ukraine-29201.html#

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Para ler a Parte I deste trabalho de Slobodan Despot, publicada ontem em A Viagem dos Argonautas, vá a:

http://aviagemdosargonautas.net/2014/10/14/miseria-do-ocidentalismo-os-europeus-ocidentais-nada-querem-saber-da-russia-por-slobodan-despot/

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