EDITORIAL: Feijões e milhões

logo editorialMudança, a urgência de mudar, dominou o discurso eleitoral no Brasil. Afinal, a única coisa que, no imediato, as eleições poderiam ter mudado – a pessoa do presidente – permaneceu igual – Dilma Rousseff foi reeleita para um novo mandato de quatro anos. A um descontentamento que parecia geral sobrepôs-se entre os mais pobres (que constituem a maioria da massa eleitoral) o temor por mudanças que poderiam pôr em risco benefícios sociais que durante os doze anos de governação petista foram sendo concedidos. O facto de Dilma ter terminado o seu mandato com índices económicos muito baixos, nada significa para a maioria dos eleitores. Gráficos, índices, indicadores, são coisas que passam ao lado dos que vivem numa economia precária.

Na realidade, há dois Brasis – um Brasil rico, pujante, moderno, com tecnologias de ponta, um país com índices superiores ao de muitos estados europeus; há um outro Brasil do Terceiro Mundo, com indicadores económicos e de desenvolvimento que o aproximam da África profunda. No primeiro, manipulam-se milhões, no segundo contam-se os feijões.

Quando no Chile e na Venezuela, as donas de casa fizeram manifestações contra Allende e Chávez, tanto as podemos designar como defensoras da democracia ou como miseráveis fascistas. Depende das lentes que usarmos. No Brasil triunfou a democracia ou o populismo?

Quem acredita que Aécio Neves iria cumprir as promessas, todas as promessas, incluindo as que incorporou no seu programa eleitoral por via do apoio que Marina Silva lhe deu? Quem acredita que ele acabasse com a corrupção que tem manchado o percurso dos governos de Lula e Dilma?

Quando terminou a primeira volta, um jornal dizia em manchete: «Agora é entre a fofinha e o playboy». Ganhou a fofinha. É nesta capacidade de desdramatizar que os dois Brasis se encontram – o Brasil luxemburguês dos condomínios fechados e o Brasil nigeriano das favelas, fundem-se num samba, na álacre aquarela de Ary Barroso,  bebem juntos uma caipirinha, riem da mesma piada… e a revolução social que poderia promover a mudança fica para depois. Tal como no passado, o Brasil é um país do futuro.

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