CARTA DE ÉVORA – “Os Velhos e os Meninos” – por Joaquim Palminha Silva

 

«É cousa tão natural o responder, que até os penhascos duros respondem, e para as vozes têm ecos. Pelo contrário é tão grande violência não responder, que aos que nasceram mudos fez a natureza também surdos, porque se ouvissem, e não pudessem responder, rebentariam de dor.»Padre António Vieira, Circular à nobreza de Portugal, Julho de 1694. In Cartas…, Imprensa da Universidade de Coimbra, 1928.          

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A velhice, que tradicionalmente significou previsão, reserva de experiência, melhoria no relacionamento humano e na qualidade de vida, em Portugal deslizou para a marginalidade, produz acelerada indigência e inspira cada dia maior indiferença e, institucionalmente, serve para o Estado praticar sobre ela, chamando-lhe sarcasticamente “3ª idade”, vário de tipo de violências físicas e psicológicas, como por exemplo extorquindo-lhe, arbitrariamente, percentagens substanciais às suas reformas e pensões, desprezando assim todo o princípio ético de um «Estado de Direito», de um regime Democrático!

Ao contrário do que seria necessário para subsistir na União Europeia com um mínimo de dignidade, fazendo-se respeitar e respeitando-se a si mesmo, as “classes” dirigentes de Portugal entraram por todos os vestíbulos do atraso económico, da regressão social, da subserviência ao estrangeiro, do medo (administrativo e financeiro), de mistura com a parvoíce partidária e a estupidificação generalizada da população, intoxicada pelos media

Há mais de 50 anos que não cresce de forma significativa a população portuguesa….

Ainda há pouco (jornal Público, 12/6/2015) a Direcção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência explicava que a quebra de natalidade fez com que o ensino básico perdesse 97.752 anos, durante os últimos sete anos!

Em síntese, a população portuguesa diminui e envelhece com grande rapidez. Entretanto, emigra alguma da que resta com capacidade empreendedora e audácia, tendo atingido o quantitativo de mais de 53 mil emigrantes por ano (2013)!

Falemos claro e a doer: – Os partidos políticos e o capitalismo seu associado, da esquerda tradicional à direita clássica, passando pelo centro incaracterístico, revelam-se incapazes de agasalhar um tão escasso e pacífico número de habitantes (casa, pão, trabalho…), de forma organizada, minimamente aceitável, civilizada… No “mundo” laboral há salários tão magros que são um insulto a quem trabalha, e um convite para que a pobreza se transforme em crime e delinquência sistemática, já que os movimentos de rebelião estão fechados à chave no armário dos “esqueletos revolucionários”, propriedade de “comunistas” e tutti quanti

Há reformas e pensões pagas aos idosos que, com as reduções impostas pelo Fundo Monetário Internacional, o encarecimento dos cuidados de saúde ou sua ausência parcial se revelam a expressão viva, naturalmente modernizada, da eutanásia, da exterminação calculada e posta em prática pelos nazis até 1945, mas que hoje já não comove ninguém (vá lá saber-se porquê!), nem os enfatuados burocratas da ONU!

Às vezes, o Poder político e económico dá uns trocos à turbamulta, distribui uns subsídios à plebe devoradora de bisbilhotices e coscuvilheira de intimidades, porque em determinadas épocas lhes convém dar uns “cêntimos para pevides”… Então, lá vêm, os militantes dos “partidos do povo” dizer que foram eles e só eles, com a sua gritaria e o medo que inspiram à burguesia, quem forçou os de cima a dar qualquer “coisinha” aos de baixo! – Como se houvesse no Poder político e económico, alguma vergonha ou medo desta gente da pedincha, aos gritos e em grupo, rua abaixo, rua acima!

Há quanto tempo vivemos esta mentira? Quanto tempo mais temos de aturar estes jogos patéticos?

Entretanto o país envelhece: – A vida dos idosos é encurtada a marchas aceleradas, através da orquestração institucional de mil carências. A população jovem que ainda vegeta pelo território não encontra “meios de vida”, com ou sem as minimalistas licenciaturas universitárias de hoje; os mais audazes vão-se embora para o estrangeiro e os meninos deixam de aparecer nos jardins-de-infância…

Deixem-se de tretas! Não venham com solidariedades sociais hipócritas! Acabem com a “histórica” bazófia dos benefícios do turismo, das exportações de vinho & etc., …

O país está a morrer a olhos vistos! – Não haverá quem chame uma equipa médica de urgência para salvar o que resta de vida colectiva?

 

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