A GALIZA COMO TAREFA – Le style c’est l’homme ? – Ernesto V. Souza

Poucas vezes e tão claramente como no trabalho de Vitor Klemperer: LTI – Lingua Tertii Imperii: Notizbuch eines Philologen (1947), uma obra filológica manifesta ser uma profunda reflexão sobre os elementos que conformam a psique social e uma analítica de como a linguagem, o léxico, o estilo e também as formas gráficas, tipográficas e ortográficas, penetram, com consequências na sociedade, nos comportamentos, na imagem do caráter nacional, e ultrapassam a sua época alterando por sua vez a língua na história (e portanto a  mesma percepção da história).

Klemperer, professor de Literatura Francesa e estudioso dos clássicos franceses, retaliado por judeu, na Universidade de Dresden, privado do uso de bibliotecas, arquivos, livros e materiais de estudo, submetido a vigilância, elabora na clandestinidade um diário onde vai consignando em chave as suas análises e perplexidades a respeito da linguagem desenvolvida e promovida pelo nazismo, e como esta vai ocupando, a par de outros modos e estéticas a vida quotidiana, o mundo das artes, a literatura, a propaganda, a imprensa, os discursos e finalmente a sociedade. 

A obra, sintetiza e resume, sistematizando as anotações, para deixar um panorama gizado de conceitos teóricos de rara profundidade, diálogos pedagógicos, cenas da vida quotidiana, descrições e as pequenas subversões de um inimigo do sistema, categorizado como infra-humano judeu.

O contraste, profundo, do acomodado professor e patriota alemão, converso ao protestantismo e casado com uma gentil – o que será a sua salvação – que passa a ser um operário de ínfima categoria, marcado como uma estrela amarela, numa fábrica, e a evolução da sociedade alemã dos anos 30 e depois na Guerra é atafegante e minuciosa.

Filólogo de profissão Vitor Klemperer escolhe para confrontar o Terceiro Reich,  analisar a sua linguagem tanto como ferramenta da eficaz propaganda como o melhor indicador da sua perversa natureza.

Num livro, todo ele fascinante, talvez o mais fascinante seja a ideia de como o léxico e o estilo pode nacionalizar-se, como pode passar de ser o característico (ou caraterizador) de um pequeno grupo para converter-se no estilo, na forma da expressão do conjunto; de um dos componentes diastráticos ao modelo fundamental da língua culta (e portanto da Língua).

Língua culta, que como bem destaca desde Schiller é a que “cria e pensa por ti”. Pois a linguagem ao exprimir as emoções e os pensamentos, dirige e conforma desde repertórios aprendidos e condicionados socialmente como valores ou elementos negativos, a própria pessoalidade e as imagens e palavras com que a sociedade termina por identificar-se. Le style est l’homme même.

Extrapolemos esta ideia, poderosa e subtil, à conformação da língua da Galiza, conformada em camadas históricas sob pressão e imitação à castelhana, e ainda hoje submersa no estilo, léxico e códigos (nos valores enfim, apenas subjacentes à ligeira tona) do franquismo e pós-franquismo, como no conjunto da sociedade espanhola.

1 Comment

  1. Nazismo de ontem como de hoje camuflado pela dita democracia que com a desculpa de melhorar a economia faz de escravos as famílias, cortando nos benefícios sociais, nos despedimenos de trabalhadores, que são o sustentáculo das nações. Porque quem tem capital continuam a ter benesses.
    Sendo que as classes média e mais pobre vão ficando cada vez mais sem recursos para viverem uma vida decente e condigna.

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