Imagem trabalhada por Acácio de Carvalho
CARTA A UM HOMEM DA LIBERDADE (*)
(salgueiromaia@capitãodeabril.com)
Meu Caro,
Por aqui há algumas novidades.
Aquele que atribuiu a pensão aos ex-pides – e a recusou à viúva de um dos mais generosos capitães de Abril! – já não mora em Belém;
e aqueloutro que fez com que milhares de jovens, como a tua filha Catarina, deixassem de acreditar no país e partissem para outras paragens já não é primeiro-ministro. Isto é: deixou de trabalhar a recibos-verdes para a senhora Merkel;
Mas um e outro fizeram muitos males e provocaram muitos danos nas conquistas iniciadas naquele aquele dia em que “… Coube-te empenhar o megafone dos ultiMatos e dos anúncios que obrigam os caLendários a reescrever as celebrações (**).”
Digo-te, Capitão Salgueiro Maia: foram anos de chumbo. Sobretudo, os últimos cinco. Muitos foram aqueles que ficaram sem trabalho e sem esperança; alguns suicidaram-se; cortaram nos salários, nas pensões e nas reformas; rasgaram o contrato social e fizeram tábua rasa de muitas das leis que protegiam o mundo do trabalho; a maioria dos teus concidadãos empobreceu e uma pequena minoria acumula milhões que esconde criminosamente em paraísos fiscais; a Democracia está a ser transformada numa mera formalidade; e os jornalistas que recusaram servir o Pensamento Único foram abatidos ao efectivo.
A Associação 25 de Abril que te representa e a todos os que integraram o Movimento das Forças Armadas deixou há muito de participar nas cerimónias comemorativas do fim da ditadura. Fá-lo-á este ano de novo, pois a maioria parlamentar assim o deseja e a associação assim o quer.
Foram anos de chumbo, sim, Capitão de Abril. E muitos somos aqueles que se lembram das tuas palavras, em Santarém, na madrugada de 25 de Abril de 1974:
“Meus senhores, como todos sabem, há diversas modalidades de Estado. Os estados socialistas, os estados capitalistas e o estado a que isto chegou…”
Por isso, tantos de nós mobilizados pelos ideais comuns e pelo exemplo legado pelas armas da liberdade e da fraternidade saímos à rua. Em nome de Abril.
E em nome das mulheres e homens que, apesar de perseguidos, exilados, presos e torturados, não recuaram no combate ao regime fascista a que ajudaste a pôr termo há 42 anos.
Valeu-nos a luta dura e prolongada, pois. A mesma luta que retirou a maioria parlamentar a quem só tinha um objectivo: vingar-se de Abril e Maio e do seu povo.
Salgueiro Maia,
Deixaste-nos cedo. Em 4 de Abril de 1992. Apenas 18 anos após teres partido de Santarém com os chaimites da desobediência.
Mas uma coisa garanto:
Continuas vivo.
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Caro amigo.
É muito difícil para mim conseguir escrever sobre aquilo que sinto sobre estes assuntos, por isso desculpe-me o português pouco cuidado.
Lembro-me e refiro muitas vezes em conversa entre amigos, porque hoje em dia pode ser perigoso á vontade, que um dia vi aquela pessoa que já não mora em Belém a prestar homenagem no dia de Portugal colocando uma coroa de flores e ficando em sentido alguns segundos frente á estátua do Salgueiro Maia. É o mais perfeito exemplo da hipocrisia, da falsidade ou mesmo de quem não tem escrúpulos ou o que lhe quiserem chamar.
No entanto, o Povo que é quem mais ordena continua a eleger este tipo de gente para seu governo e são estes governantes que, tal como disse um dia o Coronel Vasco Lourenço teimam em fazer esquecer o MFA e o 25 de Abril. vá-se lá perceber porquê.
Todos aqueles que como o Salgueiro Maia, que já cá não estão por exemplo, o Carlos Fabião, o Mário Brandão, o Vitor Alves, etc., etc., e alguns que ainda por cá andam como o meu Pai, nunca quiseram tirar proveito ou qualquer protagonismo pelo que um dia decidiram fazer e que foi só mudar o rumo de País, refiro-me desde o Nascimento até á extinção do MFA.
Foram os únicos que até hoje serviram a Nação sem se servirem e cumpriram integralmente o que prometeram. Isto devia ser exemplo nacional mas infelizmente não é.
Aproveito para informar que o meu Pai está num Lar que não pertence ás Forças Armadas porque o Estado não tem sítio para Homens como ele.
Na verdade até há só que não é para todos porque a reforma não chega.
Só mais umas palavras de apreço e admiração para as mulheres destes militares que sofreram e continuam a sofrer em silêncio com as dificuldades do dia a dia.
Um abraço.
Paulo Tomaz Ferreira.