CARTA DO RIO – 139 por Rachel Gutiérrez

Encontro minha amiguinha Esperança, mais uma vez fora do poema de Charles Péguy, chorosa e triste, olhando a foto de uma ponte de Paris, debaixo da qual, refugiados encontraram enormes pedras para expulsá-los de onde tentavam se abrigar do frio e do abandono. Sei que crueldades assim sempre a farão chorar.

Felizmente, encontrei a foto de outra ponte, aquela famosa, “do amor eterno”, onde namorados de todo o mundo costumavam pendurar cadeados que, de tão pesados, acabaram por ameaçar a própria ponte. Pude mostrar-lhe, portanto, a notícia segundo a qual “as autoridades definiram criativamente o que fazer com os milhares de cadeados que foram retirados. A cidade irá vender os objetos para o público disposto a possuir um pedaço da história de Paris e irá doar o dinheiro para um grupo de refugiados”, como revelou o jornal inglês The Guardian. Em entrevista ao jornal, o primeiro vice-prefeito de Paris, Bruno Julliard, disse que “a venda dos cadeados deve acontecer no próximo ano e que se espera levantar cerca de 100 mil euros (cerca de 365 mil reais).” 

Procuramos outras notícias e fotos atuais e eu percebi que havia conseguido, mais uma vez, reanimar a pequena Esperança, cujo lindo rosto pálido acabara de se iluminar com um sorriso.

E, para nosso consolo, apesar de tudo que temos lido a respeito dos desmandos de Donald Trump nos Estados Unidos, e por causa deles, tomamos conhecimento de um protesto criativo e magnífico:

Com os braços entrelaçados e flores nas mãos, milhares de mexicanos formaram um “muro humano” na fronteira com os Estados Unidos, nesta sexta-feira (17), em protesto contra o projeto do presidente Donald Trump de construir uma barreira para conter a passagem de migrantes.

Convocada por autoridades locais e por associações civis mexicanas, a manifestação reuniu políticos e líderes sociais e, sobretudo, uma multidão de estudantes, no início da tarde, na localidade fronteiriça de Ciudad Juárez, já separada por um muro da cidade americana de El Paso.

Sob o olhar da Patrulha Fronteiriça americana, os manifestantes – entre eles o prefeito de El Paso, Oscar Leeser – formaram uma barreira humana de quase 1,5 km, dando-se os braços e agitando bandeiras e panos brancos.

Leeser, que nasceu do lado mexicano da fronteira e reivindica suas raízes, disse aos presentes: “Ciudad Juárez e El Paso, somos uma única cidade, não estaremos separadas nunca”.

Desta vez, Esperança puxou-me pela mão e começou a saltitar de alegria. Procurei contê-la e disse-lhe que isso não era tudo, que ainda precisava mostrar-lhe as notícias e fotos da monumental manifestação, em Barcelona, a favor da acolhida dos refugiados.

Então, lemos a notícia publicada no Globo de domingo:

Cerca de 150 mil pessoas, de acordo com autoridades, foram às ruas de Barcelona, ontem, (18) para exigir que o governo espanhol e a União Europeia acolham dentro de suas fronteiras um número maior de refugiados da guerra na Síria e de outros conflitos. A Espanha se comprometeu no ano passado a receber 17 mil refugiados, mas desde então apenas 744 pessoas conseguiram refúgio no país. Com o lema “Basta de desculpas, acolhamos agora!” o protesto teve apoio de mais de 200 entidades, incluindo ONGs, associações de direitos humanos e sindicatos. A manifestação, que começou por volta de 17h (14h de Brasília) terminou em frente ao mar para lembrar os que perderam a vida em travessias marítimas.

Vi que os olhos de Esperança se umedeceram, ao lermos a última frase tão comovente da notícia: “terminou em frente ao mar para lembrar os que perderam a vida em travessias marítimas.” Quanta tragédia, quanta tristeza!.

Diante da pequena Esperança, porém, não me permito ficar triste. Talvez Todorov tivesse razão e essa beleza, a dos gestos solidários e compassivos seja, de fato, A Beleza (que) salvará o Mundo.