A propósito da Festa do Avante 2018, escrevi no dia seguinte ao seu encerramento um twitter a dizer o óbvio: Jerónimo de Sousa discursou a abrir e a encerrar a Festa. E do muito que falou nos dois discursos, disse nada. Nada de substancialmente novo, concluiria, no contexto, qualquer bom entendedor. Só que ao escrever assim, sem mais, para poupar caracteres e “puxar” pela mente das leitoras, dos leitores, eu próprio intuía que iria ter dezenas de inscritos e votantes no PCP à perna a “malhar-me”, implacáveis. E não me enganei. Não pude, contudo, deixar de sorrir, por me ver, uma vez mais, confirmado como Sinal de contradição, a revelar os pensamentos escondidos de muitos.
Fica deste modo mais do que provado que não é só ao nível das privilegiadas cúpulas clericais da igreja católica e de muitos católicos súbditos delas, que sou tido como persona non grata, padre subversivo, ateu, até terrorista. De resto, já em seu sinistro tempo, a Pide/DGS me olhou e tratou como um perigoso comunista infiltrado na igreja católica. O próprio bispo D. António Ferreira Gomes terá pensado o mesmo, quando, menos de um mês depois da minha segunda prisão em Caxias, vê ser editado um novo Livro meu, CHICOTE NO TEMPLO, Edições Afrontamento, 1973. Tudo tratado antes, sem que a Pide/DGS desse por tal. De que tipo de organização disporia eu, pensa o bispo?!
Felizmente, o meu advogado de defesa, Dr. José da Silva, nos dois julgamentos a que fui sujeito no Tribunal Plenário do Porto, foi capaz de ver bem mais fundo do que o próprio bispo. Por isso soube resistir à tentação de fazer dos meus julgamentos, um caso político, como então todos os advogados de defesa faziam com os seus clientes presos políticos. Teve a audácia de nunca se desviar do âmbito que me é específico: o do Evangelho de Jesus que, como presbítero da igreja ao serviço da Humanidade, não apenas da igreja, me cumpre praticar-anunciar a tempo e fora de tempo. Ficou assim claro para todo o sempre que sou incómodo, caluniado, rejeitado, odiado e, por fim, até simbolicamente crucificado, apenas por ser um presbítero que pratica-anuncia o Evangelho de Jesus. Não me perdoam que viva neste tipo de mundo-Sistema de Poder sem jamais ser dele.
Mas o meu twitter dizia mais. Melhor, perguntava: Para quando uma mulher na liderança do PCP? Sucede que o fanatismo ideológico dos que me comentaram não os deixou sequer dar por esta minha oportuna pergunta. E a prova é que a esmagadora maioria nem sequer deu por ela. Mas era aí que eu pretendia chegar. Porque, neste tipo de mundo-Sistema de Poder, os Partidos políticos são oportunos, mas apenas como partidos-parteira, por isso, especialistas na Arte de cuidar da vida, das pessoas, da Terra. Uma Arte própria do Feminino. De contrário, não passam de peças na engrenagem do Sistema de Poder, o mesmo que progressivamente rouba a voz e a vez às populações e as condena à condição de meros votantes. Resultado: Crescem as minorias dirigentes e as populações diminuem. Uma situação que raia o sadomasoquismo político.
Aliás, este ano, os discursos do secretário geral do PCP ficaram completamente esvaziados de interesse político, uma vez que a Festa do Avante foi precedida por uma entrevista de Jerónimo de Sousa à RTP, precedida, por sua vez, de um breve mas revelador vídeo gravado com ele na sede nacional do Partido. Sem que as câmaras da RTP pudessem mostrar o seu próprio gabinete de trabalho! Acontece que este vídeo divulga conversas que deixam (quase) nu o misterioso PCP. E quem não deve ter gostado nada do que ouviu Jerónimo dizer na entrevista sobre o OE2019, foram os líderes da CGTP e seus Sindicatos, com destaque para o da Fenprof. Ao separar, e bem, as reivindicações deles das negociações para o OE2019, Jerónimo esvaziou de uma penada as lutas e as greves já anunciadas por eles e cujas reivindicações, legítimas, só são concretizáveis num tipo de mundo outro, que não este do Sistema de Poder. Mas quantos inclusive de Esquerda estão dispostos a dar-lhe corpo nos próprios corpos?!