DEAMBULAÇÕES EM TORNO DA UTILIZAÇÃO DE CANNABIS – ESTE É O NOSSO CÉREBRO COM DROGAS – por ABIGAIL SULLIVAN MOORE – seguido de nota de JÚLIO MARQUES MOTA

 

This is your brain on drugs, por Abigail Sullivan Moore

New York Times. 29 de Outubro de 2014

 

A matéria cinzenta do núcleo accumbens, o centro de prazer do cérebro humano, em forma de noz, estava a brilhar como uma chama, mostrando um notável aumento na densidade. “Isso poderá significar que há alguma nova aprendizagem sobre drogas que temos de fazer “, especulou Jodi Gilman, face ao seu ecrã de computador no Hospital-Geral de Massachusetts-Harvard no Centro de Medicina da Toxicodependência. O cérebro estaria a adaptar-se à exposição ao cannabis, refazendo o sistema de recompensa para solicitar a droga?

A Dr.ª Gilman estava a rever um scan composto dos cérebros de 20 fumadores de cannabis de idades entre os 18 e os 25 anos. O que esta clínica e os seus colegas investigadores da Universidade de Harvard e Northwestern encontraram nessas imagens surpreendeu-os totalmente. Mesmo nos sete participantes que fumavam apenas uma ou duas vezes por semana, havia indícios de diferenças estruturais em duas regiões significativas do cérebro. Quanto mais os sujeitos fumam, maiores são as diferenças.

O uso moderado de cannabis pelos adultos saudáveis parece levantar pouco risco, e haverá benefícios médicos potenciais, incluindo a diminuição da náusea e da dor. Mas há muito que se sabe que, com o cérebro em desenvolvimento até meados dos 20 anos, os jovens que fumam desde cedo e muitas vezes são mais propensos a ter dificuldades na aprendizagem e problemas de saúde mental. Agora os investigadores sugerem que os estudos existentes já não são suficientes. Muito do que se sabe basea-se em estudos de há anos atrás com o consumo do cannabis de então, muito menos poderoso, que não tem nada a ver com o que se comercializa agora.

As amostras da marijuana apreendidas pela Drug Enforcement Agency dos Estados Unidos mostram a concentração de THC, (THC, é o tetrahydrocannabinol, e este é o principal princípio ativo do cannabis) o composto psicoativo da droga, que aumentou em média de 3,75 por cento em 1995 a 13 por cento em 2013. Oscilações do teor em THC dependem da origem da erva e forma em que é utilizado. O vendedor Fresh baked que vende cannabis para fins recreativos em Boulder, Colorado, oferece “crack verde”, com um teor de THC de cerca de 21 por cento, e “Phnom Penh”, com cerca de 8 por cento. O nível num concentrado chamado “Bubble hash” é de cerca de 70 por cento; cartuchos para vaporizadores, bem como e-cigarros, variam de 15 a 30 por cento em THC.

O cannabis de elevado THC está associado com paranóia e psicose, de acordo com um artigo de Junho do New England Journal of Medicine. “Nós temos visto muito, um significativo aumento nas admissões da sala de urgência emergência associadas com a utilização de cannabis que não pode ser contabilizado somente na base das mudanças em taxas de prevalência,” disse Nora D. Volkow, diretora do National Institute on Drug Abuse e coautora do estudo THC. “Isto só pode ser explicado pelo facto de que o cannabis atual tem maior concentração do princípio ativo, THC. O que por seu lado está associada com um risco muito maior para efeitos adversos”. As visitas às salas de emergência relacionadas com a marijuana quase duplicaram, de 66.000 em 2004 para 129.000 em 2011, segundo os Substance Abuse and Mental Health Services.

Maior concentração do princípio ativo também pode acelerar a adição ao produto. “O consumidor não tem que se esforçar muito para ficar alto”, disse Alan J. Budney, um pesquisador e professor na Faculdade de Medicina de Dartmouth. “Como se torna mais fácil ficar alto, isso torna uma pessoa mais vulnerável à adição.” Entre os adultos, a taxa é um para 11; para adolescentes, é de um para seis.

Preocupações com a potência crescente e com o aumento de utilização entre os jovens, está a impor mais exigências à investigação.

 

Um estudo de Harvard-Northwestern encontrou diferenças entre o cérebro de jovens adultos fumadores de cannabis e o cérebro dos não fumadores. Nessas imagens, compostas, as cores representam as diferenças — na forma da amígdala, da parte superior e do núcleo accumbens. A zona a amarelo indica áreas onde as diferenças são maiores enquanto as zonas a vermelho é onde as diferenças são menores.

Para o estudo de Harvard-Northwestern, publicado na edição de Abril do jornal da neurociência, a equipe digitalizou os cérebros de 40 jovens adultos, a maioria das faculdades da área de Boston. Metade eram não-consumidores; a outra metade relatou fumar com desde um a seis anos de consumo e não mostravam sinais de dependência. Para além dos sete fumantes de menos intensidade leves, nove fumavam de três a cinco dias por semana e quatro fumavam, em média, diariamente. Todos os fumadores mostraram anomalias na forma, na densidade e no volume do núcleo accumbens, que é a “zona que está no centro da motivação, do prazer e da dor, e cada decisão que se tome”, explicou o Dr. Hans Breiter, um co-autor do estudo e professor de Psiquiatria e de Ciências Comportamentais na Faculdade de Medicina de Northwestern.

Mudanças similares afetaram a amígdala, que é fundamental no processamento de emoções, memória e respostas face ao medo.

O que já é conhecido é que, nos consumidores casuais, o THC pode alterar a atenção, a memória de trabalho, a tomada de decisão e a motivação por cerca de 24 horas. “O facto de que podemos ver esses efeitos estruturais no cérebro pode indicar que os efeitos do THC são mais duradouros do que pensávamos anteriormente”, disse a Dr.ª. Gilman, um professor de Psicologia na Faculdade de Medicina de Harvard.

O estudo foi preliminar e pequeno, e estão a ser encaradas hipóteses de replicar o trabalho.

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A Dr.ª Gilman está preocupada com o impacto da utilização de cannabis na população universitária. “Isto é, quando eles estão a tomar algumas decisões importantes da vida”, disse ela, “escolhendo uma carreira, construindo amizades que se querem duradouras.”

O Dr. Volkow sublinhou um outro problema: ir a uma festa num sábado à noite pode dificultar a estudar para um teste ou escrever um texto na segunda-feira seguinte. “Talvez não se tenha a motivação para estudar, porque não há recompensa, não há nenhum incentivo”, disse ela.

Evidências de efeitos a longo prazo também estão a ser estabelecidas. Um estudo lançado em 2012 mostrou que os adolescentes que foram encontrados dependentes de cannabis antes dos 18 anos e que continuaram a consumir em idade adulta perderam uma média de oito pontos de QI na casa dos 38 anos de idade. E no ano passado na Northwestern, o Dr. Breiter e os colegas também detetaram mudanças no núcleo accumbens entre adultos de pouco mais de 20 anos que tinham fumado diariamente durante três anos mas tinham parado pelo menos desde há dois anos.

A sua memória de trabalho estava igualmente alterada. “A memória de trabalho é fundamental para a aprendizagem”, disse o Dr. Breiter. “Se eu tivesse que indicar uma substância que é má para estudantes universitários, indicaria o cannabis.”

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Nota de Júlio Marques Mota

E como editor deixem-me colocar  em inglês os resultados a que chegaram duas Instituições americanas sobre o cannabis e as doenças que podem ser vistas como efeitos colaterais:

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