“XÁCARA DAS BRUXAS DANÇANDO” – letra de CARLOS DE OLIVEIRA, música de JOÃO GIL, pelos TROVANTE – a seguir poema dito por JOÃO GROSSO

(1921 – 1981)

 

Obrigado a Quixote1615 e ao youtube

 

Ó castelos moiros, armas e tesoiros

Quem vos escondeu

Ó laranjas de oiro que ventos de agoiro

Vos apodreceu

Há choros, ganidos, à luz das cavernas

Onde as bruxas moram

Onde as bruxas dançam, quando os mochos amam

E as pedras choram

Caravelas, caravelas

Mortas sob as estrelas

Como candeias sem luz

Os padres da inquisição

Fazendo dos vossos mastros

Os braços da nossa cruz

Caravelas

As bruxas dançam de roda

Entre o visco dos morcegos

Dançam de roda raspando

As unhas podres de tojo

Na noite morta do fogo

Como num tambor de rojo.

Obrigado a Imperial Kain e ao youtube

Obrigado a Sílvia Dias, Tanto caminho para Andar e João Grosso

 

XÁCARA DAS BRUXAS DANÇANDO

1

Era outrora um conde
que fez um país,
com sangue de moiro,
com laranjas de oiro,
como a sorte quis.

Há bruxas que dançam
quando a noite dança,
são unhas de nojo,
são bicos de tojo,
no tambor da esperança.

Ventos sem destino
que dizeis às ramas?
Desgraça bramindo
é a nós que chamas.

No país que outrora
um conde teceu,
as laranjas de oiro
são bruxas de agoiro
e fúrias do céu.

Anda o sol de costas
e as bruxas dançando
e os ventos do norte
sobre nós espalhando
as tranças de morte.

As estrelas mortas
apagam-se aos molhos:
vem, lume perdido,
florir-nos os olhos.


2

Ama, estarás ouvindo
a história que vou contando?
Ó ama pátria dormindo
desde quando?

Desde tempos e memórias,
desde lágrimas e histórias,
desde raivas e glórias,
agora te estou chorando
e tu dormindo
até quando?

As bruxas andam lá fora
e eu chorando
versos do país de outrora.

Dançam bruxas a ganir
de mãos dadas com o vento.
Ama, acorda; sopra o lume;
E não me deixes dormir
na noite do pensamento.


3

Ó castelos moiros,
armas e tesoiros,
quem vos escondeu?
Ó laranjas de oiro,
que ventos de agoiro
vos apodreceu?

Há choros, ganidos,
à luz da caverna
onde as bruxas moram,
onde as bruxas dançam
quando os mochos amam
e as pedras choram.

Caravelas, caravelas,
mortas sob as estrelas
como candeias sem luz.
E os padres da inquisição
fazendo dos vossos mastros
os braços da nossa cruz.

As bruxas dançam de roda
entre o visco dos morcegos,
dançam de roda raspando
as unhas podres de tojo
na noite morta do povo
como num tambor de rojo.


4

E o tempo murchando
a luz de idos loiros.
Ama, até quando
estaremos chorando
os castelos moiros?

Lá vão naus da Índia,
lá se vão tesoiros.
E as bruxas dançando
e os ventos secando
as laranjas de oiro.

Ama, até quando?

Na noite das bruxas
o lume no fim
e o vento ganindo.

Ama, estarás ouvindo?

O lume no fim
e os homens dispersos.

Ama, tens frio;
cinge-te a mim
e aquece-te ao lume
queimando os meus versos.


*

Do livro/CD “Geração do Novo Cancioneiro” (2010).
Poema de Carlos de Oliveira.
Música de Luísa Amaro.
Também em Trabalho Poético – Mãe Pobre, págs. 38-44, ed. Assírio & Alvim, Lisboa 2003.

Leave a Reply