A Guerra na Ucrânia — General Milley: os F-16 não são armas mágicas, por Davide Malacaria

Seleção e tradução de Francisco Tavares

2 min de leitura

General Milley: os F-16 não são armas mágicas

Por Davide Malacaria

Publicação por em 26 de maio de 2023 (original aqui)

 

 

Não existem armas mágicas. Nem os F-16 nem qualquer outra“, foi assim que o general Mark Milley, chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, num briefing realizado no Pentágono na quarta-feira, deitou por terra mais um disparate propagado sobre a guerra da Ucrânia.

 

Os lucros da guerra

Os F-16, que chegarão depois do Verão, ou seja, provavelmente depois da contra-ofensiva de Kiev, não darão uma “volta” ao conflito, tal como não aconteceu com as armas mágicas anteriores (tanques, Patriots, etc.).

Além disso, Milley esclareceu os custos da operação e fez uma comparação com a força aérea russa: “Dez F-16 custam mil milhões de dólares. Se acrescentarmos os custos de manutenção, mais mil milhões de dólares. Portanto, estamos a falar de 2 mil milhões de dólares por dez aviões. Os russos têm 1.000 caças de quarta e quinta geração“.

Esta última especificação é analisada em pormenor pelo sítio Military Watch, que explica como os F-16 serão um alvo não muito exigente para a anti-aérea russa, nomeadamente os S-400, e não serão rivais para os jactos russos mais modernos.

Assim, a forte pressão para entregar F-16 a Kiev, longe de ter uma motivação táctico-estratégica forte, tem antes uma motivação económica relevante.

Os países europeus que enviam os jactos, agora obsoletos, terão de reajustar os seus dispositivos aéreos, recorrendo ao Tio Sam, que verá assim mais milhares de milhões a fluir para o já magro sector militar-industrial.

A guerra é um negócio lucrativo, daí a vontade de continuar, apesar de as hipóteses de vitória de Kiev serem mais do que mínimas – como bem sabem em Washington -, tão insensato como foi defender Bakhmut a todo o custo durante nove meses, criando um matadouro inútil.

 

Wallace em Kiev de surpresa

A própria queda de Bakhmut deve ter desestabilizado o establishment de Kiev e os seus patrocinadores, que há meses vinham tranquilizando o mundo sobre a resiliência da cidade.

Zelensky também tinha explicado o motivo à Associated Press: com a queda de Bakhmut, disse, havia o risco de surgirem pressões para abrir negociações dentro da Ucrânia e entre os seus aliados relutantes.

E foi provavelmente para evitar tais pressões que o ministro da Defesa britânico, Ben Wallace, se deslocou a Kiev imediatamente após a queda de Bakhmut, numa visita surpresa em que se encontrou com o seu homólogo Oleksii Reznikov.

É um guião que já vimos antes: quando Kiev estava a concluir um acordo negociado com Moscovo, em Abril do ano passado, Boris Johnson voou de surpresa para a Ucrânia para explicar a Zelensky que o Ocidente não estava de acordo, frustrando tudo (Responsible Statecraft).

Há muito que o Reino Unido assumiu o papel de condutor do conflito, como observa Jonathan Cook no Declassified Uk, num artigo intitulado: “A Grã-Bretanha belicista está a empurrar a Europa para a catástrofe ucraniana“. E Wallace, que, além disso, aspira a substituir Stoltenberg como secretário da NATO (Guardian), é um dos mais apaixonados intérpretes desse papel.

A guerra vai durar muito tempo, declarou Milley, que não pode sair do guião que lhe é imposto. Entretanto, multiplicam-se as iniciativas de paz, a última das quais, relevante, é a do Vaticano.

Iniciativas louváveis, que devem ser empreendidas mesmo que tenham poucas ou nenhumas hipóteses de êxito. Se a história nos pode perturbar, foi também o caso da guerra do Vietname, no decurso da qual, paralelamente aos confrontos, se desenrolaram várias iniciativas destinadas a levar a cabo negociações formais entre as partes, e isto desde os primeiros meses da intervenção americana.

A guerra, como se sabe, não terminou com essas tentativas, mas sim com meios militares. A história tem o vício de se repetir, mas esperar o inesperado não é um exercício em vão.

 


 

Davide Malacaria, jornalista italiano e blogger, escreveu no católico “30giorni” e dirige o sítio Piccole Note de que é fundador. “Trabalhava numa revista, mas já não trabalho. Mas a vontade de olhar para os jornais continuou a ser a de captar lampejos de inteligência e de conforto sobre os assuntos do mundo e da Igreja. E de as comunicar aos outros. Daí a ideia deste pequeno sítio. Uma coisa pobre, sem pretensões, que espero que seja de alguma utilidade para aqueles que partilharem estas páginas comigo. Com o passar do tempo, Piccole note enriqueceu-se com colaborações queridas. Não como resultado de uma procura laboriosa, mas através de uma feliz acumulação espontânea. Uma riqueza para o sítio, mas muito mais para os nossos pobres corações.”

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