A crise na Europa, a crise em Madrid, a crise de um sistema: olhares sobre Espanha

Selecção e tradução de Júlio Marques Mota

 

11. A reforma do mercado de trabalho em Espanha

 

Que esconde a reforma do mercado de trabalho aprovada pelo Governo espanhol em 10 de Fevereiro?


O seu objectivo bem evidente é o de  reduzir os custos de despedimento contra  a utilização  excessiva de contratos temporários, que afecta 30% dos trabalhadores espanhois  e contra o “medo de contratar”, que estaria a  paralisar os dirigentes das  empresas.


Com esta reforma também se defende uma maior flexibilidade dos trabalhadores para evitar o recurso aos despedimentos em massa em tempos de crise e privilegiar os ajustamentos internos, em termos de tempo de trabalho e de funções.

 

Um objectivo fundamental num país que perdeu 2,7 milhões de postos de trabalho desde o início da crise e onde a taxa de desemprego subiu de menos de 8% a 23% da população activa.

 

Por trás desses princípios de boas intenções, “estamos face ao maior ataque contra os direitos dos trabalhadores nos últimos trinta anos,” diz o advogado especializado em direito do trabalho Aragones Vidal, membro do colectivo Ronda, especializado na defesa dos trabalhadores.

 

“Esta reforma está mais perto do modelo americano de despedimento livre (employment at will),  um modelo onde o Estado Providência  deve ser reduzido, porque nós não nos podemos permitir  assumir o custo”, argumenta o economista Rafael Pampillon, Professor na IE Business School..

 

Enfraquecer o papel dos sindicatos

 

Que diz a reforma? Em primeiro lugar, as indemnizações por despedimentos “injustificados” passam de 45 para 33 dias por ano trabalho com um máximo de 24 pagamentos mensais em vez de 42.

 

Mas, acima de tudo, os despedimentos por razões de ordem económica, indemnizados à razão de  20 dias por ano de  trabalho realizado  com um máximo de 12 mensalidades, são facilitados. Para o despedimento basta que a empresa justifique três trimestres consecutivos de diminuição das vendas, mesmo se tem sempre lucros, para assim poder despedir. 

 

Por outro lado, para poder efectuar despedimentos colectivos, a reforma suprime a exigência de autorização administrativa prévia, o que irá facilitar os encerramentos e enfraquecer o papel dos sindicatos nas negociações.

 

Finalmente, as empresas podem impor reduções unilaterais dos salários após dois trimestres de queda de vendas por razões de “competitividade, de produtividade ou de organização técnica do trabalho na empresa”. Se o empregado se recusa a aceitar no prazo de 15 dias, este  perderá o seu emprego.

 

Esta reforma seria ela indispensável?

 

O governo argumenta que o único direito de trabalhadores que é defensável é o de ter um emprego. Mas a qualquer preço? Sim, afirma Pampillon: “a forte inflação que a Espanha tem tido nestes últimos anos fez-nos perder competitividade.” As empresas devem reduzir os seus custos. Se ainda tivéssemos a peseta, seria suficiente a desvalorização mas, no quadro da zona euro, temos de fazer uma desvalorização a frio, através da redução dos salários. A reforma conduzirá a uma diminuições dos salários e, como primeiro passo, as empresas vão, sem dúvida, despedir para voltar a empregar mas agora a salários mais baixos.”


“Esta reforma não irá gerar mais empregos mas sim empobrecer os trabalhadores, corrige Aragones . O governo aproveitou-se de uma situação de crise para impor uma visão mercantilista que faz com que o empregado seja uma mercadoria de que pode dispor à sua vontade.”


Os sindicatos colocaram centenas de milhares de pessoas nas ruas em 19 de Fevereiro e ameaçam com uma greve geral se o governo não corrigir o tiro.


Sandrine Morel, La réforme du marché du travail en Espagne, Le Monde, Economie, 27 Fevereiro de 2012 

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