AINDA SOBRE O ARTIGO DE JOSÉ GOULÃO – por Carlos Leça da Veiga

Como costumamos fazer com os comentários extensos e de conteúdo mais interessante, publicamos autonomamente estas palavras de Carlos Leça da Veiga sobre o texto de José Goulão «A Teia».

 

Na verdade é muito acertado, nada académico nem, tão-pouco, retórico perguntar-se sobre como vão os caminhos da Democracia representativa e parlamentar. Quanto a mim, à pertinência da questão – refiro, apenas, o caso português – só pode e deve responder-se como, por exacto, anos atrás foi feito pelo Professor Vitorino Magalhães Godinho. Com efeito, a este ilustre Professor, como a mais nenhuma outra personalidade ou instituição – enfatize-se este aspecto – fica a dever-se a afirmação bem necessária, oportuna quanto baste e, também, dita num tom de total frontalidade que “a realidade portuguesa está a viver sem Democracia”. Não será por haver uma encenação razoavelmente montada que vai poder dizer-se que há uma Democracia e, também, não parece necessário invocar-se a situação lamentável que tem sido imposta ao Povo grego para, dalgum modo, se exemplificar uma antevisão dos riscos duma desagregação da Democracia.

 

Por infelicidade nacional tem havido muitos beneficiários do regime representativo e parlamentar que, sejam eles personalidades ou agrupamentos políticos, uns e outros, têm achado por bem serem intermediários constitucionalmente abusivos da vontade política da população e – recorde-se o discurso de Burke em 177 – permitirem alcandorar-se ao estatuto de representantes do Estado. A situação de exploração económica que sujeita milhões de portugueses a uma existência com dificuldades tremendas, de sacrifícios até à pouco insuspeitados e, sobretudo, com um futuro nacional pleno de incertezas tem sido, e é, para a generalidade – partidos políticos incluídos – a explicação mais apurada para a crise em curso cujos desenvolvimentos deletérios são premonitórios duma qualquer aventura autoritária, como por exemplo, dulcificada sob as vestes, já em gestação, do modelo democrático – diga-se autoritário – tipo Singapura.

 

Em meu entender – sem que ponha em causa a evidência criminosa da exploração económica, financeira, cultural e social da imensa maioria dos portugueses – os riscos indesejáveis para os caminhos da Democracia residem, no mais fundamental, no seu modelo constitucional, velho de séculos que, como nunca, afasta deliberadamente os Cidadãos dos seus direitos legítimos a uma intervenção política muito mais directa através dum organização constitucional capaz de satisfazer a realidade social dos dias de hoje e não, como tem acontecido, a responder monotonamente e sem utilidade palpável tal como foi engendrado, na Europa continental, nos finais do século XVIII. Com convém aos possidentes, tudo pode acontecer à margem dos interesses e da vontade política da população a quem cabe – a generosidade é grande – a tarefa de votar a espaços dilatados.

 

Se essa vontade da população tivesse tido a possibilidade de pronunciar-se dum modo muito mais efectivo teria sido possível o endividamento actual?

 

Não tivesse tudo sido feito ao arrepio do conhecimento popular e teria havido tantas facilidade para a banca ditar os seus interesses financeiros?

 

Teria sido possível que um qualquer governo fosse autorizado a comprometer a Independência nacional e a sua vontade Soberana?

 

Para mim só outra Constituição, outra Democracia e uma Terceira República.

 

Por que razão pela qual nunca foi perguntado expressamente aos portugueses se queriam fazer parte da chamada União Europeia; receavam algum dissabor?

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