Joaquim Magalhães dos Santos Um Artigo Muito Malcriado
(Adão Cruz)
Se, com os artigos que, até agora, aqui tive a sorte e a honra de ver aqui publicados, não dei grandes motivos para que os Companheiros de viagem e os Senhores Passageiros ficassem com muito má opinião nem desagradável impressão a meu respeito, com este de hoje… lá se vai tudo quanto Marta fiou…
Porque venho – veja-se só a desfaçatez, para não lhe chamar muito pior… – falar-lhes de putas e da sua prole.
Para dar um cheirinho de respeitabilidade (tarefa ciclópica!) ao desgraçado artigo, vou “começar” por lhes transcrever um soneto do muito respeitável poeta setubalense Manuel Maria Barbosa du Bocage: Ei-lo:
Não lamentes, oh Nise, o teu estado;
Puta tem sido muita gente boa;
Putíssimas fidalgas tem Lisboa,
Milhões de vezes putas têm reinado:
Dido foi puta, e puta dum soldado;
Cleópatra por puta alcança a coroa;
Tu, Lucrécia, com toda a tua proa,
O teu cono não passa por honrado;
Essa da Rússia imperatriz famosa,
Que inda há pouco morreu (diz a Gazeta),
Entre mil porras expirou vaidosa.
Todas no mundo dão a sua greta;
Não fiques, pois, oh Nise, duvidosa,
Que isto de virgo e honra é tudo peta.
Manuel Maria Barbosa du Bocage
Perdido por dez, perdido por mil… Já desci ao mais profundo dos dantescos círculos infernais, continuarei…
Recorrendo ao Google Translator (magnífica ferramenta, nem sempre absolutamente fiável…), procurei a tradução da portuguesa e delicada prostituta.
Em cerca de cinquenta idiomas em que procedi ao melindroso inquérito, na maioria foi facilmente identificável a “nossa” palavra. Deve ser cultismo, palavra erudita originária do Latim. Mas curioso é que, nessa Língua, prostituta é meretrix, em que facilmente reconhecemos a muito nossa meretriz. Em Grego deparei com a tão conhecida πόρνη, pórne. Chamo-lhe “bem conhecida” porque está presente em pornografia… Não pensem pior de mim, já basta a péssima opinião gerada em quem me acompanhou até aqui.
Bem mais nossa – se bem que não exclusiva – é puta. Também é encontrável (fugi de dizer que “também a encontramos”, não fosse haver quem, maldosamente, supusesse que a procurávamos…) em Galego e em Basco. O Francês – chienne -, o Espanhol – perra -, o Italiano – cagna -, o Latim – canis – , o Inglês – bitch -, recorrem à Zoologia, mais propriamente à Cinologia (criei agora mesmo a palavra… e até já vem registada no Houaiss…) para designarem as trabalhadoras do Sexo.
(Na coluna do Inglês, generosamente, dão uma coluna com vinte e uma palavras, que faculto alfabetadas e tudo: bitch, call-girl, courtesan, courtesan, drab, raggle-tail, harlot, harridan, hooker, moll, mort, prostitute, punk, streetwalker, strumpet, traipse, trull, unfortunate, walker, wench, whore)
Mas – perguntar-se-ão, incrédulos e abismados, os Leitores que se aguentaram até aqui –“ que é que lhe deu a este estapor pra vir com um assunto e um paleio destes?”
Acontece é que ando a deparar com uma grave injustiça e quero fazer o pouco que esteja ao meu alcance para a minimizar, se não até para a varrer da face do Mundo!
Com a vigorosa “evolução” (sejamos gente do nosso tempo!) dos valores e dos princípios a que estamos a assistir (se não até a contribuir para ela), as prostitutas são hoje uma classe e exercem uma profissão cada vez mais prestigiada e considerada.
(No Dicionário de Sinónimos da Porto Editora encontro onze sinónimos, no do Houaiss vinte e cinco. De nenhuma dessas listas consta a palavra mais curta, de quatro letras. Poderá essa exclusão revelar muita pudicícia, mas revela também ausência de critério científico…).
Já estão sindicalizadas, já reclamam e alcançam um lugar de respeito na Sociedade, e no jet-set são figuras imprescindíveis. Festa, “meeting” sem elas (na maior percentagem) nem é festa nem é “meeting” nem é sardinhada nem febrada nem é…nada!
O meu colega setubalense – acima citado, para dar respeitabilidade e crédito a este meu modesto artigo – já no seu tempo, fins do século XVIII, ai! Como o tempo voa e deixa tudo na mesma! – já disse (se não todas as posições nem posturas – isso está escrito no Kama Sutra… ) todos os altos postos a que essas dignas funcionárias ascenderam.
Por isso é que – é agora que isto vai aquecer… – me junto ao indignado clamor que as Excelentíssimas Senhoras Putas elevam quando ouvem ou leem, a respeito de algum bandalho da vida pública, principalmente da vida político-partidária, que ele (Ou ela! OU ELA!) se prostituiu ou que prostituiu a sua função!…
Qual o quê! As senhoras meretrizes elevam o seu múnus sacerdotal ao nível de uma missão sagrada, de elevado interesse público, nacional.
Os cães – Vou, vamos deixar de empregar cães como insulto a essa corja! Ofendemos os cães, os melhores amigos da gente – que nos governam-lixam não se prostituem! Prostituir-se é palavra digna, meritória, respeitável, quando refere a profissão abnegadamente exercida pelas tão impropriamente chamadas mulheres da má vida! A cáfila não se prostitui! Avilta-se (sem esforço, porque vil já ela é!), acanalha-se (sem esforço, porque canalha já ela é!), corrompe-se (sem esforço, porque corrupta já ela é!), degrada-se (sem esforço, porque degradada já ela está!)
Respeitemos o putedo, não o misturemos com essa caterva de malfeitores, com essa sarna maligna e parasitária!
E mais! (Vou atingir o objetivo fulcral dessa minha comunicação às massas!)
Deixemos de chamar filhos da puta a esses biltres, a esses crápulas! As senhoras rameiras não merecem ser assim insultadas! Os seus filhos não merecem a pesada carga negativa inerente a essa expressão! Eles não são merecedores de que se chame filhos da puta àqueles a quem chamamos filhos da puta!
Da mesma maneira que é preciso criar uma palavra nova para exprimir a nossa gratidão, porque, se dizemos “Obrigado!” ou “Muito obrigado!” a quem nos abre a porta ou nos deixa passar, não fica bem, fica mal, cheira a insuficiente, é ridículo repetirmos “Obrigado!” ou “Muito obrigado!” ou “Bem haja!” ou “T’agradecido” a quem nos salva a vida ou a de um Filho nosso, ou a quem nos deixa vinte milhões de contos…
… da mesma maneira, também, não podemos nem devemos – sobretudo não devemos! – empregar erradamente o nome filho(s) da puta ao referirmo-nos a qualquer desses nojos, ou a eles todos, globalmente!
Reúnam-se prémios, coisas valiosas para presentear quem inventar, criar uma palavra nova para designar esses biltres, esses calhordas, esses crápulas, infames, ordinários, patifes, pulhas, sem-vergonhas, velhacos! (Não se espantem com a variedade do meu vocabulário: copiei de um dicionário de sinónimos… Até vem por ordem alfabética e tudo)
Essa récua deixa de merecer o nome de filhos da puta! Nada de honrarias para esses safardanas!
Esses filhos da puta, além de não merecerem o pão que comem, não merecem o dignificado apodo de filhos da puta!
Puta que os pariu!
Sem tirar nem pôr. Um mimo