EM COMBATE – 75 – por José Brandão

MICULA

Micula, nome mítico de uma região na zona dos Dembos, presumo que para Norte de Quipedro. Digo presumo porque na operação que ali fizemos fomos helitranportados e, nestas condições, perdemos um pouco a noção da localização geográfica. E como também já passaram uns anos, as recordações já são um pouco mais ténues… Mítico porque se tratava de uma região onde se encontravam inúmeros acampamentos de população não controlada e bastantes guerrilheiros que se sabia estarem bem armados.

 

Os Pumas chegaram ao Quixico pela madrugada. A Operação seria levada a cabo pelos 4 Grupos de Combate da CCaç 3482, sendo que se constituiriam dois grupos, um formado pelo 1º e 3º Grupos e o outro pelo 2º e pelo 4º que actuariam em zonas próximas, mas separadamente.

Era a primeira operação que fazíamos transportados por helicóptero e não tínhamos sido devidamente avisados das precauções a tomar. Estávamos, por isso, na pista do Quixico quando os Puma chegaram. Para além do barulho que faziam levantaram uma poeira enorme que fez com que a maioria das G3 ficassem inoperacionais…lição para futuras operações semelhantes, ou deveríamos aguardar mais afastados da pista ou deveríamos proteger as armas do pó…resultado: quando chegamos ao local da operação, o primeiro cuidado foi desmontar e limpar as G3.

 

As instruções eram claras…, assim que chegássemos ao local, deveríamos montar emboscadas em lugares pré-estabelecidos. A aviação faria o resto.

 

Lembro-me que quando saltei do Puma, a cerca de um ou dois metros de altura, as alças do saco de combate rebentaram. Foi uma preocupação adicional. Levávamos mantimentos para vários dias e o saco era bastante pesado. Lá consegui arrastá-lo para uma zona protegida e lá improvisei uma solução que terá passado por atar as alças e dessa forma conseguir transportar o saco às costas mais ou menos facilmente.

 

Guardo ainda hoje na minha memória o barulho dos disparos do helicanhão, em voos rasantes sobre as copas das árvores, disparando de forma potente e cadenciada as balas de estilhaços. Era assustador mesmo para nós, que sabíamos não ser os visados.

A técnica nestas situações, era a de haver uma aeronave que voando mais alto, dava instruções ao helicanhão sobre a localização dos “alvos”.

 

Vou contar uma cena que reflecte o pavor que essas populações tinham da nossa aviação: No Quixico tínhamos recuperados que rapidamente se integraram no seio dos militares. Um dia, enquanto jogávamos futebol, de cujas equipas os recuperados faziam parte de forma entusiástica, quase como se jogar futebol fosse a melhor coisa do mundo, fomos sobrevoados penso que por uma DO. Os recuperados em causa, largaram o jogo e foram refugiar-se debaixo das escadas que levavam à messe de Sargentos e só de lá saíram quando tiveram a certeza de que já não estavam no mato e que não havia perigo…

 

De entre os resultados da operação refiro a recuperação de um casal de idosos, cujo aspecto andrajoso, revelando as dificuldades com que viviam e cuja fotografia hei-de publicar um dia quando a encontrar. Tiveram uma sorte danada, já que as rajadas disparadas pelo Lourenço quando deu com eles “de caras” e por certo tão assustado quanto eles, quase que cortaram cerce o caule de uma palmeira próxima, mas deixaram ileso o dito casal, que, foi depois também transportado por heli para Nambuangongo para ser interrogado.

 

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