Subscrevi o Manifesto do Movimento Sem Emprego.

(continuação)

Selecção e tradução por Júlio Marques Mota

A  ESPANHA e as falências bancárias. Os indignados levam à justiça os financeiros e os políticos.

Nathalie Pédestarres

 

Este é talvez um ponto de viragem na batalha que opõe os cidadãos atingidos pelos planos de austeridade aos responsáveis pelas falências bancárias, salvos pelos  dinheiros  públicos e com  toda a  impunidade. Em Espanha, uma plataforma que reúne advogados, juristas e jornalistas está empenhada na missão de investigar sobre as responsabilidades dos políticos e dos banqueiros na crise financeira actual. Uma primeira acção legal deverá ser lançada contra o antigo Director-geral e Presidente do Bankia, com o apoio de milhares de cidadãos.

A sua intenção é clara: colocar atrás das grades, todas as pessoas que, no Conselho de directores do Bankia, sejam presumidos culpados da falência do quarto maior banco espanhol. Eles são advogados, juristas ou jornalistas e estão a trabalhar intensamente no processo  Bankia fora do seu horário de trabalho, como voluntários. Para além da  informação pública disponível, eles trabalham também sobre  os dados confidenciais que lhes transmitem do interior os seus accionistas e os empregados do banco. Essa é a missão da segurança pública que a que se fixou uma nova plataforma de cidadania ligada  ao movimento dos Indignados, “15MpaRato” [1], que inclui 120 pessoas.

 

Bankia, é o conglomerado bancário que foi recentemente nacionalizado, e cuja falência ameaça o frágil equilíbrio financeiro espanhol. Bankia foi constituído em Junho de 2010 sob a égide do partido popular (a direita  espanhola), juntando  vários bancos em dificuldade. Dois anos mais tarde, todo o edifício bascula. No espaço de três meses, Bankia, que declarava ter ganho 309 milhões de euros de lucros líquidos em 2011, encontra-se com perdas de 3,30 mil milhões de euros! Um precipício financeiro escondido a quando da apresentação das contas à Comissão Nacional do Mercado de Valores (CNMV), sem o obrigatório relatório de auditoria…

Ajuda pública e pára-quedas dourado

 

Esta mentira, abriu a caixa de Pandora, forçando o seu Presidente, Rodrigo Rato, a demitir-se em 7 de Maio. Rodrigo Rato é o antigo Director-geral do FMI (de 2004 a 2007) e foi ministro da economia e também o braço direito de José María Aznar, durante o anterior governo de direita (1996-2004). Desde aí passou pelo banco Lazard e pelo Banco Santander, o mais poderoso banco espanhol (falou-se em oligarquia?).

 

“Queremos que o Rodrigo Rato  vá para a prisão e que os seus bens sejam  apreendidos para refinanciar a dívida do Bankia!” acena  um dos membros da plataforma 15MpaRato, que quer  permanecer anónimo [2]. São necessárias 23,50 mil milhões de euros em ajudas públicas para socorrer o  Bankia. Mas nada disto impede o seu antigo Presidente-Director de aceitar um pára-quedas dourado de 1,20 milhões de euros! A decisão de atribuição dessa compensação está actualmente entre as mãos da Comissão de nomeações e remunerações  do banco. A Espanha não está, contudo, perante o  seu primeiro caso de falência bancária seguida por um resgate com o dinheiro dos contribuintes [3]. Mas, desta vez, “é um caso demasiado flagrante de fraude,” insurge-se um dos membros da equipe da plataforma.

 

Pressão bem sucedida

 

Se os membros do 15MpaRato estão a trabalhar de forma totalmente voluntária, impulsionados pela sua “responsabilidade cívica”, diz um dos advogados voluntários, os processos administrativos e judiciais têm um custo… A plataforma estimou o custo em cerca de 100.000 euros para a primeira fase da sua acção: apresentar um aqueixa junto da Audiência Nacional, o mais alto tribunal espanhol, e preparar e elaborar as acusações [4].

A plataforma entretanto lançou uma iniciativa de “crowdfunding” em 6 de Junho. O seu sucesso foi imediato. Em menos de 24 horas, foram recebidos mais de 19.000 euros. Cerca de 50 accionistas do Bankia  dizem que eles estão prontos para testemunhar e mais de uma dúzia de testemunhos internos  espontaneamente oferecem a  sua ajuda aos investigadores anónimos. Cerca de 11 000 cidadãos declaram juntar-se à queixa contra Bankia. Esta reacção de cidadania levantou um enorme barulho… O ministério espanhol da Justiça acabou por reconhecer as suspeitas de delito e anunciou a abertura de um inquérito preliminar sobre Bankia. Em causa, a sua criação e a sua entrada na bolsa em Julho de 2011.

 

Os políticos estão incluidos. A deputada Rosa Díez – Unión Progreso y Democracia (UPyD) – anunciou que o seu partido também vai apresentar uma queixa contra o Bankia. Desde 29 de Maio, o UPyD e a Esquerda Unida (Izquierda Unida, em que se junta a esquerda radical) exigem  uma Comissão Parlamentar de inquérito sobre o Bankia, o que recusaram os dois principais partidos, o partido popular, no poder, e o Partido Socialista espanhol (PSOE).

Quadro de caça para a cidadania

 

Os dois partidos que têm alternado no poder em Espanha provavelmente temem um retorno do bastão. “Não vamos parar só no Conselho de Administração do  Bankia,”, avisa  um dos advogados. Nós também vamos investigar a responsabilidade criminal de certos funcionários do banco de Espanha, de Deloitte [empresa de auditoria responsável das contas do Bankia], da Comissão Nacional do mercado de valores… É um processo muito longo que vai durar por muitos anos.»

 

A plataforma anuncia os seus objectivos como um quadro de pesquisa, que é também o de apanhar culpados  como : Rodrigo Rato, Mariano Rajoy (actual chefe do governo espanhol) José Luis Zapatero, antigo primeiro-ministro  e Carmen Chacon , ministra da Habitação  em 2007, estes últimos ambos do PSOE), José María Aznar (antigo chefe de governo do partido do povo)… Para isso, dizem-nos,  pretende a Plataforma  “acabar com a impunidade e os privilégios daqueles que  são indecentemente ricos, os banqueiros  e os políticos.

 

“O que nós queremos é que a nossa acção, ao mesmo tempo que preserva o seu anonimato, tenha um” efeito bola de neve”, que a sociedade civil colabore e nos ajude.” “E especialmente, que ganhe a consciência  de que com a lei e a Constituição   na mão, ela venha a ter  a força para lutar contra os abusos de poder”, precisou, um advogado. Fim da partida  para a oligarquia?

 

Nathalie Pédestarres

 

Notas

 

[1] Da conjugação entre o nome do movimento  des Indignados, 15M, e o nome  de Rodrigo Rato, ex-PDG de Bankia. Ver o seu site.

 

[2] Todos os membros e juristas da plataforma desejam de momento manter o anonimato.

 

[3] Em Abril de 2011, o Fundo espanhol de reestruturação bancária  tinha já injectado  2,8 milhões de euros para salvar a Caja del Mediterráneo,.

[4] O detalhe das despesas previstas  pela 15MpaRato é  explicado no blog.

 

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