por Rui Oliveira
Também nesta Quarta-feira 27 de Fevereiro apenas três eventos cremos justificarem um realce particular.
Quem se deslocar à noite ao Centro Cultural de Belém tem a oportunidade incomum de poder optar entre dois espectáculos, qualquer deles marcado por uma matriz popular.
No Grande Auditório, às 21h, actua Diego el Cigala, considerado um gigante na arte singular do flamenco.
Nascido em Madrid, numa família cigana de músicos e intelectuais, muito cedo Diego el Cigala se iniciou nas peñas e tablaos de flamenco. Aos 12 anos já ganhava prémios, e a sua incrível capacidade rítmica chamou a atenção de “bailadores” como Carmen e Joaquín Cortés, que o levaram em digressões internacionais.
Desde o aclamado Undebel (1998), “El Cigala” encanta o mundo do flamenco, graças a trabalhos como Lágrimas Negras, com o pianista cubano Bebo Valdés, disco que lhe valeu um dos seus dois Grammys. Colaborou com mestres como o guitarrista Vicente Amigo, entre muitos outros que não dispensam o seu canto aprimorado e pleno de alma, merecedor do título de herdeiro do grande Camaron de La Isla.
Mostramos-lhe um registo daquela premiada colaboração com Bebo Valdès em “Lágrimas Negras” :
Quem queira continuar a ouvi-lo, numa gravação mais recente da apresentação na Argentina do seu álbum Tango, tem aqui o tema “Dos Gardenias para Ti” : http://youtu.be/-leq4PKUea0 ou poderá escutar uma longa sequência de 40 temas (agradecendo ao YouTube) começando em “Te extraño” aqui : http://www.youtube.com/watch?v=q-kN9kn59AQ&feature=share&list=AL94UKMTqg-9Be5jfYX9HF9ysyjZhVnUkb
No mesmo CCB mas no Pequeno Auditório, também às 21h desta Quarta-feira 27 de Fevereiro, há um espectáculo intitulado “Cante Piano – uma música contemporânea do Alentejo”, resultante dum projecto construído a partir de uma ideia do antropólogo Prof. José Rodrigues dos Santos, investigador do cante alentejano.
Nele duas vozes de cantadores do Grupo Cantares de Évora, o ponto e o alto, são envolvidas por harmonias e timbres de fusão do piano – a “terceira voz”, qual berço original de vozes ancestrais. São intérpretes, nesta noite, Amílcar Vasques-Dias ao piano com Mestre Joaquim Soares ponto e Pedro Calado alto.
[ Saiba-se que o cante alentejano – um modo de cantar – é originalmente música vocal a uma ou duas vozes, sem acompanhamento instrumental. Os seus intérpretes adoptam uma relação do tempo musical com a ornamentação da palavra − melodia, tendo em vista a expressividade que procura a emoção.]
No programa desta noite cantar-se-ão :
Ao romper da bela aurora
Tenho no quintal um limoeiro
Se não chover primeiro (piano solo)
Meu lírio roxo do campo
Ó águia que vais tão alta
O almocreve
Ceifeira, linda ceifeira
Alentejo, terra sagrada do pão
Este é o registo dum espectáculo semelhante onde o tema “Tenho no quintal um limoeiro …” (muito interessante) foi cantado pelo “Cante Piano” onde o Prof. José Rodrigues dos Santos actuou como alto (no lugar de Pedro Calado) no Teatro Garcia de Resende (Évora) em Dezembro de 2011 :
Para ouvir o “Ó águia…” clicar aqui http://youtu.be/BmVG_MUxFf0 e para o “Meu lírio roxo …” em http://youtu.be/lx220PgtmxQ .
Aos amadores de outro tipo de música étnica (poderemos chamá-la assim) como o jazz, aconselhamos irem às 21h30 desta Quarta-feira 27 de Fevereiro ao Pequeno Auditório da Culturgest onde, no ciclo “Isto é Jazz?” , se apresentam os “Ballister” que reunem Dave Rempis saxofones alto e tenor, Fred Lonberg-Holm violoncelo e Paal Nilssen-Love bateria.
Diz o comissário do ciclo Pedro Costa : «… este grupo sediado em Chicago (Nilssen-Love pode ser norueguês, mas é um cúmplice da cena local da Windy City) adopta por inteiro a sua energia e ao fazê-lo adapta a configuração guitarra-baixo-bateria para a realidade do jazz.
À frente está não um guitarrista, mas Dave Rempis e os seus saxofones, alguém que, não por coincidência, é um dos programadores de um dos mais importantes eventos do rock indie, o “Pitchfork Music Festival”. As funções da guitarra e do baixo estão a cargo do violoncelista Fred Lonberg-Holm, e se bem que este seja o único a recorrer à electricidade, o que faz com a dita chega e sobeja para as ilações roqueiras. A bateria está, por sua vez, entregue a um homem, Paal Nilssen-Love, para quem free jazz e free rock não são, propriamente, abordagens distintas, como temos ouvido na principal banda de que faz parte, The Thing.
A formação instrumental dos Ballister é também herdeira dos trios de hard bop inaugurados por Sonny Rollins, apenas com a substituição do contrabaixo … Com tal “bagagem”, a música destes Ballister só podia ser o que é : livre, barulhenta e agressiva, com rítmicas desestruturadas, mas invasivas, e surpreendentes interjeições melódicas irrompendo pelo magma sonoro quando nada o faria supor. Uma música muito física, mas com um “sentido de descoberta” (expressão utilizada pela revista “Downbeat” a propósito do álbum Mechanisms) que revela todo um posicionamento intelectual – o de abrir caminho sem nada renegar do passado. Por isso mesmo, esta é a new school do jazz que continua orgulhosamente a old school ».
Eis como soa a tal música “livre, barulhenta e agressiva” tocada pelo Ballister Trio no clube The Tranzac em Toronto em Abril de 2012 :
Por último, por uma vez, chamaríamos a atenção no campo da música dita erudita para o Concerto Antena 2 (com a habitual transmissão em directo) que terá lugar, às 19h desta Quarta-feira 27 de Fevereiro, na Sala dos Espelhos do Palácio Foz (aos Restauradores) com entrada livre.
Será um Recital de Canto e Piano onde a soprano Ana Barros acompanhada pela pianista brasileira Christina Margotto com quem (e com o pianista Bruno Belthoise) conceberam o recital “A Canção de Amor” a cujo programa pertencem as peças a executar nesta tarde.
Explicam as artistas que «… partindo de abordagens musicais sobre um mesmo tema − o Amor, separadas por décadas e realizadas por compositores que viveram experiências distintas, este programa foi estruturado pretendendo realçar os aspectos nostálgicos presentes nas obras, conjugando compositores e poetas de épocas distintas da lusofonia inspirados pelo mesmo sentimento. A nostalgia e a melancolia… »
Serão então cantadas de :
António Pinho Vargas Nove Canções de António Ramos Rosa : 1. Não tenho lágrimas, 2. Não era um barco, 3. Ligado a uma sombra, 4. Um tremor de proa, 5. Tateio sobre o branco, 6. Como quem levanta, 7. a) Onde a força do vento…, b) Porque esse arvoredo…, c) Um gesto que procura, 8. É por aqui, mas o caminho é trémulo e 9. O que escrevo por vezes.
Fernando Valente Olha para mim, amor! (extr. do poema Súplica, de Florbela Espanca), Se tu viesses… (de Florbela Espanca) (estreias) e Os versos que te fiz.
Heitor Villa-Lobos Modinha (Seresta nº 5), Canção de Amor, Melodia Sentimental e Nesta Rua (tem um bosque).
Cláudio Santoro Canções de Amor, Ouve o Silêncio, Acalanto da Rosa, Bem pior que a morte, Balada da flor da terra, Amor que partiu, Jardim noturno, Pregão da saudade, Alma Perdida, Em Algum lugar e A mais dolorosa das histórias.
Este recital não foi ainda gravado. Ouça-se, em alternativa, a voz de Ana Barros (acompanhada por Isabel Sá) no tema “Uma Estrela” do compositor português Vianna da Motta :
Um registo mais longo desta dupla (Ana Barros voz e Isabel Sá piano) em temas do compositor cubano Xavier Montsalvatge está em http://youtu.be/Jk5Vf2En0rw
Quanto ao programa, o tema Melodia Sentimental de Villa-Lobos já foi tocado ao piano por Christina Margotto como se pode ouvir aqui em que o canto pertence à cantora galega Uxia : http://youtu.be/NQm1RLKR144
(para as razões desta nova forma de Agenda ler aqui ; consultar a agenda de Segunda aqui )
1 Comment