ESTE GOVERNO TRATA OS TRABALHADORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DE UMA FORMA DESIGUAL

TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA QUE ACEITAREM EM SETEMBRO /2013 A RESCISÃO DO CONTRATO NÃO TERÃO DIREITO NEM A APOSENTAÇÃO ANTECIPADA NEM AO SUBSIDIO DE DESEMPREGO: o tratamento desigual dos funcionários públicos 

Com o objetivo levar um elevado número de trabalhadores da Administração Pública a pedir a rescisão do contrato de trabalho, o governo PSD/CDS publicou a Portaria 221-A/2013, que estabelece uma indemnização entre 1 e 1,5 meses de remuneração por cada ano de serviço aos que aceitarem o despedimento. E para que não tenham tempo para avaliar com serenidade as consequências de tal decisão que lhes vai afetar toda a sua vida futura dá-lhes apenas um prazo de 30 dias (mês de Setembro) para tomar tal decisão.

Para que a pressão sobre os trabalhadores seja maior, ao mesmo tempo entregou aos sindicatos da Função Pública um “Anteprojeto da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas”, para negociação, que contém valores de indemnização por despedimento muito mais baixos. Portanto, o objetivo é colocar os trabalhadores entre a espada e a parede: ou requerem imediatamente a rescisão do contrato do trabalho, ou então arriscam-se a ser despedidos no futuro recebendo uma indemnização muito menor. Por trás desta manobra esta também uma outra que não é menos grave, que é o desmantelamento do Estado, para que as funções sociais, ou seja, a educação, a saúde a segurança social públicas tenham uma importância mínima, pois estes serviços fundamentais para todos os portugueses não funcionam sem trabalhadores. Portanto, neste momento muito difícil para todos os trabalhadores da Função Pública, em que os seus direitos estão a ser fortemente atacados é necessário que, antes de tomar qualquer decisão que vai afetar profundamente a sua vida,  façam uma reflexão muito fria, racional e informada. Este estudo tem como objetivo ajudá-los a fazer isso fornecendo  a cada trabalhador da Função Pública um conjunto de informações que são, a nosso ver, essenciais para que ele possa tomar uma decisão, que só compete a cada um tomar, de uma forma fundamentada e informada. Por isso é importante que o leiam até ao fim pois ele contém, repito, informações que são importantes para tomar uma decisão informada e fundamentada.

O QUE DIZ A PORTARIA QUE O GOVERNO ACABOU DE PUBLICAR?

Segundo a Portaria 221-A/2013 publicada este mês pelo governo, os trabalhadores da administração direta e indireta do Estado, pois só abrange estes, que requeiram, “por escrito a cessação do seu contrato de trabalho, entre 1 de Setembro de 2013 e 30 de Setembro de 2013” (artº 8º da Portaria) terão direito a receber, seguindo o artº 3º, a seguinte indemnização: “(a) Caso o trabalhador tenha idade inferior a 50 anos, 1,5 meses de remuneração base e suplementos remuneratórios de caráter permanente, por cada ano de serviço; (b) Caso o trabalhador tenha idade compreendida entre os 50 e 54 anos, 1,25 meses de remuneração e suplementos remuneratórios de caráter permanente por cada ano de serviço; (c) Caso o trabalhador tenha idade compreendida entre os 55 e 59 anos, 1 mês de remuneração e suplementos remuneratórios de caráter permanente por cada ano de serviço”. E segundo o artº 2º da mesma portaria, este programa de rescisões por mutuo acordo só abrange os trabalhadores das carreiras gerais de assistente técnico e de assistente operacional (portanto, não inclui os técnicos superiores nem os das carreiras especiais) e mais algumas categorias residuais ainda existentes que estão em anexo à Portaria (adjuntos, ajudantes, capatazes, agentes, delegados, encarregados, chefes de armazém, etc.) e “que se encontrem pelo menos a cinco anos de atingir o limite de idade legal para aposentação que em cada caso lhe seja aplicável”, portanto têm de estar a cinco ou mais anos da idade legal de aposentação.

DIFERENTEMENTE DO SETOR PRIVADO, OS TRABALHADORES DA FUNÇÃO PÚBLICA QUE ACEITEM O DESPEDIMENTO NÃO TERÃO DIREITO NEM A SUBSIDIO DE DESEMPREGO NEM A APOSENTAÇÃO ANTECIPADA 

De acordo com a resposta do Secretário de Estado da Administração Pública dada a uma pergunta que fizemos, os trabalhadores que requererem a rescisão do seu contrato não terão direito a receber subsídio de desemprego, portanto terão um tratamento diferente do que sucede no setor privado.

E isto porque segundo o artº 10º do Decreto-Lei 220/2006, que é a chamada lei do subsídio de desemprego do setor privado, os trabalhadores que tenham ficado sem emprego devido a “cessações do contrato de trabalho por acordo” têm direito a subsidio de desemprego:“(a) Nas empresas que empreguem até 250 trabalhadores até 25% do quadro de pessoal em cada triénio; (b) Nas empresas que empreguem mais de 250 trabalhadores até 20% com um limite de 80 trabalhadores em cada triénio”. E o artº 5º do Decreto-Lei 13/2013, publicado por este governo já este ano, veio alargar ainda mais o âmbito desta disposição ao introduzir um novo artigo no Decreto-Lei 220/2006 – o artº 10º/A – que estabeleceu “ para além das situações referidas anteriormente em que o trabalhador tem direito a receber o subsidio de desemprego mesmo rescindido o contrato de trabalho por mutuo acordo, também em relação às “situações de cessação de contrato de trabalho que visem o reforço da qualificação e da capacidade técnica das empresas” por mutuo acordo, os trabalhadores têm também direito ao subsidio de desemprego. Fica assim claro, que os trabalhadores da Função Pública que sejam compelidos rescindir o seu contrato de trabalho são objeto de um tratamento desigual por parte deste governo em clara violação do artº 13º da Constituição da República. Mas não é apenas neste aspeto que os trabalhadores da Administração Pública que perdem o seu emprego sofrem um tratamento desigual.

Embora as reformas antecipadas estejam congeladas na Segurança Social (o que não acontece na CGA em relação às aposentações), segundo o artº 57º do Decreto-Lei 220/2006, no caso de desemprego de longa duração (mais de um ano), e após ter terminado o subsídio de desemprego, o trabalhador desempregado pode pedir a reforma antecipada nas seguintes condições: “(a) A idade da pensão de velhice é antecipada para os 62 anos aos beneficiários que tenham 15 anos de descontos para a Segurança Social  e, à data do desemprego, tenham idade igual ou superior aos 57 anos (se tiverem menos de 62 anos, a penalização é calculada em relação a esta idade e não relativamente aos 65 nos); (b) A idade de acesso a pensão de velhice é ainda antecipada para os 57 anos aos beneficiários que, à data do desemprego, tenham, cumulativamente, 52 anos de idade e, pelo menos, 22 anos de descontos para a Segurança Social”. Portanto, os trabalhadores do setor privado atingidos pelo desemprego de longa duração, e após se ter esgotado o subsídio de desemprego podem pedir a reforma antecipada desde que, à data do desemprego, tenham 57 anos de idade e 15 anos de descontos para a Segurança Social, ou 52 anos de idade e 22 anos de descontos para a Segurança Social.

Na Administração Pública, de acordo com o Estatuto da Aposentação, um ex-subscritor (e são ex-subscritores todos aqueles que requererem a rescisão do seu contrato ou forem despedidos), só poderão pedir a pensão de aposentação aos 65 anos. Na reunião entre a Frente Comum dos Sindicatos da Função Pública e o Secretário de Estado da Administração Pública em 9.7.2013, este tratamento desigual foi colocado ao Secretário de Estado que confirmou que, enquanto o Estatuto da Aposentação não for alterado, os ex-subscritores só podem pedir a pensão aos 65 anos. Por outro lado, segundo a CGA, não  são beneficiados mesmo que tenham carreiras contributivas longas (não têm direito à dedução de um ano na idade legal de aposentação por cada 3 anos completos de contribuições para além dos 30 que tiverem aos 55 anos de idade, enquanto no setor privado continua a existir bonificações para carreiras longas para os desempregados de longa duração).. O Secretário de Estado tomou o compromisso de pensar sobre o assunto. Esperemos que nas próximas reuniões com os sindicatos esta questão seja esclarecida, e os trabalhadores serão logo informados.

AS INDEMNIZAÇÕES POR DESPEDIMENTO DO ANTEPROJETO DE LEI ENTREGUE PELO GOVERNO AOS SINDICATOS SÃO MUITO INFERIORES ÀS DO SETOR PRIVADO

O Anteprojeto de Lei entregue pelo governo aos sindicatos contém duas disposições (artº 295º e artº 331º) sobre indemnizações com valores diferentes, mas ambos muito inferiores aos valores atuais de indemnização do Código do Trabalho para o setor privado.

Assim, segundo o nº do artº 295º do Anteprojeto de Lei do governo, “a compensação a atribuir no âmbito de acordo de cessação do vinculo do trabalho (no caso em que o trabalhador aceita voluntariamente o despedimento) corresponde, no máximo, a 20 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade … e o montante global de compensação não pode ser superior a 100 vezes a retribuição mínima mensal garantida (ou seja, 48.500 €), nem pode ser superior ao montante da remuneração base a auferir pelo trabalhador até à idade legal de reforma ou aposentação” . E segundo o artº 311º do mesmo Anteprojeto de Lei do governo, “ a cessação do contrato de trabalho em funções públicas (por ex., despedimento após um ano na situação de requalificação) confere ao trabalhador o direito a uma compensação correspondente a 20 dias de remuneração base por cada ano completo de antiguidade … e o montante global da compensação não pode ser superior a 12 vezes a remuneração base mensal do trabalhador”. Portanto, qualquer um destes valores de indemnização é muito inferior ao que atualmente tem direito um trabalhador do setor privado como vamos mostrar.

Segundo o artº 6º da Lei 23/2012, de 25 de junho de 2012, portanto já do governo PSD/CDS que alterou pela 3ª vez o Código do Trabalho do setor privado, relativamente a contratos celebrados antes de 1 de Novembro de 2011, a indemnização por despedimento por iniciativa da entidade empregadora é calculada da seguinte forma:”(a) Em relação ao período de duração do contrato até 31 de Outubro de 2012, o montante da compensação corresponde a um mês de retribuição por cada ano completo de antiguidade; (b) Em relação ao período de duração do contrato a partir de da data referida na alínea anterior, o montante da compensação … corresponde a 20 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de antiguidade e não pode ser superior a 240 vezes a retribuição mínima mensal garantida” (a referente ao período posterior a 31.10.2012).

Para que o leitor possa ficar com uma ideia da desigualdade de tratamento entre os trabalhadores da Administração Pública e do setor privado vamos imaginar uma situação – dois trabalhadores, com o mesmo salario (1.500€/mês) com 35 anos de serviço no fim de 2013, sendo um da Função Pública e outro do setor privado que foram despedidos – e vamos calcular as indemnizações a que têm direito. No caso de um trabalhador da Função Pública que requeira a cessação do seu contrato, a indemnização que teria direito, de acordo com o artº 295º do Anteprojeto, seria 35.000€. Se ele fosse colocado na situação de requalificação e despedido ao fim de um ano, a indemnização que receberia, segundo o artº 311º, seria apenas de 18.00€, pois não poderá ser superior a 12 vezes a remuneração base mensal do trabalhador. Um trabalhador do setor privado com a mesma antiguidade e remuneração o valor da indemnização que receberia já seria de 52.500€.

Confrontado durante a reunião com este tratamento desigual dos funcionários públicos, o SE da Administração Pública respondeu que, em relação à cessação do contrato que não fosse da iniciativa do trabalhador (ex. despedimento ao fim de um ano na situação de requalificação), a indemnização seria calculada da mesma forma que é no setor privado, ou seja, um mês de remuneração por cada ano de serviço feito pelo trabalhador até 31.10.2012, e 20 dias de remuneração por cada ano de antiguidade para o período posterior a Outubro de 2012. E para além da indemnização, o trabalhador tem direito ainda ao subsidio de desemprego o que não acontece aos trabalhadores que peçam em Setembro a cessação do contrato. Esperamos que o Secretario Estado respeite a palavra dada, e que apresente uma nova proposta de indemnizações igual aos do setor privado nas reuniões futuras com os sindicatos que, logo que aconteça, os trabalhadores serão informados.

A AUSÊNCIA DE QUALQUER ESFORÇO DESTE GOVERNO PARA AUMENTAR AS COMPETÊNCIAS PROFISSIONAIS DOS TRABALHADORES PARA OUTRAS FUNÇÕES

Uma outra matéria debatida na reunião com o SE da Administração Pública foi o “sistema de requalificação”, cuja designação mais adequada seria chamar “sistema de despedimento sumário”. Durante a reunião ficou claro que o objetivo do governo não é requalificar mas sim despedir. A provar estão os artº 245º , 255º e 258º do Anteprojeto de Lei. Segundo o nº2 do artº 245, para além dos motivos que já constavam do Decreto-Lei 200/2006 para extinguir e fundir serviços públicos, o governo criou um outro – redução do orçamente do serviço resultante da diminuição das transferências do O.E. – para colocar trabalhadores na “situação de requalificação”. É o arbítrio total pois o governo pode fazer como quiser e quando quiser. Não tem de apresentar as razões dessa redução. Depois, segundo o artº 255º, o processo de seleção dos trabalhadores a serem reafetos a outros serviço é feito de acordo com as  competências do trabalhador, que são objeto de avaliação,  e as necessidades do serviço integrador. No entanto, se algum ou alguns dos trabalhadores não possuir as competências necessárias para as novas funções, esses trabalhadores são colocados logo “na situação de requalificação” sem antes se ter organização ações de formação para eles adquirirem essas competências. E só depois de colocados na “situação de requalificação” é que é organizado “um programa de formação específico que promova e reforce as suas competências profissionais (artº 258º). Enquanto isto é feito, o serviço integrador já contratou os trabalhadores que precisa e depois não precisará deles, portanto os trabalhadores colocados na “situação de requalificação” estão condenados ao despedimento. Para terminar interessa referir, porque também foi uma matéria tratada na reunião, o pagamento de apenas 66,7% da remuneração base (1º semestre) e de 50% (2º semestre) durante o tempo que o trabalhador estiver na “situação de requalificação” antes de ser despedido. Este valor é inferior ao subsidio de desemprego pago no setor privado, e também inferior ao que recebem os trabalhadores colocados na situação “lay-off” no setor privado. Também aqui o tratamento é dos trabalhadores da Função Pública é desigual..

Eugénio Rosa, economista, edr2@netcabo.pt, 10.7.2013

1 Comment

  1. Tudo isto é gravísimo e nojento.
    E as criaturas que engendram tais matérias putrefactas, ou se cumpliciam na sua aprovação, tornam-se-me cada vez mais repelentes. O Padre António Rego teve um excelente programa de rádio intitulado “Toda A Gente É Pessoa”. Fico sempre na dúvida de que gente que despreza deste modo o seu semelhante mereça, de facto, tal qualificação.

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