DO 11 DE SETEMBRO DE 2001 AO ATAQUE À SÍRIA – por João Machado

Faz hoje doze anos que ocorreu o atentado do 11 de Setembro. Nesse dia morreram em Nova Iorque e noutros locais cerca de três mil pessoas. Em 21 de Agosto do corrente ano alguém deitou gás sarin nos arredores de Damasco, e terá morto mil e tal pessoas. O primeiro atentado levou à guerra do Iraque, o último vamos a ver onde nos leva. Não deve ser a nada de brilhante, pelo que conseguimos perceber do que vai por aí fora. Ambos os atentados, para além do horror que cada um deles constitui, da repulsa que merecem, das dúvidas que legitimamente se levantam sobre quem foram os verdadeiros responsáveis, foram e estão a ser utilizados para objectivos que pouco ou nada têm com a reparação devida às vítimas, suas famílias e compatriotas, nem com a justiça e a paz entre os povos.

 O atentado de 11 de Setembro já foi dissecado por diversos quadrantes, mas as dúvidas quanto à versão oficial dos factos estão longe de estar esclarecidas. Entretanto, as suas sequelas, o ataque ao Iraque, a invasão do Afeganistão, o reforço da presença militar norte-americana em várias partes do globo, o incremento da espionagem em praticamente todos os países, e a própria crise financeira deixaram marcas profundas e modificaram a política internacional e as relações entre os países de maneira sensível, mas a merecer muitos reparos. Se o Terceiro Mundo nos últimos anos tem conseguido aumentar o seu peso na vida mundial, os problemas estruturais que afectam as populações dos países que o integram não têm conhecido progressos significativos, salvo raras excepções, e apesar das manifestações constantes a apelarem a mudanças reais em muitos deles. A Europa como tal conhece uma crise profunda, afectada pelo desequilíbrio económico e político entre a Alemanha e os outros países, por lideranças incompetentes e inadequadas, ao nível dos países e da União Europeia, pelo vagabundear político do Reino Unido, pelo domínio político e militar que sobre ela exercem os EUA, e pelos excessos do poder financeiro, que obriga os estados a imporem uma factura pesada aos povos que eram supostos defender.

Tudo isso tem contribuído para os EUA reforçarem o seu predomínio à escala global, desaparecida a URSS, e com a China muito distante de conseguir ser uma superpotência. Os primeiros são governados por um Obama muito distante das promessas que fez a muita gente, um Senado e uma Câmara dos Representantes onde pontificam os lóbis, e a sua força militar é cada vez mais superior à de todos os outros países, mesmo considerados em conjunto.

Obviamente que os EUA, ou pelo menos uma grande parte dos seus governantes, e muito ligados à oligarquia que controla o complexo militar-industrial, desejam uma guerra mais alargada e intensa no Próximo e Médio Oriente. Israel está ansiosa por ela, que lhe permitirá, entre outras coisas, ter cobertura para acabar com a resistência palestiniana. E são apoiados nestas intenções por importantes elementos da elite intelectual, que incluem o filósofo Bernard-Henry Lévy, o qual escreveu um artigo intitulado significativamente Oxalá Hollande se mantenha firme quanto à Síria (tradução nossa), cuja versão espanhola saiu no El País de 8 de Setembro último, e o autor do editorial do Sunday Times do mesmo dia, Obama não pode continuar a chefiar a partir da retaguarda (tradução nossa), que praticamente pede a substituição de Obama por um presidente que imponha um respeito generalizado, porque o mundo conhece a posição dele e como vai reagir. Chama mesmo ao actual presidente dos EUA o “beligerante relutante”.

Ambos, Bernard-Henry Lévy e o editorialista do Sunday Times, desejavam que tivesse ocorrido uma intervenção militar imediata na Síria. Não põem em dúvida que tivesse sido Assad quem ordenou o ataque com gás sarin, apenas o Sunday Times menciona que a Rússia questiona o facto. Bernard-Henry Lévy fustiga todos os que em França se manifestaram contra o ataque à Síria, e até lamenta que os comentaristas tenham sublinhado o isolamento e a precipitação de Holande, assim como o facto de Obama não o ter mencionado no seu discurso. O editorial do jornal britânica dá a prioridade a rotular  Obama como um presidente fraco.

Obama é muita coisa mas não é fraco. Não hesitou em mandar liquidar Bin Laden, mantém Guantánamo na mesma, apesar das suas promessas, e das informações sobre as torturas e abusos que ali se cometem, e aumentou enormemente o poderio norte-americano. Sabe muito bem que a guerra em que o querem meter não lhe vai trazer benefícios políticos, a não ser que a ganhe totalmente em menos de uma semana, o que se está a averiguar impossível. Daí o procurar reforçar-se, interna e externamente. Tem o seu secretário de estado John Kerry a fazer o papel de falcão. Uma guerra, mesmo só de duas ou três semanas, sem tropas no terreno, vai trazer-lhe problemas tremendos, a ele, que aspira a um resto de mandato glorioso. Não está muito preocupado com o povo sírio, como também não o está com os presos de Guantánamo. Hollande descobriu que é demasiado pequeno para fazer o papel de De Gaulle, ou mesmo de Mitterand. As consequências do seu mandato vão ser péssimas para a França. Marina Le Pen bem o sabe, e acha que está a chegar a sua hora. Não será Bernard-Henry Lévy quem o vai impedir. Assim estamos, doze anos passados sobre o 11 de Setembro.

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